As bochechas pareciam balões, estavam cheias de ar, tal era a velocidade da respiração. As pálpebras, bem abertas, mostram um par de olhos vidrado na bola. Estava decidido, concentrado e cheio de uma vontade a querer explodir. Via-se na cara. Na que Danilo colocou logo ao segundo minuto para acompanhar a corrida que disparou quando ainda estava com o depósito cheio: a bola chegou-lhe pouco depois da linha do meio, dominou, arrancou, ultrapassou três adversários e, de repente, já ali estava à entrada da área.

Num ápice. Quando lá chegou, ajeitou a bola para dentro, deixou-a à mercê do pé esquerdo e pontapeou-a. De força o remate não teve muita — a bola foi batida mais com jeito, dando-lhe um efeito em arco que não fugiu o suficiente de Cássio, guarda-redes do Rio Ave que parou a bola. Mas era um sinal. Um que mostrava um Danilo já a arder enquanto os outros azuis e brancos ainda estava à procura de lenha para queimar. O brasileiro não. Corria, pedia a bola, cria fazer tabelas e cruzar a bola para outros a aproveitarem.

Estava frenético. O problema — era o único. Nem Brahimi, o mágico argelino que nem ele próprio sabe o que vai fazer a seguir à bola, se mostrou muito ativo até o intervalo. O Rio Ave não lidava bem com Danilo, verdade, mas com pouco mais se teve de preocupar. Os dragões eram mais do que amigos do passe. Faziam muitos, como o sempre que o espanhol Julen Lopetegui deu à equipa esta época. Por vezes até pareciam arriscar passes na defesa só para verem de que tipo de potenciais apuros se conseguiam livrar. Lá atrás, resolviam sempre. Do lado oposto é que não.

Logo após o arranque de Danilo, o espanhol Tello, aos 3’, imitou-o à esquerda para levar a bola até à linha e depois passá-la a Jackson, cujo remate, na área, só não chegou à baliza porque corpos do Rio Ave se colocaram à sua frente. Aos 11’, um livre a 25 metros da baliza de Cássio deu a Danilo uma bomba para rebentar com o pé direito. Mas o remate passou pouco ao lado do poste. Depois, aos 20’, outro sprint do brasileiro, agora em contra-ataque, culminou noutro remate, este rasteiro, e também ao lado da baliza do Rio Ave.

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De resto, nada más. Julen Lopetegui bem o sublinhara antes do jogo: “A nossa forma de enfrentar as partidas é sempre a mesma.” Se assim o é, desta feita, como equipa, não estava a resultar. Pelo menos quando a bola chegava a Jackson, que era raro conseguir passá-la aos extremos ou alguém que aparecesse de frente — os vila-condenses cercavam sempre os adversários, quase que à espera disto. E o plano B, o de o colombiano se virar para a baliza com bola, também quase nunca resultava. Parecia que o golo só poderia surgir a partir de uma de duas faíscas: alguém sozinho contra o mundo, ou de um erro dos grandes.

A primeira parte acabou com um pequeno, quando Danilo perdeu a bola, deu-a ao holandês  Zeegelaar que, desde a esquerda, a cruzou para o outro lado, onde Ukra arriscou o pontapé de primeira e mandou a bola para a bancada. Depois, feito o descanso, logo aos 47’, o extremo português, num contra ataque, arrancou com a bola e só parou com um remate, de pé esquerda, à entrada da área, que Fabiano defendeu.

Depois Marcelo e Tello deram razão à suspeita. O primeiro, defesa brasileiro, por atrapalhar-se junto à área do Rio Ave, quanto tentava começar uma jogada, e perder a bola para Jackson Martínez. E o segundo, o espanhol, por a apanhar e, sozinho, dar uma pedalada, fintar, arrancar e deixar Marcelo colado à relva para, depois, rematar de pé esquerdo. E fazer o 1-0.

Tudo porque um erro alheio e uma iniciativa individual se juntavam. Aí os dragões relaxaram e, por surpresa, começaram a acelerar. Agora sim. Até Tello passou a sprintar mais e, depois, já com o miúdo Rúben Neves em campo, o jogo de passe começou a rolar mais rápido. Aos 52’, um remate de Wakaso, a uns 25 metros da baliza, ainda obrigou Fabiano a fazer uma parada difícil. O Rio Ave corria mais riscos. Diego Lopes, o pequeno e cheio de ideias brasileiro, pedia a bola mais à frente. Ukra idem. E, portanto, sobravam Wakaso e Pedro Moreira para receberem a bola perto da defesa.

O risco não dava frutos. O que dava era para mais tentativas de Danilo trocar a vontade por um golo. Aos 74’ viu Cássio defender-lhe mais um remate, com uma patada na bola. Dois minutos depois, quando estava já sentado na relva, rematou uma sobra vinda de um canto e, mesmo assim, o guarda-redes brasileiro disse-lhe que não. Algo que Prince, o outro central do Rio Ave, não disse à hipótese de, também ele, errar — aos 78’ tentou, com os pés, levar a bola para a frente. Perdeu-a, ela acabou em Jackson que, à entrada da área, rematou de pé esquerdo. 2-0, oitavo golo do colombiano na liga e 15.º na época.

Aqui se apagava a fogueira dos vila-condenses. De vez. Mas os dragões, para evitarem brasas incandescentes, ainda lhe deitaram mais baldes de água para cima. Mais três. Aos 89’ o balde até se entornou de forma caricata, quando Alex Sandro, após vestir uma cueca em Lionn (fazer a bola passar-lhe entre as pernas), deixou a bola fugir e Marcelo, de qualquer maneira, deu um chutão na bola contra o brasileiro. Resultado: o ricochete fê-la passar por cima de Cássio. 3-0 e risos na cara de Alex Sandro.

Depois, outra perda de bola do Rio Ave deu a Herrera a hipótese de desmarcar Óliver e ao espanhol a possibilidade de marcar o 4-0. Disse que sim. Golo. Há histórias que acabam como começam, da mesma maneira, e esta foi assim.

Já fora de horas, com o relógio a compensar, Danilo apanhou a bola perto da linha do meio campo. Os adversários estavam dispersos, de rastos e conformados. Portanto lá foi ele. Arrancou, foi buscar a mesma cara do início, ultrapassou jogadores e, com o pé canhoto, disparou. Cássio, desta vez, ficou parado. E viu um golaço encaixar-se na sua baliza. 5-0, goleada e outro brasileiro também terminava a rir. Se para uma primeira parte destas o FC Porto responder com uma segunda assim, Lopetegui deverá continuar a querer “encarar” todos os jogos da mesma maneira.