Um estudo sobre crianças que foram sinalizadas pelas comissões de proteção de menores revela que esta intervenção diminuiu o impacto negativo dos maus-tratos que sofreram em termos da saúde física e mental.

O estudo de doutoramento realizado na Universidade do Minho visou avaliar o estado de saúde física e psicológica de jovens que foram sinalizados na infância pelas Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) e a quem foram aplicadas medidas de proteção.

Para isso, foram consultados processos arquivados em CPCJ de 380 crianças, com idades entre os cinco e os 12 anos, sinalizadas entre 1999 e 2006. Destas crianças, foram localizadas 136, entre 2010 e 2011, já adolescentes e jovens adultos (com idades entre os 14 e 23 anos) que voluntariamente decidiram participar no estudo, que contou ainda com a colaboração de um grupo de jovens não sinalizados com características sociodemográficas idênticas.

A investigação analisou a adversidade na infância, psicopatologias, queixas físicas e comportamentos de risco entre os jovens a quem foram aplicadas diferentes medidas de proteção por parte das CPCJ, nomeadamente manter a criança junto da família ou institucionalizá-la.

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“Avaliamos o seu estado de funcionamento alguns anos após terem sido sinalizados e o que encontrámos foi que não existiam diferenças estatísticas significativas em termos de saúde física e mental entre estes jovens que sofreram algum tipo de intervenção das CPCJ e outro grupo de jovens que nunca foram sinalizados”, disse à agência Lusa o autor do estudo, Ricardo Pinto.

O investigador adianta que estes resultados sugerem que “a intervenção da CPCJ foi eficaz em diminuir o impacto negativo da adversidade em termos de saúde física e mental”.

No entanto, verificaram-se diferentes associações entre alguns comportamentos de risco e as medidas de proteção aplicadas na infância.

Ao grupo de crianças que beneficiou de apoio junto dos pais foi associado o início precoce de relações sexuais, enquanto no grupo de crianças acolhidas em instituições foi associada a automutilação e a ideação ou tentativa de suicídio. Já o grupo da comunidade (sem sinalização) foi associado ao abuso de álcool e relações sexuais sem preservativo.

“Embora, por um lado, estes resultados sugiram que a intervenção da CPCJ foi eficaz em diminuir o impacto negativo da adversidade em termos de saúde física e mental, estes resultados também sugerem a necessidade de mais meios humanos e mais formação dos profissionais que trabalham na área de proteção das crianças e jovens”, adiantou Ricardo Pinto.

Este reforço é importante para “aumentar a eficácia na sinalização de vários tipos de adversidade, dada a elevada probabilidade ” de estas ocorrerem ao mesmo tempo.

O investigador defendeu ainda a importância de acompanhar a criança mesmo depois do arquivamento do processo na CPCJ. “A criança foi sinalizada, esteve em risco, o processo foi arquivado, mas ela veio a sofrer de revitimização, como é que esta criança fica”, questiona.

Para o investigador, esta é uma matéria que “tem de ser mais discutida”. “Acho que ainda há muito a fazer em matéria de crianças e jovens”, rematou.