Nas últimas semanas o Facebook apostou em grande no “desafio da maternidade”, que consiste em apelar às mulheres que partilhem fotografias de como é bom ser mãe. Entre muita prosa em tons cor-de-rosa, houve quem se insurgisse defendendo que as dúvidas e os medos de cuidar de alguém indefeso também mereciam destaque — as experiências menos positivas acabaram por ser partilhadas e serviram de lume para incendiar uma nova polémica.

Juliana Reis parece estar no centro de tudo. A brasileira de 25 anos não só se recusou a participar no desafio como optou por descrever a sua experiência dolorosa num post publicado na rede social de Mark Zuckerberg.

“Recuso-me a ser mais uma ferramenta para iludir outras mulheres de que a maternidade é um mar de rosas e que toda a mulher nasceu para desempenhar este papel”, lia-se na respetiva publicação que, segundo diversos meios brasileiros, rapidamente arrecadou muitos “gostos” e outros tantos comentários de ódio.

desafio maternidade

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A par do desabafo, Juliana Reis lançou ainda um segundo desafio, intitulado “desafio da maternidade real”, convidando mães a partilhar imagens de desconforto e medo para que “as mulheres saibam a realidade pela qual passamos”. E foi na sequência do repto que a brasileira afirmou ainda “eu amo o meu filho, mas estou a detestar ser mãe”. O comentário de Juliana valeu-lhe, no final, uma denúncia seguida de um bloqueio, pelo que a sua conta de perfil foi apagada.

No entanto, esta não foi a única voz a insurgir-se contra o desafio proposto pela rede social, tal como conta a edição brasileira da Marie Claire, que dá destaque a Natália Pinheiro. A mulher de 25 anos publicou um comentário onde se lia que, apesar de gostar do filho, a maternidade não lhe enche as medidas e não a deixa feliz.

“Eu não amo ser mãe. Pôr os meus planos em pausa, não dormir bem, ser cobrada e sentir-me sempre errada, morar sozinha com o meu bebé de 15 meses, estudar sem ter tempo para estudar, ser preterida em relações, ser abandonada por todas as minhas amigas e suportar o peso da nossa existência: nada disso me fez feliz.”

O tema está longe de se esgotar aqui. No início do mês o britânico The Guardian dedicava um artigo de opinião à iniciativa viral, questionando o seu propósito. “Não é claro se o desafio em questão serve para provar que se é uma grande mãe ou apenas desafiar as amigas a provar que também o são”, escreveu Flic Everett. O autor deixou a ressalva de que a ideia original do Facebook seria divertir os seus utilizadores, no entanto acentuou que tal “cria uma nova forma de medir as mulheres”.

Já em maio de 2015, o Observador escreveu um especial sobre o lado menos cor-de-rosa da maternidade, dando destaque a duas bloggers e a duas cronistas que optaram por falar sobre o papel de mãe sem tabus e com uma boa dose de ironia. Ana Garcia Martins, também conhecida pelo blogue A Pipoca Mais Doce, argumentou à data:

“Tenho em mim todas as condições para ser o diabo das mães fundamentalistas. Sou constantemente palco de pancada para essas mães, mas também acho graça. Em todos os fundamentalismos consigo ver um potencial de humor bastante forte.”

Já Sónia Morais Santos, do blogue Cocó na Fralda, dizia: “Acho que cada vez mais se fala sobre a maternidade, isto é, sobre o lado menos maravilhoso e rosinha. Deixou de ser um tabu. Só era permitido às mães escorrer baba sobre os filhos.”