Entre o “esperar para ver” e o “não comento casos de Justiça”. É este o estado de espírito que atravessa o PS depois da detenção de Armando Vara no âmbito da Operação Marquês. Apesar do cuidado em não comentar o caso até que existam novas informações, há quem no Largo do Rato esteja “preocupado” com os últimos desenvolvimentos ou até quem ache “estranho” o timing da detenção do ex-ministro adjunto de António Guterres.

Ao Observador, Vera Jardim, ex-ministro da Justiça de Guterres, deixou claro que “é preciso aguardar” antes de tecer quaisquer comentários definitivos. Afinal, o caso está fresco e ainda não são conhecidos todos os detalhes. Ainda assim, o socialista não escondeu que a detenção de “alguém que ocupou cargos governativos nunca é uma coisa agradável. É óbvio que é preocupante”.

Desafiado a responder sobre a hipótese de a detenção do ex-ministro e ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos e do Millennium BCP poder vir a prejudicar o PS, Vera Jardim admitiu, mais uma vez, que se trata de uma situação que “não é agradável para o PS”, assim como não é “agradável para PSD ter um ex-líder da bancada parlamentar detido”, referindo-se, embora sem o especificar, a Duarte Lima, que apesar de em 2014 ter sido libertado da prisão domiciliária, ainda está a braços com a Justiça brasileira no caso do homicídio de Rosalina Ribeiro.

Sobre a tese de José Sócrates, que em diversas ocasiões tem dito que é um preso político e que este processo tem como objetivo único prejudicar o PS nas próximas eleições legislativas, de Vera Jardim, nem uma palavra. O deputado socialista prefere não estabelecer qualquer ligação entre o plano político e a Justiça e a regra aplica-se também à detenção de Armando Vara.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O mesmo respondeu José Lello. Em declarações ao Observador, o ex-ministro da Juventude e do Desporto de Guterres – o homem escolhido para suceder, na altura, Armando Vara – disse “não fazer considerações” desse género, admitindo, no entanto, que não deixa de ser “estranho” o argumento de “perigo de fuga” utilizado para a detenção de Armando Vara – embora não tenha sido confirmado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), na noite de quinta-feira houve vários órgãos de comunicação social que avançaram com essa explicação. “[Ora], ontem diziam que era perigo de fuga, depois de ele ter estado este tempo todo no país”, começou por comentar José Lello, antes de acrescentar que, a verificar-se esse cenário, não deixa de ser “inopinado”.

Sobre se a detenção de mais um ex-governante socialista poderia prejudicar o PS nas próximas eleições, José Lello disse que “nunca [refletiu] sobre isso”, lembrando, no entanto, que “o PS tem um programa próprio”, que “António Costa está a fazer o seu caminho” e que, de acordo com as últimas sondagens, “tem a confiança do eleitorado”. “[Como se vê] não há nenhum fator estranho à campanha a afetar o partido, nem esse, nem a situação na Grécia. Os portugueses que votam têm uma agenda própria que não será afetada por fatores colaterais”, insistiu.

A detenção de Vara foi conhecida no mesmo dia em que uma nova sondagem dava o PS à frente, a distanciar-se da coligação PSD/CDS e em que Costa era entrevistado na TVI.

Apesar de o assunto estar a ser tratado com pinças pelo socialistas, há quem no Largo do Rato diga que o timing da detenção de Armando Vara não deixa de ser “estranho”. “Este anúncio cai em cima da entrevista de António Costa e das sondagens [que dão o PS à frente da coligação] e acontece pouco tempo antes da comissão política do PS”, disse fonte do PS que preferiu não ser identificada, referindo-se à reunião desta sexta à noite.

Ainda assim, a mensagem oficial é, tal como tem repetido António Costa, “à Justiça o que é da Justiça, à política o que é da política”. Foi isso que disseram Renato Sampaio e Eduardo Cabrita, ambos ex-dirigentes de José Sócrates, contactados pelo Observador. “Não comento questões de Justiça”, repetiram. Já André Figueiredo, deputado socialista, preferiu não fazer qualquer comentário sobre o caso.

O ex-primeiro-ministro José Sócrates, detido em Évora no âmbito da Operação Marquês, já disse que a sua prisão tem por objetivo impedir que o PS ganhe as próximas eleições legislativas, no outono, mas António Costa não quer subscrever esta teoria da cabala.

Armando Vara é ouvido esta sexta-feira pelo juiz Carlos Alexandre, no Tribunal de Instrução Criminal, no primeiro interrogatório judicial que determinará a aplicação das respetivas medidas de coação. Vara foi detido quinta-feira à noite no âmbito da Operação Marquês, depois de buscas em todo o país, que incluíram a sua casa e a sede da Caixa Geral de Depósitos. Em causa estão suspeitas em relação ao envolvimento da Caixa Geral de Depósitos (CGD) no processo de construção do resort de Vale de Lobo, na altura em que Vara era administrador do banco público.

Mário Soares considera que a detenção de Vara “não é” um momento difícil para o PS

O fundador do PS visitou esta sexta-feira José Sócrates, no Estabelecimento Prisional de Évora, acompanhado pelo ex-ministro Capoulas do Santos. Questionado pela CMTV sobre se a detenção de Armando Vara, na quinta-feira, no âmbito da Operação Marquês, “é mais um momento difícil para o PS”, o ex-Presidente da República limitou-se a dizer que “não, não é”.

Horas depois, no Facebook, José Lello elogiou a atitude de Mário Soares, considerando que Mário Soares “deu mais uma grande lição de solidariedade socialista”, mesmo depois de uma semana marcada pela morte de Maria Barroso.

Lello revelou ainda a conversa que teve com Mário Soares pouco depois dessa visita. Segundo o deputado socialista, Mário Soares terá dito que José Sócrates continua a revelar “coragem” e “força anímica”.

* Artigo corrigido e atualizado com a posição de André Figueiredo sobre o caso