Transmissão de pensamentos entre pessoas que estão distantes. Irreal? Não, tecnológico. Em 2014, há um dia em que a mulher de Diogo Melo lhe pergunta: “por que é que já não me mandas mensagens?”. Eram 11 horas da noite. Ele fingiu que estava a dormir. Ela continuou: “Quando namorávamos, mandavas-me sempre mensagens. Agora, não. Nunca mandas nada”. Diogo já não pode fugir e Catarina tinha razão: ele tinha deixado de lhe enviar mensagens. E a história da Thoughts – que é não é de amor, mas é de paixão – começa aqui.

“Fiquei a pensar naquilo. Acho que isto é muito comum nos homens: não haver este cuidado de dizer à pessoa que estamos a pensar nelas. Naquela altura, estava muito mais tempo com as pessoas do meu trabalho do que com a minha família. E eu lembrava-me da minha mulher várias vezes ao longo do dia. Porque é que não agarrava no telemóvel e lhe escrevia uma mensagem?”, lembra Diogo Melo.

Designer de formação, desde 2009 que trabalhava na empresa que ele próprio lançou, a Azulcorp, de consultoria. Até que há uma noite, em agosto de 2014, em que acorda em epifania. Levantou-se a correr para encontrar um bloco de notas e uma caneta. “Parecia que tinha feito um download da informação.” Acordou a mulher, Catarina. “Costumam dizer que se acorda com uma ideia. No meu caso, foi ao contrário. A ideia acordou-me, literalmente, a mim”, conta.

Na base da epifania matinal, estiveram três experiências que o marcaram nesse ano. A pergunta da mulher foi a primeira. A segunda foi um problema familiar pelo qual um amigo estava a passar. A terceira foi a morte de um tio. A preocupação (ou a angústia) foi sempre a mesma: o que é que lhes dizia? Queria dizer alguma coisa à tia e aos primos, porque queria que soubessem que estava a pensar neles. Mas o quê? Numa situação “pesada” como era aquela, não havia nada para dizer. Queria apenas que soubessem que Diogo estava ali.

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E foi assim que nasceu a Thoughts feels good, uma aplicação móvel gratuita para sistema operativo iOS e Android, que tem como missão partilhar pensamentos e emoções. Basta clicar na imagem de uma pessoa, durante um segundo, para que ela fique a saber, nesse exato segundo, que está a pensar nela. Independentemente do país e do fuso horário em que está. E se quiser adicionar um emoji que identifique uma emoção, também pode fazê-lo.

“Foi um dos dias mais felizes da minha vida. Sou muito poeta, muito criativo e fiquei num estado de excitação tal que parecia que tinha descoberto a pólvora. Porque era uma realização pessoal. Era a primeira vez na vida em que estava a fazer uma coisa que era tudo aquilo que sabia fazer profissionalmente, mas também era aquilo que me definia. Estava a fazer uma coisa que era parte de mim. Uma paixão, que era uma solução para melhorar a vida das pessoas”, explica Diogo.

Com a ideia arrumada, começaram os contactos com especialistas na área do mobile e as idas aos eventos de empreendedorismo. Foi num deles que ouviu o nome de Gonçalo Henriques, 33 anos, várias vezes. Procurou-o no Linkedin, contactou-o. No dia seguinte encontraram-se. E um dia depois, eram sócios. Formado em Engenharia de Computadores, foi Gonçalo quem ficou responsável pelo supervisão do desenvolvimento técnico da aplicação.

Em janeiro de 2016, Gonçalo e Diogo lançaram uma versão para testes da Thoughts no mercado. Em pouco mais de 24 horas, a aplicação entrou para o top 10 da App Store de redes sociais gratuitas e para o top 100 das aplicações gerais gratuitas. De 21 de janeiro a 10 de março, a aplicação contava com dois mil utilizadores únicos, cerca de 12 mil thoughts enviados, cerca de 110 utilizadores diários ativos, 372 semanais e 1.134 mensais. A empresa de design de Diogo ficou, entretanto, em standby.

Para arrancar com o projeto e torná-lo viável, os empreendedores precisaram de 34 mil euros. Financiaram-no com capitais próprios e com a ajuda de familiares e amigos. Agora, andam à procura de investidores para uma nova ronda. Objetivo: otimizar a aplicação de forma a aumentar a aquisição e retenção de utilizadores e a desenvolver o jogo que está associado à aquisição (dentro da app) de novos emojis. O modelo de negócio passa por compras dentro da aplicação e por contratos de publicidade.

Com o novo investimento, Diogo Melo quer desenvolver a aplicação para poder chegar a novos mercados, sobretudo ao Brasil. “Na Thoughts, não há língua, mas a nossa base de utilizadores é portuguesa e queremos tirar partido das afinidades que podem existir aqui, fazer a ponte entre comunidades”, referiu o empresário. E, no final do ano, onde quer estar? Na Web Summit – maior conferência de empreendedorismo e tecnologia da Europa que se realiza em Lisboa entre 8 e 10 de novembro -, responde.

*Tive uma ideia! é uma rubrica do Observador destinada a novos negócios com ADN português.