As comunidades médicas procuram geralmente consenso na aplicação das práticas clínicas da especialidade a que se referem. A medicina do viajante e a medicina tropical não são exceções. Embora o consenso absoluto seja difícil, referiu o especialista na área Jorge Atouguia, a partilha de práticas motivou o Workshop de Medicina do Viajante, que decorreu este sábado no Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) da Universidade Nova de Lisboa. O objetivo final era preparar o caminho para a Sociedade de Medicina do Viajante.

A criação desta sociedade permitiria criar linhas orientadoras para as consultas da especialidade baseadas em estudos científicos. Uma das atribuições da plataforma TropNet é a disponibilização dos resultados obtidos pelos associados a todos os outros membros que não fizeram parte da investigação. Dos 71 membros da plataforma europeia, quatro são instituições portuguesas.

O IHMT iniciou funções em 1902. Surgiu, tal como muitos outros institutos de medicina tropical na Europa, devido à presença que mantinha em colónias nas regiões tropicais, e tinha como objetivo estudar e tratar as doenças endémicas desses países. Mas, embora a medicina do viajante possa ser relacionada com a medicina tropical, as recomendações para cada país devem depender do tipo de viagens que os respetivos cidadãos realizam com mais frequência.

Os centros de medicina do viajante – onde se realizam consultas ou onde são dadas as vacinas recomendadas – que apresentaram os resultados neste workshop concordam, segundo os dados de 2013, que a maior dos cidadãos que se apresentam à consulta são homens que viajam por motivos profissionais para África, em particular Angola. Segundo os dados dos Centros de Vacinação Internacional da Região Norte, apresentados pela delegada Regional de Saúde do Norte Delfina Antunes, a maior parte dos viajantes vacinados pertencia aos quadros médios superiores, ainda mais do que a trabalhadores da construção civil. Os dados do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra relativos ao mesmo ano, apresentados por Nuno Marques, também indicam que a maior parte dos viajantes consultados pertencem às profissões intelectuais e científicas.

Consoante o local de destino o médico responsável deverá conseguir identificar as doenças mais frequentes naquela área específica (que pode ser diferente de outras áreas no mesmo país). Porém, também é importante identificar que espécie do patogéneo existe naquela região – as espécies do parasita da malária tem uma distribuição geográfica distinta e em caso de infeção, a gravidade da doença também é distinta. Além disso, a estadia também condiciona a medicação – para períodos curtos aposta-se na prevenção (profilaxia), para períodos longos o ideal são os medicamentos de reserva, para tratamento em caso de infeção.

“É preciso deixar de dar medicamentos de profilaxia quando estes não são necessários”, alerta Ron Behrens, investigador na Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, no Reino Unido. Mas mais uma vez ficou demonstrado, pelas apresentações feitas, que as práticas nos locais onde são feitas consultas de medicina do viajante e que a medicação prescrita são variáveis. Além disso, nem todas as consultas são feitas por especialistas em medicina tropical ou medicina do viajante e podem acontecer tanto nos centros especializados, como nos centros de saúde ou nas consultas de saúde pública, refere Ricardo Racha-Pacheco, médico no Agrupamento de Centros de Saúde Almada-Seixal.

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