Viveu 43 anos isolado, sem qualquer tipo de contacto humano, numa cela com cinco metros quadrados, mas voltou para casa na sexta-feira. Entrou no estabelecimento prisional do Louisiana por uma condenação de cinco anos – por causa de um assalto à mão armada – mas a morte de um guarda prisional, em 1972, estendeu a pena por mais 38. Saiu no dia em que fez 69 anos, a 19 de fevereiro de 2016.

Albert Woodfox é o preso norte-americano que mais tempo viveu em regime de isolamento. Foi acusado de ter assassinado Brent Miller, um guarda prisional de 23 anos, com mais dois prisioneiros afro-americanos (eram conhecidos como “Os três de Angola”). Mas Woodfox tem afirmado, ao longo das últimas quatro décadas que é inocente. Ainda está aguardar o terceiro julgamento referente à morte de Brent.

A história é contada no jornal espanhol ABC. Em 43 anos, Albert Woodfox passou 23 horas por dia sozinho, incluindo durante as refeições, com visitas limitadas e sem poder participar nas atividades educativas e religiosas do estabelecimento prisional. Em junho de 2015, revelou a uma socióloga e blogger que tinha “medo de começar a gritar e não ser capaz de parar. Tenho medo de me transformar num bebé, enrolar-me na posição fetal e ficar assim para o resto da vida”.

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Apesar de estar a aguardar julgamento, o tribunal decidiu que poderia fazê-lo em liberdade, tendo em conta a sua idade (69 anos), o seu estado de saúde e a falta de garantias de um “julgamento justo”. Woodfox tem vindo a afirmar que está inocente.

“Apesar de ter vontade de provar a minha inocência neste novo julgamento, a preocupação com a minha saúde e com a minha idade resolveram isto (…) Espero que os acontecimentos de hoje ajudem a salvar muitos”, disse Woodfox, num comunicado enviado pela sua equipa de advogados.

A história de Albert Woodfox tem gerado muita controvérsia, com alguns juízes a afirmar que o afro-americano pode ter sido alvo de preconceitos raciais durante o processo. O estabelecimento prisional é conhecido por “Angola” – por ser esse o país africano de onde provinham a maioria dos escravos que trabalhavam nas plantações de algodão do Louisiana, no sítio onde agora está o estabelecimento prisional.

“Os três de Angola” são conhecidos por terem feito, na década de 1970, uma campanha contra a segregação dentro da prisão. Em 1972, foram acusados do assassinato do guarda, como forma de vingança pela sua ideologia política. Os outros dois – Robert King e Herman Wallace – foram libertados em 2001 e 2013, respetivamente.

Apesar de Woodfox ter tentado a mesma sorte dos outros dois elementos do trio, não conseguiu o mesmo resultado – o diretor do estabelecimento prisional argumentava que era demasiado perigoso e que, por isso, devia permanecer isolado numa cela sem janelas, mais pequena do que a maioria das casas de banho.

Tenho medo de me magoar a mim próprio, de começar a cortar os testículos e a lançá-los através das barras. Já vi outros a fazerem isto, quando não aguentavam mais”, disse na mesma entrevista à socióloga.

Em 2006, a juíza Docia Dalby considerou que os 43 anos que Woodfox passou em regime de isolamento corresponderam a uma “duração além dos limites” da jurisprudência norte-americana. O responsável das Nações Unidas pelos atos de tortura – termo utilizado por organizações como a Woodfox – tinha já pedido que fosse proibido isolar pessoas por um período superior a 15 dias, devido aos danos psicológicos que a ausência de contacto social pode provocar.