A Fidelidade investiu no ano passado cerca de mil milhões de euros de títulos de dívida emitidos pela Xingatao Assets Limited, um veículo detido pela sua maior acionista, a Fosun, que tem como finalidade captar financiamento. A emissão de dívida de longo prazo por parte desta sociedade controlada pela empresa chinesa faz parte do reforço das fontes de financiamento para poder sustentar uma política de aquisições agressiva.

Este investimento em senior notes due da Xingtao Assets, tem validade até 2022, e representa cerca de 7,7% do ativo total da Fidelidade no final de 2014 e mais de 10% do ativo classificado para a venda. A seguradora portuguesa terá adquirido a totalidade desta emissão de obrigações que paga um cupão anual de 3,3%. Segundo a Bloomberg, o objectivo desta emissão realizada em outubro do ano passado foi o de refinanciar dívida.

Questionada pelo Observador sobre o investimento tão elevado no acionista, fonte oficial da seguradora adianta que este ativo “foi emitido e adquirido em condições normais de mercado e está admitido à negociação em mercado regulamentado europeu (Irlanda). Dado o montante envolvido, a Fidelidade tem opções de liquidez e garantias adicionais.”

Portugal é apenas um dos mercados alvo da Fosun que, depois de comprar a Fidelidade em 2014, pela qual pagou mais de mil milhões de euros, utilizou a seguradora para adquirir, através da oferta pública de aquisição, a Espírito Santo Saúde, hoje Luz Saúde. A Fosun é ainda uma das mais fortes candidatas ao Novo Banco, mas Portugal é apenas um dos vários destinos da política expansionista do empresário chinês Guo Guanchang, que gosta de se comparar com Warren Buffet.

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O conglomerado chinês tem vindo a financiar uma onda de aquisições internacionais com base sobretudo em dívida cujo valor atingiu 16,7 mil milhões de dólares (15 mil milhões de euros) no final de 2014. Esta política tem acendido luzes de alerta nas agências de rating que seguem a Fosun. Desde 1992, o grupo terá investido cerca de 31 mil milhões de dólares em aquisições e fusões, de acordo com dados da Thomson Reuters. Na calha estão novos investimentos da ordem dos sete mil milhões de dólares (6,2 mil milhões de euros), onde se incluem o Novo Banco e a sociedade imobiliária da Morgan Stanley na Austrália.

A disputa pelo Novo Banco

A Fosun foi apontada pelo Financial Times como estando entre os candidatos mais fotes à compra do Novo Banco, ao lado da sociedade financeira Anbang, também chinesa. Estes dois grupos terão feito as ofertas mais altas, na casa dos 4.000 milhões de euros. Os outros concorrentes são dois fundos americanos e o Santander.

Para sustentar a expansão internacional, a Fosun está também a realizar um aumento de capital na bolsa de Hong-Kong com uma oferta de ações que permitirá um encaixe de 1,2 mil milhões de dólares. A Fidelidade não adquiriu ações da sua acionista nesta operação, segundo fonte oficial, porque estaria impedida por a Fosun ser uma parte relacionada.

Para além de investir em dívida da Fosun, a Fidelidade tem participado como investidora direta em aquisições do seu acionista. O Club Med, uma distribuidora chinesa de filmes, uma empresa de moda alemã (Tom Tailor), estão entre os negócios que envolveram a seguradora portuguesa e que constam do balanço (o Club Med, cuja OPA se concretizou este ano, não aparece ainda em 2014). A Fidelidade lançou ainda uma sociedade de investimento imobiliário, a Fidelity Property International, que desenvolve projetos no Reino Unido e Austrália.

Caixa aprovou investimento em dívida da Fosun

Segundo fonte oficial da seguradora, a Fidelidade não tinha de comunicar especificamente o investimento de mil milhões de euros em dívida do seu acionista ao regulador, para além do reporte periódico sobre a carteira de títulos. A mesma fonte sublinha que a aplicação está descrita no relatório e contas de 2014, no capítulo de transações com partes relacionadas. E como tal, a aquisição “obedeceu a um mecanismo de aprovação específico, usual nestas situações, tendo de ser aprovada por uma maioria qualificada de administradores indicados pelos dois acionistas de referência”, ou seja a Fosun e a Caixa Geral de Depósitos que ainda controla 15% do capital. Tal mecanismo, acrescenta, aplica-se também à aquisição de valores emitidos pela Caixa.

De acordo com esta informação, a Fidelidade tinha aplicado, no ano passado, 1.816 milhões de euros em ativos classificados como para a venda de partes relacionadas. A maior fatia destas aplicações estava no veículo da Fosun, cujo valor de mercado era de 977,5 milhões de euros, abaixo do valor nominal de mil milhões de euros. Na Caixa estavam aplicados 742 milhões de euros.

Em 2013, a Fidelidade tinha mais investimento realizado em ativos e títulos detidos ou comercializados pela Caixa Geral de Depósitos, então a sua única acionista.