O caldo entornado sobre o ténis. Há meses que jogadores e adeptos estavam em pulgas, à espera do primeiro Grand Slam da temporada, mas horas antes do Open da Austrália arrancar, em Melbourne, ficaram a escaldar com uma notícia: nos últimos dez anos, pelo menos 16 tenistas do top-50 do ranking mundial foram considerados suspeitos de participarem em esquemas de combinação de resultados. Nenhum deles foi alvo de qualquer sanção e metade, aliás, começou esta segunda-feira a participar no torneio australiano. Mas a ATP (Association of Tennis Professionals) defende que nunca adormeceu sobre o assunto: “As autoridades do ténis rejeitam qualquer sugestão de que as provas de combinação de resultados terão sido, de alguma forma, suprimidas”.

A entidade que manda no ténis mundial disse-o através de um comunicado, emitido logo após a conferência de imprensa com que reagiu ao que à investigação conjunta do Buzzfeed e da BBC. No documento constam declarações de Chris Kermode, diretor executivo da ATP, seguidas de uma página que serve para resumir o historial da Tennis Integrity Unit (TIU) — órgão criado em 2008 para prevenir a corrupção na modalidade. “O ténis permanece completamente dedicado ao desafio que todos os desportos enfrentam contra as apostas. Temos procedimentos e sanções rigorosos para lidar com qualquer suspeita de corrupção e já mostrámos que agiremos de forma decisiva quando as regras de integridade forem quebradas”, disse o líder da ATP. Mas o problema não está na atitude, está na ação.

Porque a corrupção e a combinação de resultados precisam de provas para serem confirmadas e elas estão nos históricos de e-mail, registos telefónicos e contas bancárias. Tudo coisas às quais a TIU não tem poder legal para aceder, como escreveu a BBC. Muito menos para uma entidade que dispõe de apenas cinco funcionários e está presente em “apenas 20 ou 30 torneios” por ano. Chris Kernode, porém, sublinhou que “nenhum jogador ou oficial está imune de investigação, independentemente do seu estatuto ou posição no ténis. A investigação persegue o que as suspeitas indicarem”. O comunicado da ATP recorda que, nos últimos dois anos, a TIU abriu 18 casos disciplinares que baniram cinco tenistas e um dirigente da modalidade.

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Todos os jogadores, contudo, pertenciam ao top-200 do ranking. Ou seja, participavam em torneios das categorias inferiores do ATP — Futures, Challengers ou ATP 250 –, em que os prémios monetários, os patrocínios e a visibilidade são menores e onde o radar da TIU capta menos sinais suspeitos. Nenhum dos tenistas sancionados pertence ao grupo de 16 jogadores do top-50 que terão sido aliciados (provavelmente) em torneios do Grand Slam. Antes sequer de a TIU abrir uma investigação, as quatro entidades do ténis mundial (ATP, ITF, WTA e a associação dos Grand Slams) têm de concordar que há suspeitas e provas suficientes para instaurar um caso disciplinar.

MELBOURNE, AUSTRALIA - JANUARY 18: Novak Djokovic of Serbia serves in his first round match against Hyeon Chung of Korea during day one of the 2016 Australian Open at Melbourne Park on January 18, 2016 in Melbourne, Australia. (Photo by Cameron Spencer/Getty Images)

Foto: Cameron Spencer/Getty Images

Depois há os casos que nunca o chegam a ser. Como o de Novak Djokovic. O atual número um do ranking e que já vai em 181 semanas a liderá-lo admitiu que, em 2007, lhe foram oferecidos 200 mil dólares (cerca de 183 mil euros) para perder na primeira ronda do torneio de São Petersburgo, na Rússia. Tinha ele 20 anos. “Não me foram oferecidos diretamente. Fui abordado através de pessoas que trabalhavam comigo nessa altura. A pessoa que me queria contactar nem sequer chegou a mim. Claro que rejeitámos logo. Fez-me sentir terrível porque não quero, de maneira alguma, estar envolvido nisto. Nos últimos seis ou sete anos não soube de nada semelhante”, garantiu o sérvio, vencedor de 10 torneios do Grand Slam (três em 2015).

Djokovic, de 28 anos, desconfiou que a combinação de resultado exista em torneios do Grand Slam ou do Masters 1000, as mais altas categorias do ténis. Ao nível Challenger “talvez, ou talvez não”, disse, embora frisando que “há pessoas a tomarem conta disso diariamente”. Também Roger Federer, o suíço de 34 anos que mais Grand Slams conquistou (17) no ténis, também reagiu, enaltecendo apenas que agora “há mais pressão sobre estas pessoas por causa desta história, o que é uma coisa boa”.

Novak e Roger são hoje as principais caras do ténis e nem eles estão safos de serem investigados, avisou a ATP. “Nenhum jogador ou oficial está livre, aos olhos da TIU, de ser um potencial envolvido na corrupção. Pela sua natureza, a corrupção é muito difícil de prova. O processo pode ser longo e a TIU vai continuar a perseguir provas quando acreditar que é necessário”, resumiu a entidade, no comunicado.