A primeira vez que o lobo se encontrou com Dakota, uma das cadelas de Nick James, olharam um para o outro sem se atacarem. Ele manteve-se firme, com orelhas levantadas, pescoço altivo. Ela estava confiante, dando sinais neutros com a cauda erguida. “Estavam os dois muito relaxados, sem o mínimo sinal de agressividade”, descreve o dono à National Geographic.

A mulher de Nick estava hesitante sobre esta aproximação. Mas um dia o lobo deitou-se de novo à porta da casa da família à espera de Dakota e o bicho acabou batizado: “Cá está o lobo Romeu de novo”, exclamou ela. E o animal ganhou um nome.

O caçador reformado tem vinte anos de conhecimentos armazenados sobre lobos no Ártico. Foi por isso que não confundiu o animal com um cão. Embora pudesse: a postura do lobo era descontraída, algo que depende da própria personalidade do animal.

“Alguns são mais prudentes e temerosos que outros. Mas este lobo estava francamente relaxado e tolerante desde o início, como se tivesse caído do céu como um unicórnio”, recorda Nick. E desde o primeiro dia que o animal rondou a família, mostrava-se afável e confortável junto dos seus membros.

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Até dos cães. Os lobos têm tendência a atacar os cães que desconhecem, podendo mesmo chegar a matá-los, porque não apreciam a companhia de estranhos à matilha. O que causou mais estranheza a Nick foi que este lobo não estava disposto a magoar os cães daquela família. Pelo contrário, parecia estar apaixonado por uma das cadelas.

Segundo Nick Jans, os receios que os humanos nutrem em relação aos lobos está na própria cultura. Desde a história do “Pedro e do Lobo” e até aos “Três Porquinhos”, não existem referências positivas sobre o animal nas histórias infantis. Mas a diferença genética entre lobos e cães não é significativa: os melhores amigos do homem partilham 99,98% da sua informação genética com o lobo. Essa desconfiança em relação aos lobos não acontece, por exemplo, com os Inuit, que são um grupo indígena. Para eles, os animais não são apenas seres semelhantes, como podem mesmo ser superiores.

Nick Jans tentou manter em segredo a existência de Romeu. Mas ao fim de alguns invernos, essa tarefa tornou-se impraticável e os jornais noticiaram a existência do lobo junto da família. As reações da comunidade foram variadas: alguns demonstraram-se extremamente hostis com o animal, pensando mesmo em matá-lo. Outros ficaram curiosos e não se importaram de coabitar com Romeu, desde que ele mantivesse distância das crianças. “Muitas pessoas ficaram fascinadas com este animal e quiseram aproximar-se dele. Ele acedeu, embora tivesse uma noção muito elástica do espaço pessoal”, explicou Nick.

Quando Romeu entrou na vida desta comunidade no Alasca já era um lobo adulto. Viveu seis anos entre os habitantes de Juneau. “Nós mantivemo-lo a salvo”, acredita Nick Jans, porque naquela região a caça é ilegal. Mas Romeu nunca foi um animal de estimação, ressalva o caçador. “Ele era o seu próprio guardião, saía e entrava conforme desejava. Por vezes desaparecia durante semanas. Estava claramente a caçar comida selvagem”, explica.

Com sessenta anos, Nick Jans considera este “o evento mais transformador” da sua vida. “É parte de quem eu sou”, acrescenta o ex-caçador. Autor do livro Um Lobo chamado Romeu, Nick confessa que existem partes da obra onde não consegue evitar as lágrimas se as lê em público. “Éramos duas espécies que trabalhavam para conseguirmos conviver em harmonia. E assim o fizemos”.