Um grupo de peritos independentes mandatados pelas Nações Unidas denunciou, num relatório, os atrasos e as falhas da Organização Mundial de Saúde (OMS) na gestão da “epidemia sem precedentes” do vírus do Ébola.

O grupo “não entende até hoje porque os alertas precoces lançados entre maio e junho de 2014 não obtiveram uma resposta adequada e séria”, indicou o relatório, cuja versão preliminar foi hoje divulgada. O relatório final será publicado em meados de junho.

A OMS declarou a epidemia de Ébola uma emergência internacional de saúde pública só a 08 de agosto.

A epidemia do vírus Ébola atingiu 26 mil pessoas, sobretudo na África ocidental, provocando mais de 10.900 mortos na Guiné-Conacri, Libéria e Serra Leoa, os três países mais afetados pelo surto.

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Em março passado, a ONU pediu a um grupo de peritos independentes que analisasse o modo de atuação da OMS e examinasse as eventuais razões das disfunções da agência internacional.

“Existe um forte consenso de que a OMS não tem uma capacidade e uma cultura suficientemente fortes para realizar operações de urgência”, denunciou o documento.

“Existiram graves lacunas nos contactos com as comunidades locais durante os primeiros meses da epidemia”, apontou o grupo de peritos, presidido pela britânica Barbara Stocking, antiga presidente da organização não-governamental britânica Oxfam (2001-2013).

A OMS tem uma estrutura frágil para responder a situações de emergência, segundo os peritos independentes, que pedem à agência das Nações Unidas para resolver rapidamente esta situação.

Uma das principais recomendações do grupo de peritos passa pelo reforço da capacidade operacional da OMS. Nesse sentido, os Estados-membros da organização são convidados a criar um fundo de urgência, mas também uma força internacional de intervenção sanitária que possa ser mobilizada de imediato.

A agência das Nações Unidas também deve criar uma equipa pluridisciplinar para responder a situações de urgência. Uma estrutura de comando, com uma liderança clara e única no seio da OMS, também deve ser criada o mais breve possível.

Os especialistas recomendam que o Conselho executivo da OMS tome uma decisão sobre estas matérias em janeiro de 2016.

Ainda sobre a reação da OMS à crise do Ébola, o relatório apontou várias razões que acabaram por ditar atrasos: má compreensão do contexto da epidemia, informações pouco fiáveis da situação no terreno, negociações difíceis com os países afetados e lacunas na estratégia de comunicação da organização.

O documento mencionou igualmente a fragilidade dos sistemas de saúde dos três países mais afetados, a desconfiança das populações locais, a permeabilidade das fronteiras e uma forte mobilidade.

“É surpreendente que foi preciso esperar até agosto ou setembro para reconhecer que a transmissão do Ébola não estaria sob controlo se não fossem aplicadas em simultâneo medidas de vigilância, de mobilização da população e de distribuição de cuidados”, sublinhou o mesmo relatório.

A resposta internacional ao surto só ganhou impulso em setembro, quando toda a rede das Nações Unidas reagiu e uma nova estrutura foi criada, a Missão de Resposta de Emergência da ONU para o Ebola (UNMEER), destacou ainda o grupo de especialistas.

Este relatório preliminar será debatido na próxima semana durante a Assembleia Mundial da Saúde, a decorrer entre 18 e 26 de maio em Genebra, Suíça.

O recente surto de Ébola foi o mais grave e prolongado desde que o vírus foi descoberto, em 1976.