Há pessoas que não acreditam no poder da terapia cara-a-cara ou sentem-se intimidadas em falar com um estranho sobre o que as atormenta, sabendo que vão ter de desenvolver, entre outras coisas, a sua relação com os pais e escavar o seu passado.

A terapia cognitiva comportamental é usada como forma de tratamento para depressões e ansiedade, entre outras doenças mentais, e não pressupõe nada do que acontece normalmente num consultório psiquiátrico. Nesta terapia, a função do terapeuta é dar aos pacientes ferramentas para gerirem os seus estados de humor, fazendo-os identificar pensamentos negativos tais como “eu não valho nada” ou “as pessoas vão acabar sempre por me desiludir” e substituí-los por outros que sejam construtivos. Por exemplo, um paciente pode trocar a frase “eu faço tudo errado” por “eu sou bem-sucedido quando estou motivado e tento arduamente”. Este novo pensamento é capaz de modificar sentimentos e comportamentos.

O sucesso da terapia cognitiva comportamental é muito conhecido e há quem a considere a melhor para a depressão. O que muita gente não sabe é que não é necessário um terapeuta para fazê-la. Pim Cuijpers, professor de psicologia clínica na Vrije Universiteit Amsterdam, disse ao The New York Times que “para distúrbios mentais comuns como a ansiedade e a depressão, não existem provas de que um tratamento feito pela internet seja menos eficaz que a terapia feita cara a cara”.

MoodGYM foi desenvolvido por psicólogos australianos em 2001 e foi a pioneira neste ramo da terapia via computador. Ao longo dos anos, outros sites idênticos têm vindo a aparecer e com bons resultados.

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Doença mental, um problema global

A depressão é a principal causa de incapacidade nas mulheres em todo o mundo e a segunda principal causa nos homens. Nem sempre os cuidados de saúde são de fácil acesso, e o acesso às terapias de saúde mental é praticamente inexistente. Nos Estados Unidos, pelo menos metade das depressões graves não são tratadas e no caso dos países subdesenvolvidos esse número aumenta para quase 100 por cento.

Há pessoas que não são tratadas por não saberem que têm uma doença, outras porque não acreditam que haja um tratamento que as cure, outras ainda porque não conseguem lidar com o estigma da doença mental. Nesse sentido, a terapia online pode ajudar quem não tem um médico por perto, quem tem medo ou vergonha de ser julgado ou ainda quem não tem tempo ou dinheiro para tratamentos. É preciso ter ligação à internet, é certo, mas as grandes vantagens destas terapias online passam pela capacidade de chegarem a toda a gente, por ajudarem os terapeutas e psiquiatras a focarem-se em casos mais complexos, por fazerem com que os pacientes poupem dinheiro, bem como os sistemas nacionais de saúde, e por estarem sempre disponíveis, sejam 11 ou quatro da manhã.

Terapeuta virtual: da controvérsia para o sistema nacional de saúde

No final dos anos 90, Helen Christensen, uma investigadora de doenças mentais na Australian National University em Camberra, e a sua colega Kathleen Griffiths, trabalharam em conjunto para criar o MoodGYM, que acabou por ser inserido no sistema nacional de saúde australiano há seis anos. Atualmente, Christensen investiga e cria mais programas online, como o BiteBack, concebido para adolescentes, e o MyCompass, que visa tratar a ansiedade, o stress e a depressão em adultos mais velhos. Todos estão disponíveis a todas as pessoas com um computador pelo mundo fora.

Apesar da aceitação atual, o MoodGYM não foi bem recebido inicialmente. A sua criadora diz que “as pessoas sentiram-se ameaçadas” e defendiam que se tratava de uma ferramenta “pouco ética” e que “impedia que as pessoas procurassem a ajuda de que realmente precisavam”. Passada a desconfiança inicial, o MoodGYM tem sido um sucesso. Na Austrália é usado por cerca de 100 mil australianos por ano e os seus usuários, a nível mundial, são provenientes de 200 países diferentes.

Embora a Austrália tenha servido de cobaia, outros programas de terapias cognitivas comportamentais são muito usados na Holanda, na Suécia e no Reino Unido. Em 2007, o serviço nacional de saúde britânico passou a cobrir um programa chamado FearFighter destinado às fobias e à ansiedade, bem como o Beating the Blues, destinado à depressão.

A terapia online é eficaz contra uma variedade de distúrbios. Segundo uma série de estudos suecos, a terapia revelou-se extremamente eficaz em doenças como a depressão, ansiedade (nos seus diferentes níveis), síndrome do cólon irritável, disfunção sexual feminina, distúrbios alimentares, uso de canábis e vício no jogo.

Tal como outros programas, o MoodGYM pode ser usado de forma auto-guiada, ou seja, sem recurso a humanos. No entanto, quem usa este programa sozinho tende a ver um menor efeito — embora ajude, não ajuda tanto como ter o programa aliado a um contacto humano ocasional que passa por falar com um terapeuta de vez em quando.

O poder do terapeuta é encorajar e não deixar as pessoas desistirem, uma situação que acontece frequentemente. Um estudo feito com adolescentes descobriu que praticamente 60 por cento dos usuários do MoodGYM pararam a terapia ao fim do primeiro módulo, exatamente porque não recorreram a apoio. Quando o mesmo programa foi monitorizado, apenas 10 por cento deixou de o usar. No fundo, é o que acontece com um ginásio normal: no início toda a gente está cheia de vontade de ir, mas com o tempo a maior parte acaba por se fartar.

Para Ricardo Muñoz, professor de psicologia clínica na Universidade de Palo Alto, as terapias online podem funcionar como prevenção. O professor defende que, após um primeiro episódio de depressão, a probabilidade de existir o segundo é de 50 por cento e o terceiro de 70. A partir daí, a probabilidade aumenta para 90%. Daí a necessidade de prevenir o primeiro episódio.

No futuro, Muñoz espera que estes programas possam chegar a toda a gente, através da tradução para todas as línguas e da adaptação das terapias às diferentes síndromes, do tabagismo à dor.