Na última mensagem de Ano Novo antes das eleições e de dar posse a um (e último) Governo do mandato, Cavaco Silva dedica quase todo o texto ao período pós-eleitoral. Diz o Presidente que 2015 é um ano de escolhas “decisivas” e que do lado dos partidos é preciso contenção e evitar “excessos cometidos na luta política” para que não fiquem prejudicadas “soluções governativas estáveis, sólidas e consistentes” depois de os portugueses irem às urnas.

Nos poucos minutos em que se dirigiu aos portugueses neste início de ano, o Presidente da República deixou um caderno de encargos para ser lido, principalmente, pelos três partidos do arco da governação, PS, PSD e CDS. Cavaco Silva volta a insistir na necessidade de consenso e diálogo, mensagem que tem repetido ao longo deste mandato, mas desta vez quando fala desse compromisso já tem um objetivo fixado: a formação do próximo Governo. Disse o Presidente que se antes pedia para que os partidos se entendessem no “pós-troika”, agora quer que os portugueses, “e em especial, os agentes políticos”, “preparem o período pós-eleitoral”, porque, recorda, o país não pode voltar a 2011 e a pedir ajuda externa.

Não quer com isto dizer que o tempo até setembro/outubro (quando deverão realizar-se as eleições) seja tempo morto. Para os próximos meses, Cavaco quer que os partidos não estraguem mais a relação entre eles e não se entreguem aos “excessos cometidos na luta política” para que não seja prejudicado o “espírito de abertura”, até porque, conclui:

“Seja qual for o resultado eleitoral, o tempo subsequente à realização de eleições será marcado por exigências de compromisso e de diálogo”.

No esboço de Belém está já o retrato do próximo Governo. O Presidente quer que este seja capaz de assegurar “soluções governativas estáveis, sólidas e consistentes, capazes de assegurar o crescimento económico e dar esperança aos Portugueses”. Nesta equação não entra, obrigatoriamente, a expressão maioria absoluta. Mas Cavaco quer deixar a marca neste último mandato e não dará facilmente posse a um Governo que não tenha, pelo menos, um acordo de governação ou de incidência parlamentar que lhe dê garantias.

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Até porque, alerta o Presidente, as dificuldades ainda não passaram. O tempo depois das eleições deve ser um tempo de “confiança quer no plano interno, quer no plano internacional”, mas essa esperança num ano melhor “não se proclama com meras palavras”.

E é nas palavras que o chefe de Estado quer que os partidos se concentrem. Promessas que não possam ser cumpridas devem ser riscadas dos programas eleitorais, diz, e o tom não pode ser crispado para que os portugueses ganhem confiança nos políticos. São estes os dois pontos essenciais que o Presidente não quer que sejam deitados ao lixo pelos partidos. Por isso deixa dois recados:

  • Um: “Há que ser cuidadoso nas promessas eleitorais que se fazem e que, não podendo depois ser cumpridas, acentuam perigosamente a desconfiança dos cidadãos em relação à classe política e às instituições. Há que evitar promessas demagógicas e sem realismo. Devo ser claro: é errado pensar que os problemas que o País enfrenta podem ser resolvidos num clima de facilidades”.
  • Dois: “O ano de 2015 será um ano de escolhas decisivas para o futuro do País. É fundamental evitar crispações e conflitos artificiais que têm afetado a confiança dos cidadãos nas nossas instituições e, em particular, na classe política. As forças partidárias devem ser claras nas suas propostas, por forma a que os cidadãos possam avaliar as suas implicações.”

No entanto, mesmo que nos próximos meses todos se comportem como o desenhado pelo Presidente da República, o pós-eleições, que começa neste que é também o primeiro ano inteiro sem a troika, não deixa para trás facilidades. Até porque, lembra o Chefe de Estado, os compromissos internacionais pedem que o próximo Governo mantenha “uma estratégia acompanhada do controlo das contas públicas e do endividamento externo”.

Resumindo: Cavaco Silva começa por lembrar os 40 anos do 25 de Abril na última mensagem em que estará na plenitude das suas funções (no próximo ano já decorrerá no mês das eleições que escolher o sucessor em Belém) e a importância da data para pedir aos partidos que se entendam porque este “caminho deve ser feito em conjunto, com abertura e diálogo entre as diversas forças partidárias, contando com o contributo dos agentes económicos e dos parceiros sociais e unindo os Portugueses, como foi possível fazer em momentos decisivos da nossa democracia”.