O tempo é passado, apesar de Marcelo Rebelo de Sousa ainda ter mais sete dias de campanha eleitoral. O tempo é futuro, apesar de Marcelo Rebelo de Sousa ainda não ser Presidente da República. O presente não existe para o candidato ou pelo menos quer que passe bem rápido. O tempo é passado, para descrever que no dia de ontem, sexta-feira, o candidato social-democrata já só mostra que quer que a campanha acabe depressa, tira os “ses” quando fala da possibilidade de ser eleito e substitui pelo “quando”. E “quando” for eleito, dizem as sondagens que à primeira volta, Marcelo, o candidato, promete que Marcelo, o Presidente, será o chefe de Estado da união, “moderado” e defensor da “governabilidade”.

“Marcelo é fixe!” é uma adaptação do slogan de Mário Soares. O candidato até sorri, mas o autocolante tem menos cola do que a que Marcelo usa para se aproximar do ex-Presidente da República. “Gosto [do slogan], porque é uma comparação com Mário Soares, mas não vou ser eu a pô-lo. Era preciso muita prosápia”. O autocolante ficou dois segundos no ombro do candidato, afinal, Marcelo até gosta da comparação, mas tem vergonha de ser ele a dizê-la. “Tá doido”, disse, quando o assessor lhe colou a marca no casaco. O social-democrata quer fazer uma campanha à Soares, com beijinhos e abraços e muito “afeto”, mas mais do que isso, quer que os socialistas olhem para ele como um aliado e não como um inimigo.

A avaliar pelas sondagens, a imagem tem passado. No discurso, passa quase sempre. Ou mesmo nas respostas aos jornalistas, quando confrontado com as questões do momento. António Costa ficou ontem com a certeza que, se Marcelo for eleito, terá o apoio do chefe de Estado no que toca aos assuntos da banca e mesmo à substituição do Governador do Banco de Portugal. Marcelo deu a garantia que “secundará” as decisões do Executivo. “Compete ao governo ir acompanhando muito de perto o que se passa no Banco de Portugal neste processo como noutros processos e aquilo que o governo entender que deve ser feito, nessas estabilidade do sistema financeiro, se for eleito, daqui a poucos dias, não deixarei de secundar aquilo que o Governo considerar fundamental fazer”, disse.

Marcelo, apoiado pelo PSD e pelo CDS, que vão aparecendo às pinguinhas na campanha, fala para o centro, mas sobretudo para o centro-esquerda, que apoia a continuidade do Governo de António Costa e que lhe garante que pode roubar votos aos candidatos da área socialista. Na verdade, mais não é do que jogo tático: se a abstenção subir no eleitorado de direita, Marcelo quer roubar quantos mais votos conseguir a Sampaio da Nóvoa e a Maria de Belém.

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E é por isso que nestes dias de campanha lhes retirou o discurso. Apropriou-se das garantias de estabilidade ao Executivo, que à partida poderiam fazer levantar o sobrolho ao eleitorado que estivesse no limbo. Esta sexta-feira à noite em Leiria mudou o vocabulário para dizer que fará tudo para que o Governo de Costa se mantenha:

“É preciso garantir que o país é governável. Lembramo-nos da experiência dos governos minoritários do início da democracia. Os portugueses não querem regressar a esse tempo”, disse.

E carregou nos adjetivos para dizer que será “moderado”, “imparcial” e que fará uma “magistratura da inclusão”. Tudo certezas de quem subiu ao palco ouvindo apenas os seus passos. Não, não havia música, nem palmas, mas sobretudo o que não havia era sombra dos adversários, uma vez que já levava no bolso os números das sondagens que lhe dão uma vitória por 54% na primeira volta: “Estou confiante não tanto por causa dos números, mas por aquilo que tenho sentido no convívio do dia-a-dia dos portugueses. As sondagens valem o que valem. Eu sinto que há uma progressiva, crescente e mais clara identificação de muitos portugueses e portuguesas com este desejo”, finalizou.