Samantha Cristoforetti, astronauta da Agência Espacial Europeia (ESA), chegou esta segunda-feira à Estação Espacial Internacional, acompanhada do cosmonauta Anton Shkaplerov, da agência espacial russa (Roscosmos), e do astronauta Terry Virts, da agência espacial norte-americana (NASA). A astronauta italiana será responsável pela missão Futura, um extenso programa científico que pretende melhorar a vida das pessoas na Terra e nas futuras missões espaciais.

Cada missão espacial é composta por seis elementos que permanecem seis meses na Estação Espacial Internacional (EEI). Para os três astronautas que este domingo partiram do Cosmódromo de Baikonur, no Cazaquistão – uma base de lançamento de missões espaciais gerida pela Rússia -, a bordo da nave russa Soyuz estão destinadas as Expedições 42 (de quatro meses) e 43 (e dois meses). Samantha Cristoforetti vai estar principalmente dedicada às atividades científicas.

Soyuz_moved_into_vertical_position

Para chegar à Estação Espacial Internacional os astronautas viajam na nave Soyuz – Stephane CORVAJA/ESA

A saúde e nutrição são temas educativos chave na missão Futura, segundo a brochura da Agência Espacial Europeia. Estar seis meses na Estação Espacial Internacional, num ambiente onde se tem a sensação de ausência de gravidade, tem efeitos no organismo. Uma dieta rigorosa e a prática de exercício físico são fundamentais para que os astronautas possam manter-se aptos e saudáveis, mas esta missão também vai chegar à Terra. A astronauta de 37 anos vai promover a ação “Missão X: Treinar como um astronauta” – um programa de nove semanas para crianças entre os oito e os 12 anos. Para os alunos do secundário o desafio será usar a alga Spirulina para reciclar dióxido de carbono da atmosfera em oxigénio e alimentos de elevada qualidade proteica (as próprias algas).

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

As experiências científicas em “gravidade zero”

Os astronautas a bordo da Estação Espacial Internacional flutuam no interior, aparentemente sem estarem sujeitos à ação da gravidade. Só aparentemente. Como a EEI se encontrar a orbitar a Terra está, naturalmente, sob o efeito da força da gravidade do planeta. Puxada pela Terra, a EEI encontra-se em queda livre, juntamente com os ocupantes, daí a sensação de ausência de gravidade. Para simular este efeito na Terra só mesmo num salto em queda livre ou num voo parabólico.

O comportamento do corpo, dos fluidos e dos materiais pode ser diferente em “gravidade zero” ou “microgravidade”, daí a importância das experiências que serão desenvolvidas nos próximos meses. A astronauta italiana vai ser operadora de mais de 40 experiências das várias agências espaciais – europeia, estadunidense, canadiana e japonesa – e ser sujeito de experiências como as que estão relacionadas com a respiração ou a coordenação motora. A ESA apresenta os vários projetos científicos na brochura da missão.

Sabes que vais para o espaço em breve quando a brochura da tua missão está pronta!

CORPO HUMANO

  • Brain-DTI [ressonância magnética do cérebro] – De que forma os processos neuronais se adaptam à sensação de ausência de gravidade? A investigação pode fornecer novas ferramentas para testar a perceção espacial, mesmo na Terra.
  • Airway Monitoring [monitorização das vias respiratórias] – Os pacientes com asma podem beneficiar desta investigação que pretende avaliar de que forma os pulmões de Samantha Cristoforetti reagem às poeiras que existem na Estação Espacial Internacional.
  • Circadian Rhytms [ritmos circadianos] – Perceber como é que a vida a bordo da Estação Espacial Internacional, que completa mais de 15 órbitas por dia à volta da Terra, afeta os ritmos de sono pode ajudar as pessoas que na Terra têm horários de trabalho irregulares.
  • Grip [manipulação dextra em microgravidade] – A coordenação motora durante um longo período em “gravidade zero” pode ser afetada. Este estudo pode ajudar quem, na Terra, tem problemas em agarrar objetos.
  • Cartilage [cartilagem] e Stem cell differentiation [diferenciação das células estaminais] – Perceber se existem alterações na quantidade de cartilagem na astronauta italiana pode ajudar a prevenir a perda de massa óssea nos astronautas e pacientes na Terra. Da mesma forma é importante entender de que forma as células estaminais contribuem para o crescimento dos ossos quando estão em “microgravidade”.
  • Skin-B [pele] – O envelhecimento é um tema importante na investigação em Terra, mas sobretudo nas missões espaciais onde os astronautas envelhecem mais depressa.
  • Dosis-3D – Se a radiação no espaço é 15 vezes maior do que na Terra, de que forma é que isso pode afetar os astronautas em missões espaciais de longa duração?

OUTRAS EXPERIÊNCIAS

  • Como se comportam os organismos quando sujeitos à “microgravidade” durante um ano? E se forem colocados do lado de fora da EEI?
  • “Eliminar” a ação da gravidade pode permitir criar ligas metálicas com características que ainda não se conseguiram reproduzir em Terra, melhorar a produção de plasmas e microchips.
  • Estando a EEI sujeita ao magnetismo da Terra, a MagVector vai medir a influência do campo magnético nos sistemas elétricos.
  • Controlar tudo o que se passa na Terra e no espaço: quantos barcos circulam nos oceanos? Que quantidade de radiação eletromagnética emite o Sol?

A astronauta que era piloto de aviação

Desde criança que a capitã da força aérea italiana queria ser astronauta. E, na verdade, qualquer um pode ser astronauta. Cumprir este sonho permitiu a Samantha Cristoforetti combinar as três maiores paixões: voar, ciência e tecnologia.

Estudou engenharia aeroespacial e frequentou todas as formações técnicas à disposição. Entrou para a força aérea e completou mais de 500 horas de voo em seis aeronaves diferentes. E quando a ESA abriu candidaturas para astronautas não hesitou. Ao fim de um ano de seleção apenas seis dos 8.000 candidatos foram recrutados e Samantha Cristoforetti foi a única mulher deste grupo.

ESA astronaut Samantha Cristoforetti using the virtual reality hardware to rehearse some of her duties for a mission to the International Space Station, at NASA's Johnson Space Center, on 30 June 2014. Samantha Cristoforetti is assigned to fly on the Soyuz TMA-15M spacecraft to the ISS, scheduled for November 2014 and as part of Expedition 42/43.

Durante a fase de treino na NASA – Stephane CORVAJA/ESA

Em 2009 começou a preparar-se para a missão que lhe poderia vir a ser destinada. A formação básica no Centro de Astronautas Europeu, em Colónia (Alemanha) incluiu treino de sobrevivência, suporte de vida, conhecimentos científicos e técnicos, e russo – porque russo é a única língua nos comandos do Soyuz que leva os astronautas à Estação Espacial Internacional. Depois começou o treino específico para a missão, por vezes com 60 horas de trabalho semanais, em todos os centros parceiros – Estados Unidos, Canadá, Rússia e Japão.

Samantha Cristoforetti é uma blogger ativa e promete manter os seguidores a par do que se passa na Estação Espacial Internacional. Embora não seja a primeira mulher a viajar para o espaço, admite que é uma situação pouco frequente, mas não se sente preparada para discutir questões de género porque acima de tudo é astronauta. Ainda assim criou uma rubrica para responder a questões que “não podem” ser respondidas por homens – Pink running shoes (Sapatos de corrida cor-de-rosa).