Não gostava da palavra revolução. Dizia, na apresentação, que lhe fazia confusão, quase como “deitar os velhos para um caixote do lixo” para deixar entrar os novos. E a verdade é que, mesmo com estreias, Fernando Santos pegou no telefone, ligou a alguns graúdos e chamou-os de volta à seleção nacional. O treinador queria “um processo natural” de mudança na seleção. E, contas feiras, acabou por fazer 12 alterações face à última convocatória de Paulo Bento. Com direito a estreias e tudo — Ivo Pinto, do Dínamo de Zagreb, José Fonte, do Southampton e João Mário, do Sporting.
E surpresas, já agora. A maior delas será porventura a presença de Ivo Pinto. Quem é ele? É um lateral direito, que já está na terceira época como emigrante e na segunda como jogador do Dínamo de Zagreb, da Croácia. Tem 24 anos e foi sobretudo formado no Boavista antes de, em 2008, espreitar a primeira equipa do FC Porto. Depois de sucessivos empréstimos (Gil Vicente, Vitória de Setúbal e Sporting da Covilhã), foi parar ao União de Leiria, que também o recambiou para o Rio Ave. Depois, em 2012, disse adeus e viajou para a Roménia, onde fez uma temporada no Cluj.
Hoje continua longe, nos Balcãs, a correr pelo campeão croata. Mas Fernando Santos viu-o, chamou-o e deu a estreia a Ivo Pinto. Algo que também ofereceu aos 30 anos de José Fonte, defesa central e capitão do Southampton, equipa que está no segundo lugar da Premier League inglesa, a perseguir o Chelsea de José Mourinho. A ele e à juventude de João Mário, o recente e novo cérebro do meio campo do Sporting, que o selecionador ‘roubou’ à seleção de sub-21 — em tempo de play-off de apuramento para o Europeu de 2015 — por “ter a ideia de que teria mais de 50% de hipótese” de jogar pela principal equipa nacional.
Fora de estreias, há as novidades. Cédric Soares, lateral direito que vai na segunda época a titular no Sporting, é uma delas — o defesa só fora chamado uma vez, a 4 de outubro de 2013, mas não chegou a jogar com Paulo Bento. Eliseu é outra. O lateral esquerdo do Benfica, após ser aposta no reinado de Carlos Queiroz, está de regresso à seleção nacional. É um de três homens para o lado canhoto da defesa, a par de Antunes e de Fábio Coentrão. “As informações que tenho, quer clínicas quer de falar com ele, é que o Fábio está bem. Mas, como havia uma margem de insegurança, convoquei três laterais esquerdos”, explicou o treinador, ao lembrar a recente lesão sofrido pelo homem do Real Madrid.
Os primeiros 24 convocados por Fernando Santos para a seleção nacional:
Guarda-redes: Rui Patrício (Sporting), Beto (Sevilha) e Anthony Lopes (Lyon).
Defesas: Pepe (Real Madrid), Bruno Alves (Fenerbahce), Cédric Soares (Sporting), Eliseu (Benfica), Fábio Coentrão (Real Madrid), Ivo Pinto (Dínamo de Zagreb), José Fonte (Southampton), Ricardo Carvalho (AS Monaco) e Antunes (Málaga).
Médios: João Moutinho (AS Monaco), Adrien Silva (Sporting), André Gomes (Valência), João Mário (Sporting), Tiago (Atlético de Madrid) e William Carvalho (Sporting),
Avançados: Cristiano Ronaldo (Real Madrid), Nani (Sporting), Vieirinha (Wolfsburgo), Danny (Zenit São Petersburgo), Éder (Sporting de Braga) e Ricardo Quaresma (FC Porto).
No meio campo haverá uns pés bem mais graúdos que os outros — os de Tiago. Os mesmos que, em 2010, após sair do Mundial de 2010, disseram adeus à seleção para se dedicarem a tempo inteiro ao Atlético de Madrid. Antes da Copa do Mundo do Brasil, este verão, ainda se falou da hipótese de Paulo Bento o chamar de volta. Não aconteceu.
Agora, porém, Fernando Santos convenceu-o. Como? “Terão de lhe perguntar a ele”, respondeu o selecionador, na conferência de imprensa, ao justificar o retorno do homem que Diego Simeone, seu treinador na capital espanhola, transformou num trinco para tapar espaços à frente da defesa. Ele e William Carvalho lutarão pela mesma posição, e de entre Adrien, João Moutinho, André Gomes e João Mário sairão os outros dois médios (caso a seleção de Fernando Santos jogue num 4-3-3).
E Tiago não é o único trintão retornado. Fernando Santos bem avisara, quando sublinhou, mais do que uma vez, o facto de a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) não lhe ter transmitido “nenhum impedimento” para chamar jogadores. Portanto, resolveu convocar Ricardo Carvalho. Aos 36 anos, o defesa central, hoje no AS Monaco — com Leonardo Jardim, João Moutinho e Bernardo Silva –, à seleção após ter andado às turras com Paulo Bento e, por isso, ter ficado longe da seleção desde agosto de 2011. “Enquanto jogar futebol, eu estarei sempre disponível para a seleção”, disse, a 14 de setembro, numa entrevista à Globo. Agora, Fernando Santos trouxe-o de volta.
A ele e a Danny, avançado do Zenit, que o anterior selecionador também votara a uma exclusividade com o clube de São Petersburgo, após o dispensar de um jogo contra Israel (em novembro do ano passado) devido a lesão e, dias depois, o ver a jogar pela equipa russa. “A questão é muito simples: não aconteceu comigo“, resumiu o atual selecionador, quando os jornalistas começaram a disparar perguntas sobre ele e Ricardo Carvalho, que eram invisíveis para Paulo Bento.
Por último, nos homens que andarão mais perto das balizas da França (a 11 de outubro) e da Dinamarca (a 14, para a qualificação rumo ao Euro 2015), o selecionador só chamou um ponta de lança — Éder, do Sporting de Braga, que em 12 internacionalizações ainda não marcou um golo. Depois, a fazer companhia a Cristiano Ronaldo, Nani, Danny e Vieirinha, estará Ricardo Quaresma. Outro regresso. Após ver o Mundial pela televisão, o extremo, que já foi apanhado pela rotatividade (só foi titular duas vezes esta época) de Julen Lopetegui, treinador dos dragões, volta a ser convocado para a seleção, com quem não joga desde junho de 2012 (na derrota por 3-1 contra a Turquia, antes do Euro 2012).
Fernando Santos convocou 24 jogadores. Costumavam ser 23. E isto tem uma explicação — a FIFA mudou as regras e agora o selecionador terá de abdicar de um nome até 24 horas antes do encontro contra a França. Pelos três laterais esquerdos que convocou, a escolha poderá ser entre Fábio Coentrão, Eliseu ou Antunes. O duelo contra os franceses, explicou o selecionador, servirá já para “projetar o jogo com a Dinamarca”, pois as duas partidas “estão separadas por 72 horas”.
Afirmou já “ter a ideia de jogo quase feita na cabeça” e saber “claramente o que [vai] fazer”. Falou “como todos os jogadores” antes da convocatórias, uns por telefone, outros em pessoa, e sublinhou várias vezes uma ideia — “Aqui não há quebras com o passado, há é o futuro. E nós temos um presente que eu quero que projete um futuro brilhante e ganhador.” Que venha ele então.