É, muito provavelmente, o fim das supermodelos e o derradeiro adeus a uma era. Não há tanto tempo quanto isso, havia quem apontasse o dedo a atrizes e cantoras por estarem a roubar trabalho às modelos — ao dar o rosto (e o corpo) por inúmeras marcas, além do protagonismo que tinham em capas de revista. Agora, a conversa é outra. O que parece contar nos dias de hoje não é tanto o portefólio vasto ou a beleza exclusiva, mas a capacidade de promoção individual nas diferentes redes sociais, onde só é vencedora quem acumular mais seguidores. A indústria da moda voltou, então, as atenções para as Instagirls.

A expressão pode soar familiar e remete para jovens mulheres que, omnipresentes, servem-se do Instagram para partilhar momentos do quotidiano e criar uma ligação mais intimista com os fãs. E são precisamente estes quem define o seu sucesso e que potenciam a existência de contratos atrás de contratos. A comunicação virtual nunca esteve tanto na moda.

O fenómeno não é novo, mas tem ganho cada vez mais expressão desde que a icónica edição de setembro da Vogue norte-americana, de 2014, entregou a capa às modelos Joan Smalls, Cara Delevingne e Karlie Kloss, além do vasto editorial com outros nomes associados à mesma vaga. Foi o/um marco — o artigo definido/indefinido fica à sua escolha.

Desde então, a obsessão pelo número de seguidores tornou-se cada vez mais real, pelo que o Finantial Times debruçou-se sobre o assunto num artigo publicado a 29 de maio. Nele há exemplos claros do que se passa online e offline: a Calvin Klein, que no passado contribuiu para a ascensão de Kate Moss, tem hoje na linha da frente Kendall Jenner que, mais do que uma modelo, é estrela de um reality show e detentora de uma conta de Instagram recheada, com quase 30 milhões de seguidores. Já Cara Delevingne, o rosto britânico do momento, é seguida de perto por 13 milhões de fãs; e nenhum dos anjos recentemente contratados pela Victoria’s Secret tem menos de 60 mil fãs — Sara Sampaio, a título de exemplo, conta com 1,3 milhões.

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A relação comercial em causa tem mais para dizer além do óbvio, até porque as Instagirls têm o condão de se transformar em embaixadoras das marcas com as quais contactam: além de protagonizarem campanhas diversas, fazem anúncios, partilham e promovem as griffes nos seus canais pessoais. Por esse motivo, há agências de modelos cada vez mais focadas no scouting online (uma nova versão de caça talentos). Histórias como a de Kate Moss, descoberta num aeroporto, ou de Gisele Bündchen, cuja beleza foi avistada numa das lojas da McDonald’s, são coisa do passado.

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A propósito disso, Sarah Doukas, fundadora da Storm Model Management, que se dedica a procurar talentos no Instagram, contou ao Finantial Times que, se a modelo Cara Delevingne faz uma campanha grande, ela é duplamente paga — para posar e pelo facto de ter 13 milhões de seguidores”. O irmão de Doukas, que também dirige a agência, alegou ainda que a importância das redes sociais, enquanto canais pessoais, cresceu muito nos últimos 18 meses: “Este é um espaço de média que pertence a uma pessoa — é um ativo (…) O preço aumenta à medida que os seguidores crescem.”

Há marcas que operam nesse registo, tal como a ASOS e a Marc by Marc Jacobs, que já se serviram do Instragram para fazer o casting de modelos para determinadas campanhas (para o efeito, a segunda griffe usou a hashtag #CastMeMarc). Também a agência de modelos IMG lançou-se no jogo ao criar uma conta com o nome We Love Your Genes (“Amamos os teus genes”), com o objetivo de descobrir aspirantes a modelos através das redes sociais.

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Mas nem todos são a favor do fenómeno que está a tomar de assalto a indústria da moda. É o caso de Naomi Campbell, que sugeriu que as supermodelos da década de 1990, ela incluída, trabalhavam muito mais do que as instagirls. “Mas acredito que, às vezes, o que vem facilmente também desaparece facilmente”, comentou ainda. Outra voz de relevo alinhou-se ao lado da super: o fotógrafo Steven Meisel disse ao The Wall Street Journal que a indústria da moda “mudou muito. Agora é muito mais sobre quantos gostos temos no Instagram, o que eu não faço. Não gosto disso”.

Apesar disso, o site noticioso Refinery 29 defende que a cada vez maior mediatização de uma figura pública, tal como acontece atualmente com as Instagirls, não é fácil de conseguir e de gerir, sugerindo que a nova geração — à semelhança do que aconteceu com as anteriores — também trabalha no duro, ainda que em diferentes formatos e plataformas.

Criar uma presença online ao estilo de Kendall Jenner tem as suas pedras no caminho, até porque “há milhares de raparigas bonitas e aspirantes a modelos a colocar selfies todos os dias. Conseguir destacar-se no meio da multidão e criar uma ligação real com uma audiência (…) é muito mais difícil do que as estrelas fazem parecer”, argumenta a autora do respetivo artigo. E é provável que tenha razão.