Pó, máquinas, camiões e buracos de obras são os elementos dominantes dos oito quilómetros entre Lifau, onde há 500 anos chegaram os primeiros portugueses a Timor-Leste, e a nova central elétrica de Sakato, no enclave de Oecusse. Isolado durante os últimos cinco séculos e praticamente esquecido, quer durante a ocupação indonésia, quer durante o período da independência, Oecusse está hoje a viver um movimento sem precedentes.

Dezenas de empresas trabalham no terreno, inúmeros projetos estão a ser feitos ao mesmo tempo, o número de estrangeiros é o mais elevado em muitos anos – só portugueses são cerca de 50 – e uma fatia significativa do Orçamento do Estado está canalizado para a região.

Em 2015, foram mais de 90 milhões de dólares (82,6 milhões de euros), no próximo ano deverão ser cerca de 200 milhões de dólares (183,7 milhões de euros), a que se somam projetos de empresas privadas como a Interway, contratada para construir uma nova clínica e que foi a primeira empresa portuguesa registada em Oecusse.

Ainda faltam os grandes investimentos estrangeiros prometidos, mas as autoridades regionais e nacionais insistem que é impensável conseguir isso sem as infraestruturas básicas de uma região onde, durante décadas, praticamente não se investiu.

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Agora toda a zona é um gigantesco estaleiro, com novas estradas, pontes, uma central elétrica, um hotel, projetos de irrigação e novas estruturas administrativas, a níveis diferentes de conclusão. A central vai estar pronta nas próximas semanas, o novo monumento de Lifau deverá demorar alguns meses e o novo hotel – que começou há um ano – ainda praticamente não passou de pilares. Quilómetros de estradas estão a ser feitos ao mesmo tempo, com valas e passeios, há projetos na agricultura e novas infraestruturas de saúde, entre outras.

Tudo com modelos sem precedentes de gestão – só em janeiro é que o Governo timorense formalizou a “transferência de poderes e devolução de competências” do Governo central para a Autoridade da Região Administrativa Especial de Oe-Cusse Ambeno. E onde se criam precedentes na forma de gerir projetos: todas as grandes obras estão a ser fiscalizadas, a maioria por empresas portuguesas, o que implica critérios apertados como nunca na qualidade da execução e novos modelos a aplicar, possivelmente, às futuras grandes obras do país.

Lojas, casas, pequenos negócios que mostram uma comunidade de 70 mil habitantes (na capital são cerca de 10 mil) a despertar depois de uma letargia provocada pelo abandono e esquecimento.

As ligações regulares por mar (e desde esta semana por ar) evidenciam o crescente interesse do enclave, com cada vez mais passageiros e cada vez mais negócios, procurando responder a uma procura também sem precedentes. A procura é tanta que o pequeno mercado, que não estava minimamente preparado para este furacão de obras, muitas vezes sente carências, inclusive de produtos essenciais como cimento ou outro material de construção.

Transportar coisas de Díli é caríssimo – um contentor que custe 5.000 dólares para viajar da Europa até Díli pode custar 20 mil só para ir de Díli até Oecusse – pelo que o lado indonésio da ilha de Timor é o recurso mais usado. Apesar disso, Díli é o recurso para alimentar novos negócios – já abriram vários restaurantes, estão pensados outros serviços e até vai abrir uma ‘filial’ da única discoteca de Timor-Leste.

Apesar de tudo isto, e do pó que domina o ar, há no entanto algumas características que em Oecusse ainda não mudaram, como a importância do mar ou a burocracia em terra, com duas fronteiras timorenses e duas indonésias.

E finalmente o trato de quem é destas bandas, a recordar períodos antigos, onde os putos – e os menos putos – ainda acenam aos estrangeiros que passam, gritando-lhes “bo tardi”.