Um robô que quer facilitar a vida dos pescadores em alto mar ou um algoritmo que promete detetar o vírus HIV três dias após infeção. No COHiTEC, a inovação é 100% portuguesa – nasce nos laboratórios de investigação das universidades e cresce para se emancipar no mercado tecnológico. Porque a ciência também se comercializa. É cada vez mais uma “alternativa”, diz Pedro Vilarinho, coordenador do programa COHiTEC.

Esta terça-feira, há 15 projetos de baste tecnológica que vão ser apresentados a um júri no Pavilhão do Conhecimento, em Lisboa. São o resultado de quatro meses de trabalho no âmbito do programa COHiTEC – ação de formação para investigadores que pretendam avaliar o potencial comercial das suas tecnologias e que constitui a primeira etapa do programa de aceleração de empresas ACT by COTEC.

Foram 46 investigadores, 14 estudantes de gestão e 33 mentores que, em conjunto, tiveram 100 horas de contacto para avaliar o potencial comercial das tecnologias e desenvolver um plano de negócio. “Este ano tivemos menos projetos das áreas das ciências da vida e mais da área industrial”, explicou Pedro Vilarinho ao Observador. Em 12 edições, o coordenador não duvida: à medida que os anos vão passando, vão surgindo “diferenças substanciais”.

“Notamos que as pessoas mais novas olham para a criação de empresas como uma carreira alternativa, dada a incerteza que têm na carreira de investigadores. Conseguimos observar nestes últimos anos que os membros das equipas têm uma atitude muito empreendedora. Quando começámos, isto não era tão claro, mas agora reparamos que começa a generalizar-se em todas as equipas”, explicou.

Com investigadores mais sensibilizados para a hipótese de comercializarem as descobertas que fazem dentro dos laboratórios, Pedro Vilarinho explica que são as universidades que têm orientado mais os alunos “para pensarem na criação de empresas como uma decisão de carreira”. “Se no nosso tempo houvesse estas coisas, muitos de nós teriam optado por uma carreira empreendedora”, revela.

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Sozinhos à procura de peixe

Anders Lyhne Cristensen tem 38 anos, é dinamarquês, e a mente por detrás da tecnologia do projeto Ocean Swarm, finalista do evento desta terça-feira. Anda há 12 anos a trabalhar no sistema de inteligência artificial que vai permitir que pequenos robôs automáticos (drones) naveguem sozinhos para detetar as melhores zonas para a pesca. É com este projeto que quer conquistar o júri e procurar o investimento que vai possibilitar a produção de pelo menos 100 drones.

“Estamos a desenvolver um sistema de inteligência que permite que os drones realizem missões sozinhos, que descubram para onde devem ir, coordenando-se com os outros drones do grupo”, explica ao Observador.

A ideia de desenvolver este tipo de tecnologia surgiu enquanto tirava um doutoramento em Bruxelas, mas só há dois anos percebeu que o melhor seria aplicá-la na economia do mar. “Sempre quis lançar um projeto meu”, disse.

Em Portugal desde 2007, altura em que decidiu que era neste país que queria constituir família, percebeu que era o local ideal para pôr a ideia à prova, pelo “potencial” da tecnologia” e pela vasta área marítima que rodeia as fronteiras. Para avançar com o projeto, os investigadores estimam que precisem de um investimento de cerca de dois milhões de euros.

Os chips que querem revolucionar a deteção do HIV

Da robótica à saúde. Com o DAILA, João Nunes, Pedro Valente e Ana Rita Figueiredo querem revolucionar a deteção do vírus da imunodeficiência humana (HIV), que provoca a Sida. O algoritmo em que têm estado a trabalhar pode ser aplicado em proteínas e aumentar a sensibilidade de determinado dispositivo. Só durante o COHiTEC perceberam que poderiam direcionar a tecnologia especificamente para a deteção do HIV.

“Tivemos a possibilidade de aprofundar o potencial da tecnologia. Sabemos que o diagnóstico precoce do HIV é extremamente importante, mas os testes de hoje permitem diagnósticos entre quatro e oito semanas e nós achamos que conseguimos fazer melhor: propomos um tempo de diagnóstico três dias após a infeção”, explicou João Nunes ao Observador.

Foi no final do doutoramento que estava a fazer em Biologia que João Nunes, 33 anos, decidiu arriscar num projeto seu e dar por encerrada a vida académica. “Percebi que tinha algo disruptivo em termos tecnológicos e decidi investir no algoritmo”, conta. Conheceu Pedro Valente, 30 anos, num jantar de amigos e perceberam que queriam ambos o mesmo: empreender. Ana Rita Figueiredo, 25 anos, juntou-se mais tarde.

Ao Observador, conta que o teste que está a desenvolver não precisa de assistência laboratorial. Basta uma gota de sangue que é colocada num dispositivo. Este, por sua vez, integra um chip com o algoritmo desenvolvido por João Nunes. No próximo ano e meio, estima ter o projeto pronto para avançar para a prova de conceito. A ideia é que a tecnologia possa ser aproveitada para detetar mais precocemente outras doenças, como a tuberculose.

Para chegar à prova de conceito, os investigadores estimam precisar de um investimento de cinco milhões de euros. O COHiTEC conta com o apoio da Caixa Capital, sociedade gestora de fundos de capital de risco do grupo Caixa Geral de Depósitos, que investe um total de 200 mil euros em duas startups do programa, todos os anos.

O COHiTEC é realizado em parceria com o Centro HiTEC da North Carolina State University, a Porto Business School e o INDEG-IUL ISCTE Executive Education. Desde 2004, já participaram 136 projetos, num total de mais 600 participantes. Até à data, os projetos de negócio deram origem a 26 empresas de base tecnológica e vocação global.