A Segurança Social tem estado no centro das atenções dos partidos e estará no centro das atenções na campanha eleitoral que se avizinha. Há (pelo menos) duas visões diferentes do estado do sistema de pensões, mas todos concordam que alguma mudança tem de ser feita para garantir a sustentabilidade futura. Divergem no diagnóstico e no remédio.
Desde 2011, várias foram as mudanças legislativas que afetaram o sistema de pensões (tanto a Segurança Social como a Caixa Geral de Aposentações) e foram sobretudo tomadas como medidas extraordinária de corte na despesa. Os exemplos mais importantes foram os cortes nas pensões (através da convergência dos regimes para as situações futuras, para as que já estavam em pagamento foi chumbado pelo Tribunal Constitucional); o congelamento da atualização de pensões; e as Contribuições Extraordinárias de Solidariedade (nas suas várias versões).
Mas não foram as únicas medidas a mexer na Segurança Social. Houve mexidas nas prestações sociais, como regras mais apertadas para o Complemento Solidário para Idosos (CSI) ou para o Rendimento Social de Inserção (RSI), mas também uma viragem para o terceiro setor. Com este Governo houve mais protocolos com instituições particulares de solidariedade social (IPSSs) e com misericórdias.
Se estas foram mexidas que resultaram sobretudo de alterações legislativas, um dos grandes impactos no sistema foi resultado direto da situação financeira e económica do país: o desemprego. O aumento dos desempregados levou a um disparar dos subsídios, que entretanto têm vindo a reduzir. Se aqui a questão teve a ver sobretudo com a conjuntura, também houve mexidas na duração da prestação e mudanças maiores no subsídio social de desemprego.
Este é o retrato geral das mexidas em quatro anos de governação em que “o sistema não esteve a operar normalmente porque estivemos numa situação de excecionalidade”, justifica Jorge Bravo, especialista em Segurança Social e um dos homens que contribuiu para o programa da coligação PSD/CDS.
Mas afinal, qual o estado atual das pensões. Jorge Bravo, professor da Universidade de Évora, não tem dúvidas: é preciso uma verdadeira reforma até porque “a parte contributiva não gera receitas suficientes para pagar as prestações existentes”. Uma ideia que está explanado num relatório da Segurança Social que fez uma avaliação do sistema de pensões até 2060, divulgado o mês passado, em que conclui que a Taxa Social Única (TSU) tinha de ser mais alta para fazer face às despesas do sistema. Tendo como base esta ideia, Bravo defende que “este é um desafio de longo prazo, para as próximas gerações. Não podemos viver nesta gestão da excecionalidade de maneira permanente”.
Soluções, cada um tem a sua ideia. Há uma melhor que a outra?
No campo das soluções, Bravo aponta sobretudo duas para que o buraco nas pensões não seja permanentemente tapado por transferências do Orçamento do Estado. Como primeira solução, o especialista defende que, a não haver um aumento das contribuições, tem de haver pelo menos uma nova distribuição do valor destas contribuições pelas diferentes prestações, de forma “a que o sistema não gere mais défice”. Ou seja, a cada prestação social (subsídio de desemprego, doença, etc) é alocada uma percentagem da contribuição paga e, de acordo com o mesmo estudo, há prestações que estão a precisar de menos valor de contribuições e outras que precisam de mais.
Além desta ideia, Bravo defende que se deve diversificar as fontes de financiamento (sem no entanto avançar como) ou mesmo a de estimular os fundos complementares à reforma, não apenas particulares (Planos Poupança Reforma), mas também os coletivos (fundos de pensões de empresas). Mas apenas se foram de forma complementar, para não haver uma redução do valor recebido pela Segurança Social.
Visão oposta tem Mário Centeno, o coordenador do cenário macroeconómico do PS. Concorda no diagnóstico, mas não concorda na solução para que a Segurança Social seja sustentável. “A palavra de ordem é o emprego”, esclarece.
Para o economista, o “sistema nunca vai ser sustentável se se mantiver o nível de emprego como temos hoje”. Até porque, lembra, o problema da Segurança Social não é apenas demográfico, mas económico. Centeno lembra o último relatório da Comissão Europeia (CE) sobre o envelhecimento da população que mostra que o país continuará a perder população nos próximos anos e que para fixar ou não perder população é preciso trabalhar tanto no plano económico como demográfico: “Como não há uma solução milagrosa na Segurança Social, a única coisa que se pode fazer é ir mexendo nas políticas e torná-las mais amigas do emprego, sobretudo o de qualidade”, diz.
No plano para a Segurança Social, o economista (tal como o programa do PS) defende uma diversificação das fontes de financiamento do sistema para o tornar equilibrado. Centeno insiste na ideia de que é preciso um “equilíbrio” e por isso, se por um lado defende que se pode retirar contribuições, mesmo que de forma extraordinária através da redução da TSU para trabalhadores e empregadores, também recorda que a intenção é arranjar novas formas de financiar o sistema, através do IRC ou do imposto sobre heranças.
Mas se no próprio sistema, acredita que em termos de políticas pouco pode ser feito para afetar a parte contributiva além das políticas de promoção do emprego, o mesmo não acredita na parte não contributiva. Centeno defende mais atenção à parte da ação social em contraste com o que fez este Governo que se concentrou mais na redução de outras prestações como o Rendimento Social de Inserção ou o Complemento Solidário para Idosos (CSI).
Centeno lembra que com este Governo houve um aumento do apoio ao terceiro setor e por isso quer mais rigor nesses protocolos. “É preciso olhar para a eficácia dessas políticas”. “A política de ação social não tem condição de recursos. É um conjunto de verbas que é aplicada pelo Estado, não há critérios de utilização e por isso é preciso tornar mais eficaz esse dinheiro, até porque pode criar-se uma disparidade de apoios”, acrescenta.