Tem sido uma constante dos últimos anos. Há sempre alguma atracção turística portuguesa entre os melhores do mundo. Mas não chega. Com mais turistas, há também novos negócios a emergir. Em Lisboa, por exemplo. Se os tuk-tuk ainda levantam polémica, a requalificação dos edifícios históricos tem lavado a face da cidade voltada para o Tejo.

Por outro lado, os números deste ano estão a quebrar recordes. No final de Setembro, o Banco de Portugal revelou que cada turista estrangeiro gastou, em média, 314 euros na sua passagem pelo país. Entre Janeiro e Julho de 2015, as receitas turísticas internacionais atingiram os seis mil milhões de euros, com um crescimento de 12,4% em relação a 2014. Este é um valor importante, quando a concorrência directa (Espanha) se ficou pelos 3%. Mas será este crescimento sustentável?

Em busca de respostas, o Observador organiza mais uma Conversa sobre um tema central da sociedade portuguesa. Dia 13 de Outubro, às 18h00, na Sala Luís Freitas de Branco do Centro Cultural de Belém (Lisboa), fala-se sobre turismo, turistas e os desafios de um sector em acelerada mutação. Para antecipar o debate, conversámos com dois dos participantes, conhecedores destas nova realidade: Catarina Portas, proprietária das lojas A Vida Portuguesa e dos Quiosques de Refresco, e Nuno Seabra Lopes, responsável de uma editora especializada em turismo, a Zest – Books For Life. O optimismo está presente, mas a necessidade de uma estratégia comum é uma exigência imediata.

Mostrar (e proteger) o melhor

“Oui, oui… Lisbonne c’est la nouvelle Barcelonne”. Uma jornalista francesa fez este prenúncio há vários anos, durante uma visita a uma loja recente na baixa lisboeta. Antes da crise e dos portugueses enfrentarem uma diminuição do poder de compra, a primeira loja de Catarina Portas, A Vida Portuguesa no Chiado, já recebia grupos de jornalistas estrangeiros interessados neste conceito de comércio vintage que a caracteriza. Catarina “sempre disse que a loja é o início de uma descoberta. Com produtos tradicionais que as pessoas gostam de conhecer e, muitas vezes no caso dos portugueses, redescobrem, sempre que [os] visitam”.

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Os últimos tempos vieram concretizar a profecia. Lisboa é uma referência turística global e as lojas de Catarina figuram em quase todos os guias internacionais da capital. “A crise e o crescimento do negócio foram coincidentes. Mesmo com os portugueses a comprarem menos, nunca deixámos de crescer. Adaptámos o negócio já a pensar no que poderia interessar aos estrangeiros, como termos as etiquetas em inglês e português, por exemplo”, diz Catarina.

Os Quiosques de Refresco foram mais uma variante a explorar. Com vários espaços por toda a cidade, o “impacto do turismo não é tão notório, pois há clientela diária que vai só beber o café. Mas no quiosque perto da Sé [de Lisboa], fala-se mais inglês que português.”

Para Catarina, o fenómeno turístico deve ser debatido com frequência e com vista a uma estratégia de equilíbrio. “O turismo é uma indústria massificada e transforma os sítios que cobiça. Lisboa, a cidade histórica, tem beneficiado de obras, mas o comércio tradicional está muito ameaçado”, diz Catarina, chamando a atenção para a necessidade de “encontrar um equilíbrio, uma forma de salvar as lojas antigas”. O programa “Lojas com História”, aprovado este ano pela Câmara Municipal de Lisboa, tenta fazer essa ponte e, enquanto membro do conselho consultivo do projecto, Catarina exemplifica: “Um turista estrangeiro vai à Luvaria Ulisses no Carmo e tira uma fotografia. Desce a rua e vai às compras a uma H&M ou outra loja desse género. Se a Luvaria Ulisses não existir, para que vai o turista àquela zona? As grandes cadeias internacionais têm de ser sensíveis a estas situações e perceber que o comércio mais antigo é imprescindível para os seus próprios negócios.”

Turismo: ler, pintar e melhorar

Ajudar os turistas a escolher os melhores locais para visitar foi a ideia de Nuno Seabra Lopes. Ele aproveitou os anos ligado ao mundo dos livros e resolveu aplicá-los na Zest – Books For Life, uma editora especializada em livros de turismo. “Eu acho que o turismo está cheio de áreas óbvias, estereotipadas, como a gastronomia, o património. Mas a nível editorial ainda há muito por desenvolver”, confessa. A editora nasceu dessa constatação.

Com estas obras, Nuno procura inovar nos formatos e nas abordagens. “É um cuidado que temos. Os turistas não podem ter livros pesados na bagagem, nem procuram algo que seja muito caro. Assim, tentamos que os livros sejam recordações da passagem por Portugal, que possam dizer aos amigos «eu vi», «eu estive», «eu quero voltar»”, explica.

O negócio também se estende no tempo, já que a novidade editorial não se esgota. Roteiros de enoturismo, street art ou comida portuguesa para fazer em casa perduram vários meses, sem alterações. Entre a oferta inovadora, a Zest vai lançar esta semana mais um guia diferente: um álbum de Lisboa pelos olhos de Urban Sketchers.

Para Nuno, “o turismo de cidades como Londres não se esgota. Mesmo passado o hype, há sempre algo que mantém o interesse, que faz com que os turistas voltem. Lisboa e outras cidades portuguesas têm essa capacidade, mas é preciso aproveitar a massa crítica. Temos de fazer bem, mas temos a responsabilidade de fazer melhor.