O voto sobre a moção de censura do PCP está a pôr a nu as divergências entre os deputados socialistas e estes já nem disfarçam a rutura. De manhã, na reunião da bancada parlamentar, alguns deputados discordaram da posição assumida por António José Seguro no início da semana, defendendo a abstenção e não voto a favor da censura dos comunistas. A resposta chegou mais tarde pela voz de um coordenador da bancada dizendo que os deputados estão a “afrontar” o secretário-geral. A decisão só será conhecida esta quianta-feira ao final da tarde. A bancada parlamentar volta a reunir depois do plenário.

Na reunião da bancada parlamentar do partido, o PS não chegou a nenhuma decisão final, mesmo depois de o secretário-geral António José Seguro ter avançado, no dia a seguir às eleições europeias, que o PS iria votar a favor do texto.

Alberto Martins, líder da bancada parlamentar, marcou nova reunião para a tarde, alegando que não estavam na sala o número de deputados suficientes para tomar uma decisão. “Não havia quórum suficiente”, foi a expressão usada. Alberto Martins voltou a dizer que o PS tem uma “visão distinta” do PCP no que tem a ver com os considerandos, mas “mas não tem na censura ao Governo”. “Nós censuramos áspera e violentamente” as políticas deste Governo, disse.

Ao que o Observador apurou junto de várias fontes da bancada, houve alguns deputados a defender a abstenção, alegando não se reverem no texto dos comunistas. Um dos deputados que contestou a decisão foi Jorge Lacão, que ontem se demitiu do secretariado nacional do partido, depois de apresentar o apoio público a António Costa. Em declarações à Lusa, o ex-ministro disse que a moção de censura do PCP “não reúne as condições políticas” para que a bancada socialista vote a favor e teve o apoio de outro ex-ministro, Alberto Costa.

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Na reunião da bancada vários deputados levantaram a questão de o texto dos comunistas ter muitos pontos contrários ao pensamento dos socialistas e que neste momento o PS tem de ter cuidado nas posições que toma. Ao que o Observador apurou, não houve uma divisão clara entre apoiantes de Costa ou apoiantes de Seguro, até porque alguns deputados apoiantes públicos de Costa não estavam presentes.

Não houve uma divisão clara entre apoiantes de Costa ou apoiantes de Seguro.

Contra-ataque

A resposta da direção de António José Seguro chegou mais tarde pela voz de Nuno Sá, que considerou a posição de alguns deputados um “ataque ao secretário-geral do partido” e classificou a posição como um “folhetim com um guião de baixo nível”.

Em declarações aos jornalistas, Nuno Sá foi a voz escolhida pela direção da bancada parlamentar para responder aos críticos: “Há aqui um folhetim com um guião de baixo nível e de muito mau gosto, que os portugueses não apreciam”. E acrescentou: “O que se pretendeu foi afrontar e criar instabilidade no PS”. Para Nuno Sá, esta atitude dos deputados nada tem a ver com conteúdo político do texto do PCP – até porque, defendeu, “hoje politicamente é preciso fazer essa censura” – mas trata-se, sim, de uma atitude “de falta de verticalidade política”.

Na opinião do dirigente, apoiante de António José Seguro, “houve deputados que sempre disseram que era preciso uma censura ao Governo. Inexplicavelmente, são os mesmos que hoje estão a dizer que é preciso uma abstenção violenta”. Mais tarde ainda classificou de “abstenção aditivada”.

Disciplina de voto?

Apesar de os regulamentos internos não imporem disciplina de voto formal em moções de censura – obrigação de todos os deputados votarem conforme a decisão da direção da bancada -, o líder da bancada parlamentar preferiu não impor disciplina de voto.

Alberto Martins explicou que só há diciplina de voto no que toca a moções de confiança e de censura quando o PS está no governo e não a moções de censura quando o PS está na oposição. Quando questionado se queria uma votação expressiva a favor da censura dos comunistas, Alberto Martins apenas respondeu que “as votações no PS são democráticas”.

A moção de censura ao PCP será discutida e votada esta sexta-feira. Os comunistas apresentaram o texto logo na segunda-feira à tarde, quando de manhã António José Seguro já tinha dito que apoiava de cruz, sem ler o texto, a censura dos comunistas.

Tal como o Observador escreveu, o texto do PCP critica algumas posições dos socialistas, nomeadamente na reforma do IRC ou na adesão ao Tratado Orçamental. Além disso, os comunistas defendem a saída da moeda única, uma posição que foi atacada precisamente pelo PS na última semana de campanha para as eleições europeias. Aliás, no apelo ao voto útil na última semana, tanto António José Seguro como Francisco Assis vincaram a ideia de que o “voto responsável” e de “censura” ao Governo era no PS, uma vez que o PCP tinha posições “extremistas” como defender a saída do euro. Posição que aparece no texto dos comunistas e que o secretário-geral do PS disse que apoiava, antes mesmo de o ver.