Fernando Nelas Pereira, de 61 anos, já fez “milhares e milhares” de artigos tradicionais de cestaria, mas há cerca de 20 anos decidiu dar asas à imaginação e fabricar peças diferentes e em tamanho gigante. Das mãos do cesteiro, que começou a trabalhar na arte da cestaria com 11 anos, já saíram quatro carroçarias e réplicas de carros à escala normal, monumentos, casas, barcos, animais, motorizadas e bicicletas, entre outras peças.

O artesão contou à agência Lusa que sempre teve tendência para a inovação e mesmo quando trabalhava para patrões tinha necessidade de estar “sempre a criar”. Fernando faz as peças invulgares no dia-a-dia, em simultâneo com as encomendas que lhe garantem o sustento familiar, por ser “doido” pela arte. Lembra que começou a fazer artigos em vime diferentes do habitual há cerca de 20 anos, quando a Junta de Freguesia de Gonçalo lhe encomendou um cesto gigante para embelezar uma rotunda da vila, localizada a 20 quilómetros da cidade da Guarda.

Depois disso, nunca mais parou, seguindo-se a réplica da sua casa de habitação, o barco Titanic, a armação de um carro com formato de javali e outra de um Fórmula 1.

A criatividade prosseguiu e hoje tem na sua loja/oficina réplicas gigantes de animais, um avião, uma caravela, um homem, o castelo de Belmonte, a carroça da série televisiva Bonanza, a ponte 25 de Abril, taças, chapéus, aves, carrinhos de rolamentos, cestos de vários formatos, guitarras, instrumentos de sopro, entre outros.

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“O que me passa pela cabeça, faço”, assegurou à Lusa, indicando que também aceita encomendas, sendo as mais recentes as réplicas de um carro francês e da Fragata D. Fernando II. O carro Fórmula 1 [um VW Carocha de 1.300 cc de cilindrada com o chassi transformado de cinco lugares para um] foi o projeto que lhe deu mais trabalho, revelando que levou “mais de um ano” a fazer.

O cesteiro gostava que o veículo, que é único, fosse comprado pelo piloto espanhol Fernando Alonso, “por ser um bom piloto” e “um grande homem no volante”. “Queria negociar com ele”, disse, admitindo enviar-lhe fotos da viatura via Facebook para lhe propor o negócio do carro que só venderá “por uma boa quantia”.

Na execução das dezenas de peças gigantes e invulgares que expõe no seu estabelecimento, à entrada da vila de Gonçalo, o artesão assume que gastou “milhares e milhares de horas”.

As obras em vime estão quase todas à venda, sendo que, por exemplo, a réplica do barco Titanic custa 12 mil euros. “Todas estas peças que fabrico só as vendo porque preciso de dinheiro para o dia-a-dia”, justifica. No futuro, Fernando Nelas gostava que os seus trabalhos invulgares, que encantam os clientes da loja, continuassem naquele local depois de transformado em museu.

E também cestos para supermercados da Serra Leoa

Fernando Nelas Pereira tem também de ganhar a vida como cesteiro, e por isso mostra-se hoje animado com a possibilidade de fabricar “milhares” de cestos para supermercados da Serra Leoa. A encomenda pra a produção de cestos, de forma retangular, surgiu por intermédio de um empresário de Vila Nova de Gaia.

“Já me trouxeram uns modelos daquilo que eles vão precisar e eu acho que são milhares e milhares de cestos. Talvez [o seu fabrico] não seja com o vime, parte deles, ou quase todos, mas será com materiais sintéticos adequados para o pão, para a fruta e para tudo”, explicou.

Fernando Nelas Pereira disse à Lusa que ainda está na fase de produção dos modelos, mas acredita que a encomenda está segura. “O cliente já quase me garantiu a encomenda e vamos negociar. Serão milhares de cestos” para equipar móveis de supermercados onde os produtos estarão expostos aos clientes, disse. A encomenda para a Serra Leoa “vai ser bem paga”, embora não adiante valores por a mesma ainda se encontrar na fase de negociação.

Apesar de os cestos poderem ser produzidos com material sintético plastificado, que imita o vime, o cesteiro admite que “vão ficar muito vistosos”. O artesão acredita que este negócio poderá ser a “salvação do setor” que tem definhado ano após ano devido à utilização dos plásticos e à concorrência dos produtos chineses. A confirmar-se, como espera, será bom para si e para outros cesteiros da terra que envolverá no projeto.

Gonçalo já teve 700 cesteiros

A vila de Gonçalo, que tem o epíteto de Capital da Cestaria, já teve “mais de 700 cesteiros” e atualmente possui “uns vinte” no ativo, segundo Fernando Nelas Pereira. “Há 50 anos Gonçalo tinha um fabrico de 3.500 cestos por dia, que era uma média de cinco cestos por cada cesteiro. Hoje faz-se uma média de 40 ou 50 cestos, portanto, a arte está terminada, porque eu tenho 61 anos e o mais jovem cesteiro é um rapaz com trinta e poucos anos, que anda aos dias a trabalhar no campo”, adiantou.

Devido à diminuição das encomendas, o artesão, que chegou a ter cinco empregados, trabalha hoje sozinho na sua oficina. A arte da cestaria “não tem ajudas” e é difícil “porque é feita em água”, apontou, explicando que nos meses de inverno é necessário “retirar os vimes dos tanques” onde são colocados para ficarem moles e poderem ser trabalhados.

O cesteiro mostra-se “triste” por verificar que a arte que abraçou aos 11 anos “está a desaparecer” e apela ao Governo e à Câmara Municipal da Guarda que ajudem na sua manutenção. “O cesto é a peça mais utilitária que existe, embora hoje se fabrique mais para decoração”, concluiu.