Vivemos obcecados com a ideia de eliminar tantos germes quanto possível, de matar todas as bactérias que povoam as superfícies nas nossas casas, de tomar antibióticos para qualquer tipo de doença (mesmo que não seja causada por bactérias), mas esquecemo-nos que 90% das células do organismo humano são, na verdade, microorganismos. E sabe que mais? Não poderia viver sem elas. A pergunta agora é se podemos adicionar algumas para nos sentirmos melhor. Foi apresentado um novo trabalho nesse sentido, mas servirá mais para lançar novamente o debate do que para tirar conclusões firmes.

Temos colónias de bactérias na boca, na pele ou nos intestinos, e as diversas estirpes controlam o crescimento das restantes. Por isso são tão importantes – as bactérias boas ajudam a controlar as bactérias más. Mas muito dos hábitos que temos diariamente acabam por destruir os nossos defensores, como usar sabonetes antibacterianos ou abusar dos antibióticos. Depois, quando queremos pôr os intestinos a funcionar comemos iogurtes – sim, os iogurtes têm bactérias.

Os cientistas têm tentado demonstrar que os probióticos (organismos vivos tidos como benéficos para quem os ingere) podem ajudar ratos de laboratório que nasceram sem bactérias a reverter o autismo, ou que podem resolver problemas de memória ou de ansiedade. Mas são precisos mais estudos sobre este tema, especialmente em humanos, porque os resultados em ratos não podem ser extrapolados. E de preferência que não sejam financiados por uma empresa que fabrique iogurtes.

Além disso, se uma equipa de investigação quer fazer valer as suas descobertas é melhor que as publique numa revista científica com revisão por pares em vez de se limitar a anunciá-las numa conferência, no site da instituição ou que a conte aos jornais. Daí que o trabalho de Ted Dinan, diretor de psiquiatria na University College Cork, citado pelo Guardian, mesmo apresentado na conferência da Sociedade de Neurociências, em Chicago, careça de confirmação.

Começamos logo pelo facto de o estudo ainda não estar publicado numa revista científica. Depois, a amostra é muito pequena – apenas 22 homens. Por fim, não parece estar claro, se os indivíduos se mostraram significativamente menos ansiosos quando tomavam os probióticos do que quando tomavam os comprimidos placebo (em tudo semelhantes, mas sem os organismos vivos). Menos ainda pode o investigador especular que as bactérias produzem substâncias que ativam o nervo vago antes de ter estudos conclusivos sobre o assunto.

A área de investigação parece, no entanto, promissora. Resta-nos esperar para ver se o futuro dos tratamentos para a depressão passa por comprimidos com milhões de bactérias.

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