O Bloco de Esquerda dá esta sexta-feira o pontapé de saída para o “início do novo ano político”, com o futuro da Esquerda a figurar-se como tema transversal aos três dias de debate e troca de ideias, que vão ter lugar em Évora até domingo. “Do que é que a esquerda não pode abdicar?” e “À esquerda quem bloqueia quem?” são algumas das perguntas que vão marcar a discussão política da ‘rentrée’ e que vão pôr o futuro do PS – de Seguro ou de Costa – em cima da mesa dos bloquistas.

É a primeira ‘rentrée’ dos partidos portugueses, à exceção da Festa do Pontal do PSD, que tem lugar habitualmente a meio de agosto, e a sétima realizada pelo Bloco de Esquerda, que completou este ano 15 anos de existência. Mas não é uma ‘rentrée’ qualquer. O Fórum Socialismo 2014 acontece num momento difícil para o Bloco de Esquerda, tanto do ponto de vista interno como externo, com a recente dissidência da tendência Fórum Manifesto – dos ex-bloquistas Ana Drago e Daniel Oliveira -, e com a aproximação de um ano de eleições em que o Bloco não quer repetir as dificuldades de 2011.

Depois de ver a sua bancada parlamentar reduzida para metade nas últimas legislativas (o Bloco passou de 16 deputados eleitos em 2009 para oito em 2011), o regresso do partido ao ativo depois das férias de verão aparece ensombrado pela necessidade de reflexão interna e pela urgência de desenhar uma estratégia de fundo para 2015. Mas a ‘rentrée’ é sobretudo um “fórum de ideias e debates” sobre o estado do país e do mundo, o que leva alguns dos dirigentes a afastar a discussão sobre as divergências internas para outubro ou novembro. “Não faremos desta iniciativa um debate da convenção”, sintetizou Jorge Costa ao Observador, atirando esse debate para as rondas preparatórias para a realização da convenção (equivalente ao Congresso eletivo que se realiza nos restantes partidos), que está agendada para novembro.

Jorge Costa vai ser o orador principal de um dos principais temas de debate agendados para sábado, segundo dia do Fórum Socialismo. ‘Quem bloqueia quem à esquerda’ vai ser o mote para “fazer um mapa das posições que se têm vindo a demarcar à Esquerda” e para “debater como os diferentes intervenientes da Esquerda se relacionam entre si”, perante o contexto atual de herança da troika e aquilo que o dirigente bloquista define como um estado de “austeridade permanente”.

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PS no centro da mesa

A posição do Partido Socialista neste período de pós-troika, e no quadro da esquerda portuguesa, vai ser, seguramente, um dos pontos mais falados neste Fórum, numa altura em que os socialistas estão divididos na escolha do seu líder. “Nem António José Seguro nem António Costa, a avaliar pelas declarações que têm feito, têm um compromisso político com questões-chave como a reestruturação da dívida e o tratado orçamental”, afirma Jorge Costa, acrescentando que o PS nestes termos não se insere “no pólo de coragem, confronto e desobediência face às instituições europeias” como aquele que o Bloco quer integrar.

Mas antes, quem vai abrir a ronda de mais de 40 debates e mesas redondas é João Semedo, que será o orador principal do debate desta noite sobre “Do que é que a esquerda não pode abdicar?”. Ao Público, o coordenador bloquista afirmou que vai usar esse painel para falar “das condições políticas e programáticas” para uma saída da crise à esquerda, e que a apresentação de “propostas políticas e económicas concretas” ficará a cargo de Catarina Martins, na sessão de encerramento agendada para domingo.

Resta saber se a esquerda como o Bloco a vê pode abdicar de alianças políticas. Apesar de o assunto ser ligeiramente evitado pelos dirigentes bloquistas, que não querem fazer deste regresso ao ativo um palco de discussão interna, a balança não parece pender para acordos com o PS, quer seja de Seguro quer seja de Costa. Tal como Jorge Costa, também Semedo rematou em declarações ao jornal Público que “falta vontade política para virar à esquerda” e que “é evidente que da disputa do PS não vai sair qualquer alternativa de esquerda”.

Além destes temas, o encontro bloquista vai contar com mais de 40 debates e ateliês sobre temas tão variados como o BES, o euro, a Europa, o ambiente, a cultura, a ciência, e até as praxes ou o futebol, “como o ópio do povo”.

Como convidados externos ao partido destaca-se a presença da eurodeputada socialista Ana Gomes, que vai estar em Évora no domingo para falar sobre os “Submarinos de Portas” que “não param de meter água” – no ano passado estiveram na rentrée do Bloco dois nomes do PS, Paulo Pedroso e Pedro Delgado Alves -, e três convidados internacionais. De Espanha vai estar na Escola Secundária Gabriel Pereira Miguel Uban, candidato do Podemos às europeias e ativista do movimento 15M, e da Grécia chega a Évora o eurodeputado do Syriza Georgios Katrougalis, que representam, segundo Jorge Costa, “duas forças emergentes em países que estão a atravessar situações sociais paralelas à nossa”. Também a investigadora francesa Catherine Samary, especialista em assuntos da Europa do leste, vai marcar presença no Fórum Socialismo do Bloco.