O segredo de uma boa francesinha, é certo e sabido, está no molho. E é precisamente no molho que peca a grande a maioria das francesinhas que se servem em Lisboa. Ora é sensaborão, ora é atomatado. Ora não tem picante, ora só tem picante. Ora parece uma sopa de marisco, ora relembra um caldo Knorr. Encontrar uma boa francesinha em Lisboa, digna dos maiores clássicos tripeiros na matéria, como o Café Santiago ou o Bufete Fase, não é, por isso, tarefa fácil. Mas é possível.

Imperial de Ourique

Fixe o nome acima. Nesta casa simples e pequena, junto ao Hospital Militar, a francesinha faz-se há uns 20 anos, embora só se tenha “afinado a receita”, como diz dona Beatriz, a responsável pela cozinha, há cerca de metade disso. Começaram a fazê-las, conta o marido António, “porque havia um grupo de clientes que se juntava para ir ao Porto de propósito comer francesinhas.” Para perceber o fenómeno, os dois fizeram-se à estrada e foram ao Norte experimentar vários exemplares. Depois, falaram com um amigo que tinha um restaurante na região e que lhes ensinou a base da receita do molho. “Ao longo do tempo fui aperfeiçoando e acrescentei alguns ingredientes, como o pimento vermelho. E não gosto de usar carne de vaca no molho, só de de porco”, revela Beatriz.

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Beatriz na cozinha, durante a preparação da francesinha. (foto: © Tiago Pais / Observador)

Idealmente, o molho, que leva 2/3 horas a fazer, deve ter algum tempo para ficar a apurar — “quanto mais ferver melhor”, ensina Beatriz — daí ser aconselhável, ao jantar, que se telefone a reservar, não vão os clientes do almoço ter acabado com o dito. A tolerância ao picante, que costuma ser menor em Lisboa do que no Porto, também está contemplada. “Faço a base com menos picante e depois acrescento conforme os clientes queiram”, explica a cozinheira. O recheio é o clássico, inclui linguiça e salsicha fresca, mortadela — em vez de fiambre, uma opção que é comum também no Norte — e um bife de vaca que, segundo Beatriz, “é batido com alho como se fosse para um bitoque”. A versão ‘à casa’ tem presunto, “para ser um pouco diferente”, diz António, ou bacon, “que também vai muito bem”, garante a mulher. E também fazem francesinhas com hambúrguer, bifana ou peru, variações que são do agrado de alguns clientes, mas que interessam pouco a quem quer encontrar uma receita semelhante às das melhores casas do Porto.

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Et voilà, o resultado final. A fotografia, acredite, não faz jus ao sabor.
(foto: © Tiago Pais / Observador)

O resultado final é de aprovação fácil, até porque não falha nos pormenores que fazem a diferença, como o pão tostado na grelha antes da montagem (ajuda a que não ensope totalmente no molho), a ligeira abertura entre as fatias de queijo para a gema do ovo ficar à vista ou as batatas fritas caseiras irrepreensíveis. Os militares do Porto que são visita frequente da casa atestam-lhe a qualidade. E o Observador também.

Nota: Quem quiser acompanhar tudo isto com outra coisa que não seja cerveja — o que, para alguns, será uma heresia — pode (e deve) experimentar a sangria caseira feita por António. Para os amigos que não apreciam francesinha — outra potencial heresia — a casa também é especializada em alheiras transmontanas com variadíssimos recheios: vitela, peru, javali, porco bísaro, bacalhau ou, claro, a tradicional.

Nome: Imperial de Ourique
Morada: Rua de Santo António à Estrela, 106A, Lisboa
Telefone: 21 396 8361
Horário: De segunda a sexta, das 08h às 22h. Pode abrir para jantares ao sábado, para grupos a partir de 10 pessoas.
Preço Médio: 10€
Reserva: Aceita

Outras 6 opções pouco óbvias que vale a pena experimentar

Fulgor
O responsável veio do Dom Tacho, outra casa lisboeta conhecida pela especialidade, e criou aqui a marca “a melhor francesinha de Lisboa”. Falta, no entanto, algum apuro ao molho e rapidez na cozinha para se poder considerar candidata à distinção. Mas o recheio é competente e o espaço é agradável, principalmente no verão, graças à pequena esplanada. Atenção: só abre ao almoço e durante a semana.
Avenida Júlio Dantas, 2 (São Sebastião). 21 387 1294

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Francesinhas do Fulgor (foto: DR / Facebook)

Sabeapato
Foi impossível provar esta francesinha em tempo útil antes da publicação deste artigo mas fontes seguras gabam-lhe a genuinidade. Não será de estranhar esse elogio quando se percebe que nesta pequena cervejaria as especialidades são todas de origem nortenha, das bifanas finíssimas às papas de serrabulho, tão raras na capital.
Avenida Poeta Mistral, 17-B (Campo Pequeno). 21 796 0284

O Tachinho
Apesar do diminutivo no nome do restaurante, a respetiva francesinha atinge dimensões assinaláveis, não sendo aconselhável aos menos aptos de estômago. Mas, como em muita coisa na vida, o tamanho interessa pouco: a francesinha é bem razoável, ninguém o discute, mas falta-lhe maior consistência para poder aspirar a outros voos. E não é barata (12€, com ovo e batata).
Rua 4 de Infantaria, 6D/E (Campo de Ourique). 21 395 2015

Lucimar
Nesta casa tradicional de cozinha competente a francesinha tem fama e as constantes enchentes ao fim de semana muito se devem a isso. Mas podia ser melhor: o pão não é tostado, infelizmente, e o molho pede mais picante. É, ainda assim, um exemplar bem razoável e uma excelente opção para quem acha que é um prato demasiado pesado: fazem meia francesinha e ainda oferecem um moscatel no final para ajudar a digerir. Tem ainda a vantagem de servir até para lá da meia-noite.
Rua Francisco Tomás da Costa, 26-28 (Entrecampos). 21 797 4689

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A francesinha do Lucimar (foto: DR)

Velho Macedo
Podia ser uma francesinha icónica na cidade, porque é, de facto, um excelente exemplar, à altura daquele que abre este artigo. Mas o grande problema da francesinha do Velho Macedo é que só se faz por encomenda e nem sempre. Mais: há alguns anos que a casa se virou para o mercado turístico tendo aumentado — e muito — os preços daquilo que serve. A francesinha, infelizmente, seguiu o mesmo exemplo: custa 15€.
Rua da Madalena, 117 (Baixa). 21 887 3003

Casa do Futebol Clube do Porto – Dragões de Lisboa
É verdade: na delegação do Futebol Clube do Porto na capital, vulgo Dragões de Lisboa, as glórias do clube acompanham-se, não raras vezes, de francesinha na mesa. Não falta quem diga que é a melhor de Lisboa ou mesmo a única que interessa, mas isso serão afirmações toldadas pela emoção clubística. Não é a melhor, mas também não é a pior, longe disso. E uma coisa é certa, o seu coração só tem uma cor: azul e branco. Serve-se de terça a sexta ao jantar e aos fins de semana todo o dia.
Avenida da República, 48B, 2ºEsq. 21 796 7418