O sol brilhou no Meco e tudo correu melhor na despedida do 20.º Super Bock Super Rock, este sábado. Os cabeças de cartaz Kasabian não atraíram tanta gente quanto Eddie Vedder na noite anterior, mas quem se deslocou até ao Meco não terá dado a viagem por perdida. Mérito, sobretudo, de três bandas anglo-saxónicas: The Kills, Foals e Kasabian. De acordo com a organização, no total dos três dias terão passado pela Herdade do Cabeço da Flauta 86 mil pessoas.

Cinco concertos no palco principal, cinco momentos de rock. Em dia de dizer “até para o ano”, o Super Bock Super Rock fez jus ao nome e as guitarras elétricas foram dominantes. Mas apenas uma banda conseguiu pôr o público a saltar em massa. Os Kasabian não foram cabeças de cartaz apenas no papel e conseguiram arrancar os festivaleiros da apatia, embora o espaço vazio talvez não ajude a criar o ambiente necessário a grandes entregas coletivas. É que se no primeiro dia estiveram no Meco 27 mil pessoas e no segundo 35 mil, e mesmo assim havia espaço de sobra para ninguém andar aos encontrões, o último dia atraiu 24 mil festivaleiros. Tudo números da organização. O concerto de Albert Hammond Jr., às 20h30, estava com o seguinte cenário:

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Mas voltemos aos Kasabian, que entraram no Palco Super Bock às 01h05 sem dizerem uma palavra e mostrando logo ao que vinham, com a escolha da primeira canção da noite a ser “Bumblebee”, retirada de 48:13, o novo álbum que lançaram no mês passado. No regresso a Portugal, a banda britânica mostrou orgulho no quinto álbum da carreira, e foram várias as canções novas que apresentaram, casos de “Stevie”, “Treat” e “Eez-eh”, que deu um cheirinho a discoteca ao ar livre. Com sete elementos em palco e um jogo de luzes interessante, a entrega foi uma constante. Houve tempo para revisitar “Days Are Forgotten”, “I.D.” ou “Empire”, por exemplo, e a pouco tempo do fim do concerto, os Kasabian decidem lembrar Fatboy Slim, com uma versão de “Praise You”.

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Em três dias de festival e 46 momentos musicais só houve três encores. Dois foram feitos por Eddie Vedder, o terceiro foi cortesia dos Kasabian, que abandonaram o palco com cânticos de “Praise You” e regressaram para tocar “Switchblade Smiles”, “Vlad the Impaler” e “Fire” para a despedida. O público também estava on fire. Ver do alto milhares de pessoas a saltar ao mesmo tempo é uma boa visão para encerrar o palco principal do Super Rock. Para o último adeus, Tom Meighan decide cantar a capella um pouco de “All You Need Is Love”, dos Beatles.

Quem também precisava de amor eram os Foals e os The Kills, que não chegaram a conseguir nunca a mesma reação extasiada do público. O número de pessoas a ver Foals, que atuaram imediatamente antes, e Kasabian foi semelhante. Também eles tiveram jogos de luzes bastante chamativos e uma prestação merecedora de mais reações calorosas. Foram muitos os que viajaram até ao Meco só para ver um dos fenómenos atuais mais populares do brit rock. Entre as 23h20 e as 00h35 o palco principal foi deles, com o primeiro momento alto a acontecer com “My Number”. O ritmo foi constante, “Late Night” e “Inhaler” foram das canções mais celebradas e o vocalista Yannis Philippakis até mostrou como se faz, ao deitar-se em cima do público ao mesmo tempo que fazia na guitarra os acordes de “Providence”. Nas filas da frente houve entusiasmo, mas o bom concerto dado pelo Foals merecia mais calor como agradecimento.

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Foals.

O mesmo é válido para os The Kills, que regressaram este sábado a Portugal depois do balde de água fria que foi o cancelamento do concerto do ano passado, em Paredes de Coura. Da nossa parte, a curiosidade para os ver era grande, não só porque se trata de uma banda com muita qualidade em disco e ao vivo, mas também porque em maio a co-líder Alison Mosshart disse à imprensa norte-americana que o sucessor de Blood Pressures (2011) vai ser “completamente diferente”. Falou-se em dubstep e reggae como inspiração, o que é curioso numa banda como os The Kills. Mas os dois estilos não apareceram na noite deste sábado e os The Kills continuam os mesmos, à excepção do cabelo de Alison, que está agora loiro, e da soma de duas vozes a fazer coros e dois percussionistas, o que trouxe algumas mudanças ao som cru da banda, mas que lhe conferiu mais robustez.

Apesar desta gente toda a tocar e a cantar (sem esquecer Jamie Hince, claro), não dá para tirar os olhos de Alison. A figura esguia, de casaco preto de cabedal, não parou por um momento e espalhou atitude rock’n’roll em cada canto daquele palco. Do repertório ouvimos “U.R.A. Fever”, “Future Starts Slow”, “Getting Down”, “Heart is a Beating Drum”, “DNA”, e muitas mais. Mas se em Eddie Vedder o público arranjava qualquer desculpa para acompanhar as músicas com palmas, os The Kills, tão bem ritmados, bem tentaram mas não conseguiram mais do que a adesão das primeiras filas. E a culpa não foi deles, que se mostraram muito competentes durante todo o espetáculo.

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The Kills.

O rock anglo-saxónico dominou, mas o dia começou com um projeto português de homenagem a Lou Reed, no Palco Super Bock. Foi numa “Sunday Morning”, a 23 de outubro do ano passado, que dissemos adeus a um dos nomes que mais influenciaram o rock. Passados nove meses sobre a sua morte, ainda se prestam bonitas homenagens ao fundador dos Velvet Underground, desta vez com os Ladrões do Tempo, formados por músicos portugueses requisitados como Zé Pedro, Tó Trips, Samuel Palitos, Doni Bettencourt e Paulo Franco.

A primeira paragem é “Rock’n’roll”. Do lado esquerdo do palco reparamos que, em simultâneo, o artista RAM grafita uma tela branca ao som da música. Na música então segue-se “I’m Waiting for the Man”, dos Velvet Underground. “É um prazer estar aqui a tocar as músicas do Lou Reed”, disse Zé Pedro, antes de chamar o primeiro de seis convidados da tarde, João Pedro Pais, para cantar “I Love You Suzzane”. A segunda convidada é Lena D’Água e cantou mais uma de Velvet Underground, “Sunday Morning”, fazendo a voz de Nico. O terceiro convidado pisou o palco duas vezes na noite anterior. Paulo Furtado, autor de Femina, foi chamado para tocar e cantar uma versão muito interessante de “Femme Fatale”. O quarto convidado é o mais novo de todos: Tomás Wallenstein, dos Capitão Fausto. Coube-lhe a responsabilidade de dar voz a “Venus in Furs”. Mais do que preocupação em manter as canções tal como são, os arranjos instrumentais feitos demonstram bom gosto e algum conhecimento do que foi Lou Reed e os Velvet Underground. Quase a terminar, o convidado foi Jorge Palma, que se sentou nas teclas para tocar “Perfect Day” e também cantar. Resultado: uma ótima versão deste clássico eterno de Lou Reed. Com um início destes, o terceiro dia do festival prometia mesmo ser perfeito. Frankie Chavez deu por encerradas as participações especiais, com “White Light/White Heat”. No final, todos os convidados se juntaram em palco para a obrigatória “Take a Walk on the Wild Side”.

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Ao longo do concerto, RAM transformou a tela branca num retrato fiel de Lou Reed.

O último dia contou ainda com a atuação de Albert Hammond Jr., no Palco Super Bock. À falta dos Strokes, ele foi o mais parecido que os fãs da banda norte-americana poderiam ter. Perante um recinto ainda a meio gás, o integrante dos Strokes não tocou nenhuma canção do repertório da banda mãe, mas arriscou uma versão de “Ever Fallen In Love (With Someone You Shouldn’t’ve”), dos Buzzcocks. Havia pouca gente presente e o facto de, no Palco EDP, estarem a atuar ao mesmo tempo os Skaters também não ajudou. A sonoridade das duas bandas tocou-se algumas vezes, embora se tornasse mais pesada (a tempos), ou nos desse um cheirinho ocasional a reggae.

No capítulo pop, a dinamarquesa Oh Land, que atuou já depois da meia-noite no Palco EDP, foi a fiel representante, mas foram muitos os que abandonaram o concerto a meio para conseguirem apanhar o início de Kasabian. No mesmo palco secundário, mas às 22h40, os Dead Combo mostraram mais uma vez porque é preciso apanhar todas as oportunidades de os ver ao vivo. Pedro V. Gonçalves e Tó Trips (que já tinha tocado à tarde no palco principal com os Ladrões do Tempo) fizeram-se acompanhar pelo baterista Alexandre Frazão, como já é habitual, e por um novo cenário muito interessante. Um concerto que merecia ser visto até ao fim, não fosse o caso de os Foals se terem metido no meio do cartaz e de vários festivaleiros terem saído após a música “Sopa de Cavalo Cansado”.

Por fim, e música propriamente dita à parte, uma nota para um fenómeno observado neste festival. Que é feito das t-shirts de bandas? Apenas no dia de Eddie Vedder se viram muitos festivaleiros com “Pearl Jam” e “Eddie Vedder” estampados nas camisolas. Nos outros dois dias eram muito poucos aqueles que envergavam a t-shirt do seu artista favorito, o que seria impensável há um par de anos.

O 20.º Super Bock Super Rock teve um cartaz coeso musicalmente e apenas fica manchado pelos atrasos do segundo dia. Para o ano há mais, em datas ainda a anunciar.