Teresa Fernandes casou-se com João Marques em 1982 em regime da comunhão de adquiridos. Anos mais tarde compraram um imóvel  que foi pago na totalidade por Teresa, mas o seu nome não ficou  na escritura pública de compra e venda, nem foi feita qualquer menção quanto à proveniência do dinheiro. Na altura do divórcio, e de fazer o inventário dos bens, Teresa reclamou que o imóvel era um bem seu e não dos dois. Depois de diferentes decisões em tribunal, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) veio agora dar razão a Teresa Fernandes e fixou jurisprudência: podem ser bens próprios de um dos cônjuges as aquisições efetuadas em regime de comunhão de adquiridos, caso se prove que o dinheiro utilizado para pagar o bem pertencia a esse membro do casal.

“Estando em causa apenas os interesses dos cônjuges, que não os de terceiros, a omissão no título aquisitivo das menções constantes do art. 1723.º, c) do Código Civil, não impede que o cônjuge, dono exclusivo dos meios utilizados na aquisição de outros bens na constância do casamento no regime supletivo da comunhão de adquiridos, e ainda que não tenha intervindo no documento aquisitivo, prove por qualquer meio, que o bem adquirido o foi apenas com dinheiro ou seus bens próprios; feita essa prova, o bem adquirido é próprio, não integrando a comunhão conjugal”, lê-se no acórdão publicado em Diário da República no passado dia 13 de outubro.

O que diz a alínea c) do artigo 1723 do Código Civil é que conservam a qualidade de bens próprios “os bens adquiridos ou as benfeitorias feitas com dinheiro ou valores próprios de um dos cônjuges, desde que a proveniência do dinheiro ou valores seja devidamente mencionada no documento de aquisição, ou em documento equivalente, com intervenção de ambos os cônjuges“.

Agora, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça que “estando em causa apenas os interesses dos cônjuges, a falta daquela declaração pode ser substituída por qualquer meio de prova que demonstre que o pagamento foi feito apenas com dinheiro de um deles, ou com bens próprios de um deles”.

Neste caso em concreto citado no acórdão, Teresa tinha provas de venda de património e de amortização de um empréstimo contraído para pagar a parte do edifício.

Este acórdão do STJ faz uniformização de jurisprudência e deve ser seguida pelos tribunais de primeira e segunda instância.

Contactada pelo Observador, a advogada Madalena Zenha referiu que “a maior parte das pessoas não tem o cuidado de salvaguardar” este tipo de situação quando adquire um bem. Ou seja, é raro o cônjuge que deixa escrito no documento da escritura que entrou com um certo montante ou a totalidade do montante para a aquisição de um bem. O que acontece, por exemplo, com imóveis, em que os progenitores de um dos cônjuges entram com uma parte do montante para ajudar à compra da casa.

“Mais tarde, quando se divorciam há um problema. Ou os dois se dão muito bem ou na maior parte das vezes entram em conflito”, garante a advogada. E, por isso mesmo, Madalena Zenha afirma que este acórdão “salvaguarda imenso e dá mais força às pessoas para poderem fazer prova por outros meios”. Antes já era possível, sublinha, mas havia tribunais que não aceitavam outros meios de prova. Agora todos terão de aceitar. Mas, lembra a advogada, “é preciso que haja mesmo provas”.

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