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Estado Islâmico: os inimigos, a organização, os mortos e os alvos. Há quanto tempo há risco para o Ocidente?

Este artigo tem mais de 5 anos

Quem são os inimigos, quantos mortos já fizeram, que ligação têm com outros grupos terroristas e como se organiza no Ocidente o Estado Islâmico. Os dados de dois relatórios antiterrorismo.

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Getty Images

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Nos últimos doze anos, a Europa já assistiu a nove atentados terroristas que provocaram 577 mortos e 3105 feridos. Depois dos atentados de Paris, os ataques em Bruxelas vieram provar que as organizações terroristas têm mesmo capacidade para atacar a Europa. E isso colocou uma pergunta na mente dos habitantes do Velho Continente: está o terrorismo islâmico a largar o Médio Oriente para entrar nas nossas casas?

No dia seguinte aos atentados de Paris, o Wall Street Journal escrevia que os ataques na capital francesa sugeriam “uma mudança na estratégia do Estado Islâmico” – algo que o Observador noticiou aqui. No artigo do jornal norte-americano pode ler-se que o interesse do grupo terrorista não será apenas conquistar um califado no Iraque e Síria, mas também atacar os países ocidentais e seus aliados. Mas isto não era o que os especialistas da Terrorism Research Initiative (um grupo de 16 instituições de investigação e 120 especialistas dedicados ao estudo do terrorismo) defendiam até junho de 2015. E também não era a conclusão do relatório do Índice de Terrorismo Global de 2015 (referente a 2014), publicado pelo Instituto pela Paz e Economia.

Dois relatórios que revelam quem são os inimigos, quantos mortos já fizeram, que ligação têm com os grupos terroristas e como se organizam no Ocidente. Depois de Paris, devemos estar preocupados?

Até agora, a Terrorism Research Initiativ acreditava que apesar dos ataques terroristas ocorridos na Europa, América e Austrália, o Estado Islâmico continuava a estar mais concentrado em perpetrar ataques no Médio Oriente do que em direcionar-se para o Ocidente.

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Conforme a análise realizada pelos especialistas ao discurso contra o ocidente, este ter-se-á tornado mais acentuado desde há um ano para cá em consequência da intensificação da campanha militar internacional contra os acontecimentos na Síria e noutros países na mira dos terroristas. Quando essa campanha começou a ser mais vincada, “a estratégia [do Estado Islâmico] produziu um número substancial de células simpatizantes, ao ponto de esse número superar os combatentes estrangeiros”, escreveu essa organização num relatório publicado em 2015. Ou seja, haverá mais europeus residentes no Ocidente a colocar em prática as motivações dos terroristas do que atacantes do Médio Oriente a tentar chegar à Europa ou América para atacar estes territórios.

Os países que mais terroristas “exportam” são a Rússia, a França e a Alemanha. Juntos, estes três países já viram partir 3500 habitantes que se filiam no Estado Islâmico na Síria ou no Iraque. Apesar das operações policiais antiterrorismo (que este ano, e só até junho, já tinham aumentado 50% em relação ao ano passado inteiro), os dados colocaram o ocidente em alerta: até onde quer ir o Estado Islâmico? Os especialistas dizem que a prioridade da organização terrorista continua a ser local e que quase todo o financiamento que recebem é investido em estratégias locais e operações montadas na Síria e no Iraque.

A questão tem implicações para a estratégia militar ocidental contra o Estado Islâmico porque quanto maior a ameaça transnacional, maior o incentivo para desmantelar o grupo – em oposição a contê-lo.

Mas a mira no mundo ocidental já tinha sido apontada pelas organizações terroristas há algum tempo, insistem. A al-Qaeda será um dos exemplos mais concretos, com as constantes ameaças de Osama bin Laden, endereçadas essencialmente aos Estados Unidos, antes e depois do 11 de setembro de 2001 (todos compilados pela The Heritage Foundation).

Três anos antes deste ataque – que vitimou quase 3 mil pessoas -, o fundador da al-Qaeda dizia que “o trabalho de muitos dos nossos irmãos está a correr bem, oramos a Deus para que nos abra um modo de nos vingarmos dos judeus e dos americanos”. E apenas um mês depois do ataque ao World Trade Center, continuou a ameaçar o ocidente através dos Estados Unidos, quando disse: “Eu juro que nem a América nem ninguém que lá viva vão gozar de segurança”.

Thomas Hegghammer, doutorado em Ciência Política e especializado em assuntos relacionados com os grupos jihadistas na Arábia Saudita, afirma que o discurso do Estado Islâmico não se foca no Ocidente com a mesma insistência que a al-Qaeda no início da década.

Enquanto o Estado Islâmico vê o Ocidente como um inimigo eterno e aplaude os ataques em massa, não parece tão inclinado a perpetrar ataques com a mesma persistência que a al-Qaeda.

De acordo com Hegghammer, conselheiro habitual dos governos dos Reino Unido, Estados Unidos, Canadá e Dinamarca sobre matérias de terrorismo, esse distanciamento espelha-se nos discursos do Estado Islâmico: “O conteúdo, o tom e a quantidade de retórica anti-ocidente do Estado Islâmico sugerem que, até agora, há uma certa relutância da organização em se comprometer inteiramente com uma campanha terrorista no Ocidente”.

Para chegar a esta conclusão, Hegghammer juntou-se a Petter Nesser, analista do Estabelecimento de Investigação da Defesa Norueguesa, e ambos estudaram os planos jihadistas conhecidos entre 2011 e junho de 2015. Será dos soldados menos influentes do Estado Islâmico que chegam as ameaças mais explícitas ao ocidente. E vêm principalmente dos jihadistas com origem nos países ocidentais. São exemplo disso as imagens publicadas por um britânico filiado no grupo terrorista, residente na Síria, que prometeu atacar Reino Unido e Estados Unidos da América em 2014; e de outro, também ele inglês, que se filmou dizendo “a bandeira negra vai ondular por cima de Downing Street”.

Um dos jihadistas que mais terá falado numa luta contra o Ocidente foi Abu Muhammad al-Adnani, o porta-voz do Estado Islâmico. Em setembro de 2014 nomeou Estados Unidos, França, Austrália e Canadá, instigando os simpatizantes residentes no ocidente para avançaram com operações terroristas nesses países. Em março deste ano repetiu a ameaça: “Saibam que nós queremos Paris antes de Roma e de Espanha, depois de destruirmos a Casa Branca, o Big Ben e a Torre Eiffel”.

Estas duas últimas declarações representam as indicações mais fortes da possibilidade de um ataque direcionado Estado Islâmico no Ocidente.

No entanto, realçam os investigadores, apenas 1% dos vídeos dos radicais se dirige exclusivamente ao Ocidente: “A vasta maioria dos materiais é dedicada a questões locais”. Todas têm, ainda assim, algo em comum: serão feitos quando os ataques aéreos da coligação liderada pelos Estados Unidos ao Estado Islâmico aumentam de intensidade, informa Hegghammer.

Dos 69 planos jihadistas engendrados pelos terroristas entre 2011 e junho de 2015, 44% deles tinham relação com os discursos anti-ocidente analisados por Hegghammer enquanto membro do Terrorism Research Initiative (de notar que na Europa foram planeados 37 ataques, dos quais 12 chegaram a vias de facto). Mas não haverá uma ação direta do Estado Islâmico nesses eventos: acontece que a organização pode assumir o seu apoio aos grupos terroristas “independentes”, mas isso não significa que tenha estado envolvido no planeamento dos conflitos, alertam os especialistas. Mas deixam um aviso:

De qualquer modo, estes números sugerem que o Estado Islâmico superou a al-Qaeda enquanto principal criador de inspirações para planos terroristas no Ocidente.

No entanto, também insistem que são raros os casos de combatentes terroristas que regressam ao país de origem (depois de estarem na Síria) para perpetrar ataques: apenas 1 em cada 360 ocidentais que se juntaram a grupos terroristas estiveram envolvidos num dos 16 planos (entre os 69).

Quinze anos de terrorismo com influência da al-Qaeda na Europa ensinou-nos que os padrões de interação entre organizações terroristas no Este e os militantes e no Ocidente pode ser realmente muito complexo.

Uma coisa parece estar clara para os estudiosos do terrorismo: até agora, a al-Qaeda afrontou mais seriamente a segurança no ocidente (durante a primeira década deste milénio) do que o Estado Islâmico, que insiste em não concentrar a sua estratégia em operações longe do Médio Oriente: “Os líderes prometeram conquistar Roma e motivam os apoiantes para preparar ataques terroristas internacionais, mas não prometeram explicitamente devotarem-se a grandes operações”, pode ler-se no relatório “Assessing the Islamic State’s Commitment to Attacking the West”, publicado em junho de 2015.

Eis os tipos de simpatizantes, de acordo com a nomenclatura da Terrorism Research Initiative:

1 – Treino com diretivas das altas patentes. Os atacantes treinam nos campos dos territórios do Estado Islâmico com o objetivo de atacar o Ocidente. Todos os seus materiais (incluindo o armamento) estão à sua disposição. Exemplos: os envolvidos no 11 de setembro de 2001.

2 – Treino com diretivas das médias patentes. Os atacantes treinam nos campos dos territórios do Estado Islâmico e são instigados a perpetrar ataques ao Ocidente, mas sem contacto com os cargos mais altos da organização. Exemplo: os ataques de Mohammed Merah em 2012 em Toulouse e Montauban.

3 – Treino simples. Os atacantes estão nos campos dos territórios do Estado Islâmico, mas não têm instruções concretas para atacar o Ocidente. No entanto, são psicologicamente moldados para acreditar que os ataques à América, Europa ou Austrália estão de acordo com as prioridades da organização, acabando por cometer os crimes mesmo sem recorrer ao material do Estado Islâmico. Exemplo: a tentativa de assassinato do cartunista Kurt Westergaard na Dinamarca em 2010 por Mohammed Geele, que havia sido treinado na Somália.

4 – Contacto remoto com diretivas do EI. Os atacantes não estão em território controlado pelo Estado Islâmico, mas comunicam com ele através de telefone, e-mail ou redes sociais. Recebem instruções para atacar o Ocidente. Exemplo: Rajib Karim, que em 2010 recebeu um e-mail encriptados para atacar pontos determinados das linhas aéreas do Reino Unido.

5 – Contacto remoto sem diretivas do EI. Os atacantes não estão em território controlado pelo Estado Islâmico, mas comunicam com a organização. No entanto, não recebem ordens para planear ataques no Ocidentes. Exemplo: os contactos entre Nidal Malik Hassan e outros membros do Estado Islâmico. Hassan organizou um tiroteio em Fort Hood (uma base militar norte-americana), mas nunca recebeu ordens para tal.

6 – Simpatizantes sem contacto. Não há comunicação com o Estado Islâmico, mas expressam o seu apoio ao grupo através das redes sociais ou comportamentos marginais. É com base na sua própria ideologia que planeiam os ataques, motivados pelas declarações do Estado Islâmico, mas sem contacto direto com o grupo terrorista. Exemplo: Roshonara Choudhry esfaqueou um deputado britânico em 2010 depois de ler declarações de al-Awlaki (um alto-cargo da al-Qaeda até 2011) na Internet.

A penetração do Estado Islâmico no Ocidente passa essencialmente pela motivação de simpatizantes não filiados na América, Europa e Austrália e que são normalmente chamados de “jihad individual”. No total de planos executados e falhados reivindicados pelo Estado Islâmico entre 2011 e junho de 2015, 17 foram preparados por terroristas do tipo 6. Nenhum dos ataques foi preparado por terroristas do tipo 1. De acordo com Hegghammer, o Estado Islâmico conquistou dois simpatizantes (que nunca visitaram a sede do grupo terrorista) por mês desde que al-Adnani, o porta-voz, pediu o seu apoio em setembro de 2014.

As implicações para os profissionais do contraterrorismo são claras: preocupem-se não apenas com os combatentes estrangeiros, mas também com os simpatizantes do Estado Islâmico que nunca estiveram na Síria”, aconselha o especialista em terrorismo.

Já de acordo com o Índice de Terrorismo Global, cujo relatório de 2015 foi lançado pelo Instituto para a Economia e Paz, apenas 0,5% das mortes por terrorismo aconteceram no Ocidente desde 2000 (excluindo o 11 de setembro). No entanto, esta percentagem sobe para 2,6% se levarmos em conta o ataque terrorista aos Estados Unidos em 2001.

Este relatório vai ao encontro dos dados que os especialistas apresentaram antes dos últimos acontecimentos na Europa, até junho de 2015, quando afirmam que 70% de todas as mortes por terrorismo no Ocidente desde 2006 foram provocadas pelos simpatizantes não filiados a grupos terroristas.

Texto editado por Filomena Martins

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