Quando falamos de jogos de tabuleiro é natural que o Xadrez, o Monopólio, o Risco, o velhinho Jogo da Glória ou qualquer um dos clássicos da editora portuguesa Majora sejam os primeiros exemplos que nos vêm à mente. Mas o mundo dos jogos de tabuleiro é vasto e vai além destes exemplos tão conhecidos. E uma grande parte desses jogos estará disponível na 7ª edição da LisboaCon, que decorre já este fim de semana, 12 e 13 de março, na AERLIS em Oeiras. As entradas são gratuitas.

A resistência dos jogos tabuleiros

Numa altura em que a tecnologia e o divertimento passam muito pelo digital, alguns podem estranhar que o mercado dos jogos de tabuleiro subsista perante as alterações do estilo de vida ocidental. Parece existir um contrassenso, pois nós, Rubber Chicken, passamos a semana a falar sobre videojogos. Contudo, nem por isso abandonámos, como muitas outras pessoas, o quase ritual de juntar os amigos ou a família em torno dos jogos de tabuleiro.

Quando começamos a desbravar este mundo, percebemos que não só está vivo como se recomenda — e vai muito além dos jogos que encontramos facilmente nos hipermercados, que são apenas a ínfima ponta do icebergue. Percebemos também que existem jogos para todos os gostos, que vão da casualidade dos jogos rápidos de diversão aos jogos cujas partidas se disputam ao longo de várias horas.

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Com esta tónica de porta de entrada e partilha dos jogos de tabuleiro, existem vários encontros regulares, localizados especialmente (mas não exclusivamente) na zona de Lisboa e que culminam na grande convenção anual que vai agora para a sua sétima edição. A LisboaCon é, por isso, um evento familiar que integra, ao longo de dois dias, uma ludoteca com dezenas de títulos diferentes, disponíveis para serem testados por todos os visitantes.

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Não só de jogos de tabuleiro se faz uma convenção

Os videojogos e os jogos de tabuleiro dispensam apresentações — mesmo quem nunca lidou com eles sabe o que são. Mas há um outro tipo de jogos nesta LisboaCon que o público pode não conhecer: falamos dos Role-Playing Games de tabuleiro, ou RPGs.

A sigla não é estranha. É frequente que a resposta à pergunta “jogas RPGs?” seja “sim, jogo Witcher“, ou qualquer outro videojogo do género. E é verdade que os videojogos em que temos uma personagem que se desenvolve e uma história na qual podemos escolher os caminhos a seguir são, em termos gerais, RPGs.

Mas ao contrário do que acontece nos videojogos, os RPGs de tabuleiro — ou pen and paper RPGs — pouco necessitam para serem jogados além de dados e da imaginação dos jogadores. Este é um tipo de jogo nascido na década de 1970 e que, até hoje, mantém fiéis seguidores.

Simplesmente, consistem em reunir uma série de pessoas em torno de uma mesa, em que cada uma desempenha o papel de uma personagem. Para “gerir” o jogo temos um Mestre de Jogo, que é simultaneamente o narrador e o árbitro das regras — e que coloca os restantes jogadores numa série de situações sob as quais têm de agir. É ele quem concebe a história e o mundo que os jogadores estão a “viver” através do jogo. E é ele quem interpreta todas as restantes personagens. O sucesso e o insucesso das ações dos jogadores são estabelecidos nos manuais de regras e no lançamento de dados.

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As redes sociais enquanto impulsionadoras

É também curioso que as redes sociais tenham permitido um maior estabelecimento e coesão dos grupos portugueses de jogos de tabuleiro e de RPGs. Começando por facilitar o agendamento do número crescente de encontros em locais públicos, para que seja de fácil acesso a todos, estes grupos têm um papel importante em manter vivas estas formas de entretenimento — num momento em que a tecnologia cria formas estáveis de diversão e convívio, embora não presenciais.

O Facebook tem servido para encontrar grupos para campanhas de RPGs, para troca, empréstimo ou compra de jogos e para permitir, à semelhança do que acontece em muitas cidades europeias, que a comunidade dos jogos de tabuleiro se expanda progressivamente e que viva para além dos fóruns e grupos espalhados pela internet.

Além disso, algumas empresas portuguesas ainda fazem jogos de tabuleiro. E existem diferenças significativas entre os jogos feitos na Europa e nos EUA. Há RPGs com ambiente de fantasia medieval, como o pai do género Dungeons & Dragons, e há RPGs com ambientes futuristas cyberpunk, como Shadowrun. Há discussões sobre quais os candidatos a Jogo do Ano e sessões de teste de protótipos de jogos que estão a ser criados no nosso país. Existem também sorteios e trocas ou vendas de jogos de tabuleiro.

Mas, acima de tudo, há muita diversão e gente disposta a ensinar as regras deste ou daquele jogo, algo que nos pareceu divertido e que vai das viagens de comboio à gestão agrícola. Há workshops, palestras e sessões de RPGs — que podem ajudar a explicar, na prática, um jogo que parece tão complicado, mas que requer apenas muita imaginação para ser jogado.

E por dois dias do ano celebram-se os jogos de tabuleiro, que se para muitos ficaram esquecidos e guardados na memória de infância, para outros continuam a ser uma excelente forma de convívio. Longe dos ecrãs e dos smartphones.

Ricardo Correia, Rubber Chicken