Sendo o chimpanzé o animal geneticamente mais parecido com o homem – partilhamos com ele mais de 90% dos genes do nosso ADN -, há muitas vezes a tendência para estabelecer relações entre o comportamento de ambas as espécies: chimpanzés (Pan troglodytes) e homem (Homo sapiens sapiens). Alguns investigadores têm sugerido que a violência praticada pelos chimpanzés resulta do impacto que o homem tem nos locais onde vivem, mas o estudo publicado na Nature esta quarta-feira sugere que os chimpanzés são naturalmente violentos.

Embora os animais da mesma espécie possam entrar em conflito na luta pelo território, pela alimentação ou para conseguir parceiros sexuais, raramente esses confrontos implicam a morte de um dos lados. Se um clã de leões tenta ocupar o território de outro clã já estabelecido, o grupo mais fraco acaba por se retirar – podem sair feridos, mas poucas vezes são mortos. Porém, os confrontos entre chimpanzés são violentos e com muitas baixas. Porque é que isto acontece tem intrigado os investigadores.

Nas 18 comunidades de chimpanzés e quatro comunidades de bonobos (Pan paniscus, também conhecidos por chimpanzé-pigmeu) estudadas ao longo de 50 anos, ocorreram 152 mortes – distribuídas entre 15 comunidades de chimpanzés e uma de bonobos -, revela o estudo realizado por uma equipa de 30 investigadores.

Dois terços dos confrontos aconteceram entre elementos de comunidades diferentes, com os agressores numa proporção de oito para um em relação às vítimas. Tanto agressores como vítimas são normalmente machos – 92% e 73%, respetivamente. “A variação nas taxas de homicídio não está relacionada com o impacto humano. Os nossos resultados são compatíveis com explicações anteriores que relacionam as mortes por chimpanzés com a adaptação, enquanto a hipótese do impacto humano não é sustentada”, conclui a equipa que junta investigadores dos Estados Unidos, Europa, Ásia e África.

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A female chimpanzee (C) yawns as two others nod-off, while they sit on rocks in a family group, with the sun on their backs in their open air enclosure at the Taronga Zoo in Sydney, 26 April 2005.  The special open air chimpanzee enclosure, which opened in 1980, is home to nineteen chimps and recognised internationally as one of the most significant in the world with such a successful breeding record as well as having been one of the first zoological gardens to house and exhibit chimpanzee in a group situation.   AFP PHOTO/Rob ELLIOTT (Photo credit should read ROB ELLIOTT/AFP/Getty Images)

Os chimpanzés são animais sociais – ROB ELLIOTT/AFP/Getty Images

Já nos anos 1970, enquanto a primatóloga Jane Goodall estudava o comportamento de chimpanzés no Parque Nacional da Tanzânia, havia relatos de que os chimpanzés organizavam ataques aos territórios vizinhos, causando baixas e mutilações, lembra a Science. Derrotar outro grupo implica ganhar território, fontes de alimento ou água e, por vezes, fêmeas.

Mas as conclusões agora apresentadas não reúnem consenso. “As estatísticas não me dizem nada. Não foram capazes que estabelecer a ausência da interferência humana”, diz Robert Sussman, um antropólogo na Universidade de Washington, nos Estados Unidos (EUA). Este apoiante da hipótese em que a influência humana condiciona a agressividade nos chimpanzés não esteve envolvido neste estudo. Brian Fergunson, antropólogo na Universidade Rutgers (EUA), que também não esteve envolvido no estudo, questiona a medida usada para avaliar o impacto humano no comportamento dos chimpanzés.

Contrariando os opositores do estudo agora apresentado, Joan Silk, uma antropóloga da Universidade Estatal do Arizona (EUA), que não faz parte da equipa de investigadores, considera que tentar negar que a motivação para a guerra tem uma origem evolutiva pode enviesar a visão de certos investigadores. A tendência é para achar que as “características moralmente desejáveis, tais como empatia e altruísmo, têm profundas raízes evolutivas, enquanto as características indesejáveis​​, como a violência de grupo e coerção sexual, não.” Mais, a investigadora deixa um desafio: “Os defensores da hipótese do impacto humano devem contestar [este estudo] com dados empíricos ou mudar de posição.”