António Costa afirmou esta segunda-feira, em entrevista à RTP, estar à espera de indigitação por parte do Presidente da República (PR), sublinhando que “não há nenhuma razão para se criar crises políticas artificiais“. E garantiu que “há todas as condições” para PS, PCP, BE e Os Verdes aprovarem em conjunto o Orçamento para 2016.

“Aquilo que o PR explicitou durante vários meses era que era preciso condições de estabilidade e que era preciso encontrar um suporte maioritário na Assembleia da República e essas condições estão hoje reunidas”, afirmou Costa, considerando que há consenso na sociedade de que “o pior que podia acontecer era um Governo de gestão”.

Costa insistiu que Cavaco deve “dar sequência a este processo de formação de Governo indigitando o PS”. Um Governo de gestão dificultaria as reformas e a aprovação de um Orçamento de Estado para 2016, apontou. “Estaríamos a arrastar-nos para situação indefinida”.

Falando sobre os sinais que Portugal deve dar aos mercados, o socialista responsabilizou o Presidente pelo clima de incerteza. “Manter-se o clima de incerteza é que é preocupante. Seria um erro muito grande manter este clima de incerteza, um governo de gestão ou eleições de seis em seis meses. Seria penalizador para o investimento. O que é essencial é Portugal não desperdiçar o fator de estabilidade política. E não, em vez de se optar pelo certo, optar pela aventura do incerto criando aqui uma crise artificial sem razão de ser“, insistiu no dia em que o PR lembrou que já esteve cinco meses em gestão depois de o seu primeiro governo ter sido derrubado com uma moção de censura em 1987.

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Segundo o líder do PS, o Parlamento não vive “um impasse” e havendo “suporte maioritário não há dúvida” sobre o caminho que deve ser seguido.

Questionado sobre se daria mais garantias ao PR, Costa recusou entrar em diálogo com Cavaco com um jornalista por intermediário. Mas respondeu: “As negociações incidiram sobre matérias programáticas. O Governo é avaliado na sua coerência e consistência pelo programa que apresenta”.

“Não vejo como isso [exigência de novos compromissos e acordos] se possa colocar”, respondeu, dando a entender que o PS foi o mais longe que podia ir no diálogo com os partidos de esquerda e que, portanto, não há garantias adicionais que possa dar mais ao Presidente. 

Menos crescimento

Costa garantiu ainda que o Orçamento para 2016 está garantido. “É preciso ler os acordos naquilo que eles dizem efetivamente. Não estamos a disfarçar ou diluir as diferenças programáticas”, explicando que os partidos de esquerda conhecem a estratégia orçamental do PS e que o PS também conhece os limites desses partidos – não aumentar impostos, não tributar mais rendimentos do trabalho, não cortar pensões. “Vamos trabalhar com boa-fé”, garantiu.

Sobre o programa socialista, Costa admitiu desta vez que a nova versão do documento (pós-negociações com BE, PCP e Verdes) estima um crescimento económico “um pouco menor”, face ao desaparecimento da medida que, na versão do PS, mais estimulava o PIB: a redução substancial da TSU.

Confrontado com as críticas de Passos Coelho de que está a fazer um “golpe”, o líder do PS criticou a crispação que tais palavras encerram. “É negativo que, em vez de se conformar com vontade da AR, o PSD esteja a criar crispação artificial. Não é linguagem própria”.

“O dr. Passos Coelho só se pode queixar de si próprio. Não foi capaz de encontrar um apoio maioritário. Não houve golpe nenhum. Resultou da vontade dos deputados”, insistiu.

Costa quer prudência na venda do Novo Banco

Durante a entrevista, foram ainda abordados dois temas: a TAP e o Novo Banco. Sobre o processo de privatização da empresa pública, Costa respondeu que vai tentar negociar a manutenção de 51% do capital no Estado apesar de o contrato de venda de 66% já ter sido assinado. “Acho que é possível com serenidade, no quadro da lei e em diálogo com comprador, atingir o objetivo de o Estado manter 51% e acho que é possível e razoável fazer. É do interesse de todos”.

Já sobre o Novo Banco foi cauteloso, optando por criticar Carlos Costa. “Acho que foi de uma enorme imprudência a forma como se anunciou que esta solução não teria quaisquer riscos. Teve riscos”. Agora, o objetivo do líder do PS é jogar pelo seguro, para evitar uma venda que prejudique os outros bancos: “É preciso evitar alienações precipitadas com impacto negativo no setor financeiro”. E deixou mais dois pedidos: “Devemos tirar do campo político matérias do setor financeiro. Primeiro, cabe ao Governador do Banco de Portugal dar plena informação sobre o tema, coisa que até agora não aconteceu”.

Ataque ao ISIS? “Há outras formas…”

O último ponto da entrevista foi relativo aos ataques a Paris, desencadeados pelo Estado Islâmico na sexta-feira. António Costa foi questionado sobre se admitia uma intervenção militar contra a organização terrorista, com participação portuguesa, e recusou: “Há formas diversas que não implicam o envolvimento direto, há porventura formas mais adequadas” de “honrar os compromissos internacionais do país”, disse Costa. O ponto era sensível, visto que PCP e BE são abertamente contra qualquer intervenção militar.