Na última semana de julho, a Sage — empresa que produz e comercializa software de gestão — reuniu em Nova Orleães (EUA) 7500 participantes de todo o mundo para a Sage Summit 2015. O palco foi o centro de convenções Ernest N. Morial, local escolhido para a apresentação de novos produtos e para o anúncio de uma mudança importante no paradigma tecnológico da Sage, sobre o qual falamos neste artigo. O espaço era gigantesco e incluía um centro de exposições, uma sala de refeições e um auditório, onde estava instalado um ecrã com dezenas de metros, tecnologia de ponta a servir de pano de fundo para um espetáculo made in USA.

A convenção começou na segunda-feira (27/7) com um dia reservado a painéis e reuniões internas da Sage, às quais a imprensa não teve acesso. Só no dia seguinte começaram as conferências (ali chamadas de “keynotes”), com uma conversa entre o novo CEO da Sage, Stephen Kelly, o General Colin Powell e Deepak Chopra, autor e fundador da Chopra Foundation. Foi a primeira de três, que se realizaram entre terça e quinta-feira, depois do pequeno-almoço servido numa sala de refeições gigante, impecavelmente organizado. Foram servidas duas refeições por dia a 7500 pessoas, sem filas e atrapalhações. Os participantes sentavam-se em grandes mesas redondas, onde houvesse lugar. As refeições foram momentos privilegiados para conhecer pessoas e estabelecer contactos. A informalidade foi incentivada pela própria organização, mas nem era preciso, a cultura norte-americana é propícia a conversas fáceis, rapidamente se ouviam todo o tipo de discussões entre desconhecidos, da economia à gestão, passando pela política e pelo futebol (americano).

As “keynotes” principais abordaram temas relacionados com o empreendedorismo e inovação, histórias de vida que serviram de exemplos de motivação. A relevância dos convidados, todos profissionais com carreiras de sucesso, fez das sessões da manhã as mais concorridas. O mote foi dado por Stephen Kelly: “Imagine Now”, como será o seu negócio no futuro? Histórias e ideias ilustraram percursos e apontaram novas direções, para um público de empreendedores muito motivados. Mas não se pense que estas apresentações se basearam apenas em diretrizes empresarias, muito pelo contrário. O sumário é transversal e tem aplicações para os negócios, mas também para a vida.

O General Colin Powell, ex-Secretário de Estado no Governo de George W. Bush (2001-2005) foi uma das presenças mais destacadas no evento. Figura pública de importância incontornável, apresentou-se descontraído e bem-humorado — aliás, a “leveza” destas conversas foi de encontro ao estilo do CEO da Sage, Stephen Kelly, que não teve problema nenhum em subir para uma mesa durante um jantar da Sage Europa, ao final do segundo dia. Colin Powell falou sobretudo da realidade que melhor conhece, a norte-americana. Começou por dizer que estava ali também porque já tinha gerido um “pequeno negócio” (referia-se às Forças Armadas dos Estados Unidos da América) e sublinhou a urgência de “investir a sério na infraestrutura Wi-Fi dos EUA”, país que está ainda (globalmente) muito atrasado em relação a outras potências. Disse que “presidentes da câmara e governadores estão a fazer um bom trabalho, mas Washington não”; apesar do crescimento económico, as rivalidades no Congresso (entre Democratas e Republicanos) estão a atrasar o progresso tecnológico. Colin Powell vê na tecnologia e na mobilidade uma ferramenta essencial para o crescimento económico — Deepak Chopra concordou, nada de novo. “E daqui a dez anos?” Perante a pergunta de Stephen Kelly, o autor e médico indiano reforça a necessidade de levar para a frente a “economia global” mas fez uma ressalva muito aplaudida: “a tecnologia deve ser usada com inteligência, não para nos tornarmos escravos dela”.

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A conversa entre os três seguiu mais virada para o mundo empresarial, com algumas ideias importantes. O ex-Secretário de Estado defendeu que “os empregados têm de saber ‘para que’ trabalham”, devem conhecer o propósito e objetivos da empresa para estar motivados e ser produtivos. Deepak Chopra olhou de outro ângulo: “Um bom gestor é como um treinador, tem de estar sempre atento aos seus empregados. Para um patrão, os empregados devem estar em primeiro lugar, os clientes só em segundo.”

À pergunta “como atrair os melhores profissionais para as empresas”, Chopra sublinhou a componente emocional, dizendo que é fundamental ser bom observador e saber “ouvir o outro com a alma”. E quando se referiu à sorte nos negócios, não hesitou em dizer que “sorte é estar preparado”.

Chopra e Powell deram ênfase ao papel da educação na melhoria da qualidade de vida da sociedade: “A educação é fundamental na criação de uma comunidade de empregados e consumidores” e com a educação a “humildade, fundamental na vida e nos negócios”, disse o General. Colin Powell desafiou Deepak Chopra a lançar uma ideia final para a audiência: “amor e serviço”. Em teoria, a mensagem passou.

No dia seguinte (quarta-feira) foi a vez de Chad Hurley subir ao palco, a convite da (animada) presidente da Sage North America, Jodi Uecker. Hurley foi co-fundador do YouTube, empresa que vendeu à Google por 1,65 mil milhões de dólares em 2006. Multi-milionário ainda antes dos 30 anos de idade, contou que sempre gostou de tecnologia mas não necessariamente de a criar, “gosto mais de a usar, de entender o que se pode fazer com ela”. A esse propósito, identifica como uma das grandes vantagens do YouTube a uniformização dos formatos vídeo, muito desorganizados naquele tempo (2005). “O YouTube foi uma porta que se abriu para a criatividade”, processo que se democratizou com a compra da Google, “sem ela não seria possível”. Chad Hurley está atualmente a trabalhar na automação de processos em vídeo. É da opinião que “editar vídeos ainda é muito complicado para a maioria das pessoas” e que são precisas melhores ferramentas. Quando confrontado por Jodi Uecker sobre “de onde lhe aparecem as ideias”, contou que lhe “surgem de um quadro em branco. Não são revelações, são detalhes, perceções”, palavras de um homem que nunca soube bem o que queria fazer na vida e que ainda hoje não sabe (palavras dele).

No painel seguinte, sob o mote “Down but not out” (enfraquecido mas não vencido) a atriz e empresária Jane Seymour falou do percurso de vida atribulado, sobre como é estar na ribalta e logo depois na banca rota. Considera que “os desafios são sempre uma oportunidade” mas não é para todos, é necessário que haja por detrás uma ambição. “Sem ambição não há negócio”, contou a empresária britânica Karren Brady: “há ideias que não se transformam em bons negócios apenas porque falta ambição”. “Não devem ter medo de experimentar, se não resultar não faz mal”, disse Brandi Temple. Parece fácil. Neste painel, as três reforçaram a importância de incluir mais mulheres no mundo dos negócios, uma preocupação demonstrada pela Sage ao longo de todo o evento, em particular nas áreas da tecnologia de informação (TI) — assunto que já abordámos aqui.

No quarto e último dia da Sage Summit (30 de julho) foi a vez de reunir Dolly Sigh, William McDonough e Bre Pettis, que seguiram o mantra de Steve Jobs, “Stay hungry. Stay foolish.” Contaram como ser imprudente e arriscar são uma parte fundamental do negócio. Mas “as ideias boas são as que acrescentam valor”, dizia McDonough (Presidente do Fórum Económico Mundial – FEM). E vão ser precisas muitas e boas: “Isto como está não pode continuar”, disse a propósito do Ambiente e da sustentabilidade, uma preocupação transversal no painel. O presidente do FEM defendeu, por exemplo, a necessidade de eliminar o conceito de lixo, “as coisas que usamos têm de ser desenhadas para ser devolvidas à natureza”. E fechou com uma frase de mestre, que encaixou que nem uma luva no espírito empreendedor da cimeira da Sage: “Não queres ser o melhor dos melhores, queres ser o único a fazer o que fazes.”

No último dia a apresentação reuniu três figuras particularmente mediáticas: Matthew Weiner (criador da série Mad Men), Trevor Noah (o futuro apresentador do programa The Daily Show) e Tony Hawk (skateboarder profissional). Em discussão esteve o modo como se constrói e gere uma base de fãs. Mas a conversa andou por muitos outros sítios — em bom rigor, foi de todas a mais divertida, ao ponto de ser difícil de ouvir tal era o volume das gargalhadas e palmas da assistência — mas anotámos uma ideia sublinhada por Trevor Noah: “Qual a diferença entre um ‘hater’ e um fã? Bem, um ‘hater’ nunca pode ser agradado. Um fã é aquele que te diz que não gostou de determinada coisa que fizeste e até te explica porquê. Aqueles que ‘estão do contra’ estarão sempre, faças o que fizeres.”

O Observador esteve presente na Sage Summit 2015 a convite da Sage Portugal.