Os primeiros minutos do debate entre António Costa e Jerónimo de Sousa assemelharam-se mais a uma entrevista a dois do que a uma troca de argumentos em período eleitoral. Emprego, educação, saúde e segurança social apenas serviram para aproximar os cabeças de lista do PS e PCP nas críticas à coligação e o debate só surgiu sobre a permanência de Portugal no euro. Jerónimo garante que a CDU é “gato escaldado” com as promessas do PS e Costa pediu ao PCP e aos Verdes que esclareçam pontos do seu program antes de se chegar a um entendimento pós-eleitoral.

Durante o debate que decorreu esta quarta-feira an SIC Notícias, Costa disse que nos temas de fundo, “que dizem respeito à vida das pessoas”, que sabe que poderá contar com o PCP e que o diálogo é possível. Algo reiterado por Jerónimo de Sousa, que disse no passado já ter convergido com propostas do PS, mas garantiu que não está disposto a trocar a sua ideologia de fundo por um ou dois lugares num Executivo de coligação com o PS. “Este caminho para o desastre que foi construído pelo PS, PSD e CDS precisa de rutura e mudança e aquilo que o PS propõe não é uma rutura. É a continuidade”, garante Jerónimo.

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“Eu também gostaria de dizer que eliminava tudo de uma vez [cortes e taxas extraordinárias]. […] Temos de conseguir uma solução equilibrada que seja viável, sem romper com aquilo que é a saída do euro. O que temos é um program viável no quadro do euro e não queremos correr o risco de sair do euro”, disse António Costa

“Em termos de política fiscal, creio que António Costa deu aqui um exemplo claro que é não se compromete. O grande problema aqui é que, como diz o nosso povo, gato escaldado da água fria tem medo. Temos verificado por parte do Partido Socialista este posicionamento de definir objetivos mas não os quantificar nem de os calendarizar e isso não se concretiza”, disse Jerónimo de Sousa

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O único momento do debate em que houve uma troca mais acesa entre os dois candidatos foi exatamente o momento quente e foi quando se falou sobre a saída do euro. António Costa diz que não acredita que o PCP queria meramente preparar a saída do euro, acusando o partido de estar pronto a romper com a União Económica e Monetária caso fossem Governo. “No próprio programa do PCP, estão enunciadas as consequências da saída do euro e as consequências são draconianas”, disse o socialista.

Jerónimo de Sousa defendeu que o objetivo do PCP é estudar essa possibilidade, quer seja decisão dos portugueses ou de outros. “Nós partimos do pressuposto que Portugal tem o direito a um desenvolvimento económico soberano. Sim ou não? Não tem, dizem. Os outros é que mandam, a União Europeia é que manda, mas manda porquê? Porque é que tem de mandar no nosso futuro coletivo? Mandar num país que mal ou bem construiu uma pátria há 900 anos? E agora vem a senhora Merkel e outros países mandar?”, disse o líder do PCP, referindo que um dos cenário do PS admite a possível saída do euro.

Costa respondeu que esse é o cenário que PS exlui e que o faseamento da reposição das prestações cobradas nos últimos anos assim como a diminuição das taxas moderadoras, acontece em anos diferentes para permitir que o país continue no euro. “Eu também gostaria de dizer que eliminava tudo de uma vez”, referiu o socialista.

O tema voltou ainda no final do debate quando Costa, falando de possíveis entendimentos, disse que era importante que o PCP fosse “mais claro”, nomeadamente no que diz respeito à destruição da União Económica e Monetária, que seria “uma dificuldade estrutural” entre os dois partidos.

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Quanto ao resto dos temas, Costa e Jerónimo concordaram na generalidade. António Costa chegou mesmo a acenar a cabeça e a completar as frases de Jerónimo de Sousa quando se falou em educação ou na subida do endividamento das famílias portuguesas. Para o comunista, a educação é um “setor estratégico”, dizendo que nos últimos quatro anos se tem lembrado da expressão anterior ao 25 de abril que dizia “filho de operário tem de ser operário e doutor tem de ser doutor”, devido às dificuldades que as famílias têm em enviar os filhos para a universidade.

Também António Costa diz querer apostar na educação que em Portugal tem funcionado como “o grande elevador social”, criticando o alargamento do financiamento aos colégios privados nos últimos quatro anos por parte do Governo da coligação, assim como a ideia que a escola se resume à avaliação, declarando que uma das propostas do PS é terminar com os exames da quarta classe – ideia que atribui ao ministro Nuno Crato e à sua concepção sobre o que é a educação em Portugal.

Quanto ao Novo Banco, tema que marcou esta terça-feira, António Costa foi mais longe do que tem vindo a fazer e pediu explicação ao governador do Banco de Portugal e ao Governo antes das eleições. “O que é gravíssimo é que o senhor governador tenha entendido que está no âmbito da ssuas funções fazer o favor político ao Governo de enganar os portugueses e dizer que esta solução não tem risco”, sublinhou António Costa, reforçando que o processo tem sido tratado com uma “enorme imprudência”.

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Durante a troca de argumento sobre a saída do euro, Jerónimo de Sousa disse que a análise do cenário macroeconómico do PS incluía a possível saída do euro, lendo até algumas linhas em que se fala da saída do euro por parte da Grécia e um possível desmembramento da zona euro. Costa disse em seguida que essa era o cenário rejeitado pelos socialistas e que o programa do partido foi redigido tendo em vista a manutenção de Portugal no euro e a continuação da união económica e monetária.

Analisando o relatório “Uma década para Portugal”, realizado por 12 economistas, tendo em vista a concretização de um plano sustentado dos socialistas para os próximos anos de governação, é fácil encontrar a citação lida por Jerónimo na SIC Notícias:

“Um cenário de crise europeia profunda e prolongada

O cenário de crise europeia profunda e prolongada corresponde a uma situação em que a atual situação de crise política aguda no contexto europeu se mantém. […] A materialização deste cenário criaria uma situação particularmente delicada tanto do ponto de vista político e económico como do ponto de vista social. Neste quadro, particularmente associado a uma eventual saída da Grécia da zona euro, com o peso da dívida pública a crescer de forma desmesurada poria inevitavelmente em questão a permanência de Portugal na zona euro e eventualmente poria em causa a própria existência do euro tal como o conhecemos hoje”

No entanto, logo a seguir, e tal como António costa mencionou, os socialistas rejeitam este caminho. “É precisamente este cenário dramático, que importa evitar a todo o custo, que justifica todo o exercício desenvolvido neste relatório de apresentar uma alternativa séria mas credível às políticas que têm vindo a ser implementadas”, pode ler-se em seguida. A alternativa a esse cenário, é um que prevê a “credibilidade reforçada do projeto europeu” e que “admite que a situação que
atualmente se vive no contexto europeu não é uma fatalidade”.