O avançado está à sua frente. A bola pertence-lhe e pela cara e pela sensação que o corpo passa, parece estar a magicar alguma coisa. A baliza está perto, a distância curta o suficiente para servir de ponto de mira. Dali pode ser um remate ou cruzamento. O defesa, que está dentro do território da grande área, portanto, pensa e lembra-se: pelo sim, pelo não, vou encolher os braços e colocá-los atrás das costas. Porque é sempre melhor prevenir um penálti do que esperar que o guarda-redes consiga ser remédio para o parar.

Há cada vez mais defesas que o fazem. Tobias Figueiredo, contudo, não se lembrou. O central nem refilou com o árbitro, cerrou os dentes e soltou apenas uns palavrões para o ar quando, aos 23’, a bola que Pintassilgo queria transformar num daqueles remates em arco, em direção ao poste mais longe da baliza lhe tocou no braço esquerdo. Era penálti. Na baliza até estava o homem que, há 307 jogos, até se estreara pelo Sporting com um penálti defendido (contra o Marítimo, nos Barreiros, em 2006), mas Rui Patrício não remediou nada. David Simão correu, bateu com o pé esquerdo na bola e golo do Arouca.

Arouca: Mauro Goicochea; Ivan Balliu, Miguel Oliveira, Diego e Tinoco; Nuno Coelho, David Simão e Rui Sampaio; Pintassilgo, Kazembe e Roberto.

Sporting: Rui Patrício; Cédric Soares, Paulo Oliveira, Tobias Figueiredo e Jonathan Silva; William Carvalho, Adrien Silva e João Mário, André Carrillo, Carlos Mané e Fredy Montero.

Avisos até nem tinham faltado. O relvado, com buracos, zonas de pouca relva e teimoso para colocar a bola a saltitar, não ajudava e a partida era feita de muitos passes pelo ar, ressaltos e cabeceamentos. Para funcionar ali, com a bola a rolar na relva, uma jogada tinha que ter poucos passes e pés rápidos e fortes a bater na bola. Um remédio que não curava o tapete, mas ajudava a curar os efeitos que causava no encontro. Foi assim que, aos 12’, Ivan Balliu dera a bola a Roberto, avançado que fugira da área, arrastara um central do Sporting e, de primeira, a passou para Rui Sampaio que, no espaço deixado livre, rematou e viu a bola passar bem perto da barra.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Ali, num relvado feito para lutar, o Arouca lutava bem. A bola gostava mais dos leões, passava mais tempo com eles, mas só quando Carrillo, Cédric ou Mané conseguiam, com ela, ser velozes, é que a equipa se aproximava da baliza adversário. Até ao penálti o Sporting inventou três coisas perigosas. Logo no arranque, aos 3’, um mau passe de David Simão colocara a bola em Fredy Montero, que rematou de longe da baliza e atirou a bola bem para as mãos de Goicochea. Depois, aos 9’, um toque de calcanhar de Mané deu um remate a Montero que o guardião defendeu. E aos 16’ foi a cabeça de Adrien Silva, na área, a rematar a bola cruzada por Jonathan Silva, desde a esquerda, e a fazê-la passar perto, bem perto, do poste direito da baliza.

Até que lá apareceria o braço de Tobias, o remate de Pintassilgo, o remédio sem efeito de Rui Patrício e o golo do Arouca.

Muito se passou antes e pouco se passaria depois. Porque seis minutos volvidos (30’) e a bola foi parar à esquerda do ataque dos leões, a Carlos Mané, que num arranque ultrapassou Ivan Balliu, correu com a bola e passou-a depois para a desmarcação de Fredy Montero, colombiano que, com a canhota, remataria de primeira para Goicochea tocar na bola, sim, mas também ele não conseguir ser antídoto para desviar a bola da baliza. 1-1, sétimo golo do avançado na liga e o décimo marcado esta temporada.

De novo, tudo igual. Até ao intervalo nada mais houve de perigoso. A luta aumentou, a rotação também, e o Arouca parecia insistir, cada vez mais, no novato Joris Kazembe, miúdo belga, extremo canhoto, emprestado pelo FC Porto, para acelerar as jogadas e levar a bola até perto da área contrário. Resultava, pois o belga ganhava faltas e dava trabalho a quem o perseguia. E os leões iam aprimorando o remédio e tentando manter as jogadas na relva, com poucos toques e muitos passes — e erros, porque também falhavam muito.

Continuariam a fazê-lo. Adrien mostrou-o aos 47’, quando a bola lhe foi parar ao pé direito depois de um cruzamento largo de Cédric e de um passe, com a cabeça, de Mané — o médio, a 10 metros da baliza, não lhe acertou com o remate que disparou. Foi por pouco. Tão pouco quanto os centímetros que faltaram a Kayembe para, aos 50’, chegar a um cruzamento de Pintassilgo, ou os que separaram a bola cabeceada por Tinoco, aos 54’, de acertar na baliza de Rui Patrício.

O jogo estava tremido — o Sporting dominava, mas não controlava ao ponto de impedir que o Arouca fosse inventado hipóteses para marcar. Como uma gripe mal curada que dá arrepios de frio quando se pensa que o remédio fez o o seu trabalho. Mas há medicamentos que se tomam em várias doses. E se o golo de Montero foi o primeiro comprimido, André Carrillo, aos 60’, tiraria o segundo da caixa — que o árbitro, Paulo Almeida, até ajudou a abrir. Porque Pintassilgo, perto do meio campo, recebeu um chutão para a frente e tentou passar a bola a Roberto, mas o homem do apito estava no caminho.

A bola desviou, acabou em Adrien, que a passou para a entrada da área, onde estava João Mário. O médio virou-se, soltou Mané na direita que, com um passe rasteiro, pediu a Carrillo que deslizasse sobre a relva e a rematasse. Para golo e para o 2-1. O quinto golo no campeonato do peruano tranquilizou as coisas. O Arouca perdeu gás e, sobretudo, cabeça para pensar as tentativas de ataque. Não mais ameaçou a baliza de Rui Patrício. As ameaças passaram a ser coisa só de leão.

Ou de leãozinho. Um de 20 anos, alto, rápido e defesa central que, na primeira parte, deu o braço que germinou o vírus para o qual o Sporting precisou de remédio. Foi Tobias Figueiredo, com a cabeça, a desviar a bola perto do primeiro poste, num canto, e a fazer o 3-1 aos 77’. Não remediou o erro que valera o penálti ao Arouca, mas compensou-o com o golo que sacou o terceiro comprimido da caixa e curou, de vez, a vitória para o Sporting. Mas não curaria os ânimos que pairavam sobre o relvado.

Já depois de, na área, entrar de carrinho sobre Kazembe, tocar na bola, derrubar o belga e dar um trampolim para o banco do Arouca saltar e protestar, Jonathan Silva foi expulso. Aos 87’ o argentino lutou por uma bola com Roberto, que o pontapeou numa perna e fez com que o defesa do Sporting, já deitado na relva, esticasse as pernas para atingir o adversário. Criou-se um sururu, com jogadores, técnicos e até Bruno de Carvalho, presidente dos leões, à mistura, e o árbitro acabaria por mostrar o segundo cartão amarelo ao canhoto argentino.

E não estará, portanto, no relvado de Alvalade na próxima semana, quando a equipa receber o Benfica. Tão pouco estará Augusto Inácio, diretor desportivo que o homem do apito também ordenou que abandonasse o campo. Duas expulsões num minuto e um repentino ataque de febre que o jogo não soube conter — e que terá efeitos secundários no dérbi lisboeta. Aí, para Jonathan Silva, o remédio será Jefferson, lateral brasileiro que, aliás, cumpria uma partida de suspensão neste duelo com o Arouca. Para tudo o resto, o Sporting, mesmo que não tenha maneira de remediar erros que possam aparecer, terá sempre de, pelo menos, os compensar de alguma forma. Como o fez Tobias Figueiredo.