Segundo dados do Observatório Nacional da Diabetes (OND), mais de um milhão de portugueses, entre os 20 e os 79 anos de idade, têm diabetes. Se a este número somarmos os mais de dois milhões que têm já pré-diabetes, percebemos a real dimensão do problema. Em 2014, no nosso país foram detetados cerca de 150 novos casos por dia e tudo indica que a tendência é crescente. O pior é que quase metade dos doentes com diabetes, cerca de 40%, não sabe que tem a doença, pelo que continua sem nada fazer para impedir a sua progressão e consequências.

A situação em Portugal é apenas um reflexo do que se verifica atualmente por todo o mundo. A Federação Internacional da Diabetes estima que a doença afete cerca de 387 milhões de pessoas, o que é motivo mais do que suficiente para ser designada como a pandemia do século XXI.

O mesmo organismo acredita que, em 2035, aquele valor subirá para 592 milhões, levando a Organização Mundial de Saúde a prever que a diabetes será, por essa altura, a sétima causa de morte no mundo.

Mas, afinal, que doença é esta que a qualquer momento nos pode bater à porta? A diabetes é uma doença metabólica crónica, que pode ter várias causas e que se caracteriza pelo aumento dos níveis de açúcar no sangue (glicemia). Esta alteração é acompanhada por outras modificações do metabolismo.

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Segundo Maria do Carmo Cruz, endocrinologista no Instituto CUF Porto, o aumento glicémico “é resultante de defeitos na secreção e/ou ação de insulina pelas células B pancreáticas, podendo também dever-se a uma resistência à insulina, que origina alterações no metabolismo dos hidratos de carbono, lípidos e proteínas, sendo mais evidente a hiperglicemia”.

Existem vários tipos de diabetes, nomeadamente a de tipo 1, que aparece na infância e adolescência (embora também possa ser diagnosticada em adultos) e que se caracteriza pela incapacidade de o pâncreas produzir a insulina necessária (a hormona que processa os açucares), em consequência de uma alteração do sistema imunológico (doença autoimune). Mas o tipo de diabetes mais comum, aquele que afeta cerca de 90% das pessoas com a doença, é a de tipo 2. É a esta que devemos estar mais atentos, de maneira a adotar medidas para evitá-la.

Fatores de risco

Embora toda a gente possa desenvolver diabetes, fruto de má alimentação e sedentarismo exagerado, algumas pessoas estão mais predispostas do que outras. Nas palavras de Maria do Carmo Cruz, a obesidade é um dos principais fatores de risco: “A maioria da população diabética é obesa, com aumento de gordura intra-abdominal ou visceral, sendo esta responsável pela resistência à ação da insulina e inflamação vascular e por outros distúrbios do metabolismo, como sejam a hipertensão e a dislipidemia.”

Ainda assim, “nem todas as pessoas com obesidade se tornam diabéticas”, explica a médica, salientando que “é necessário ter alguma predisposição genética para a doença”. O peso da hereditariedade varia entre 30 a 70%, porém, sabe-se que mesmo estes indivíduos podem prevenir a doença se evitarem a obesidade. “Por isso, o sedentarismo e a alimentação têm um papel primordial no desenvolvimento da doença”, salienta a responsável, que chama também a atenção para o álcool e o tabaco. O primeiro porque está ligado à obesidade e doença hepática e o segundo porque contribui para o aumento de risco de diabetes e outras complicações conhecidas. A vigilância médica é recomendada no caso de existirem vários fatores de risco (veja no final deste artigo quais são os fatores de risco considerados para o rastreio).

Consequências da diabetes

De acordo com Maria do Carmo Cruz, as consequências da diabetes podem ser várias e de gravidade extrema. “A grande maioria dos diabéticos morre de doença cardiovascular”, esclarece, lembrando que nesta patologia “o risco de mortalidade está aumentado cerca de duas a quatro vezes, pois as perturbações da glicose assintomáticas aumentam o risco de enfarte do miocárdio e de acidente vascular cerebral”. Por outro lado, a diabetes “é a causa principal de novos casos de cegueira no adulto, de novos casos de insuficiência renal terminal e de amputações não traumáticas dos membros inferiores”, refere a endocrinologista, acrescentando ainda que esta doença “está associada a um maior número de cancros”.

Prevenção é o melhor remédio

A adoção de estilos de vida saudáveis por parte da população constitui uma forma de prevenção da doença. De acordo com a especialista, “estudos clínicos demonstraram a eficácia dos programas de intervenção sobre o estilo de vida”. Neste sentido sabe-se, por exemplo, que “a introdução de alterações comportamentais ao nível da alimentação e da atividade física pode evitar até 60% da incidência da doença”.

Mesmo assim, pode haver necessidade de recorrer a medicamentos, tanto para prevenir o aparecimento da patologia como para evitar a sua progressão nos casos diagnosticados de pré-diabetes. “A vigilância deverá incidir também sobre aqueles com maior risco de desenvolvimento de diabetes, como sejam os filhos de pais com a doença”, alerta Maria do Carmo Cruz.

Como se trata a diabetes

O tratamento da diabetes não é único para todos os doentes, dependendo das causas e características de cada caso. Felizmente, a terapêutica disponível “tem evoluído de forma notável nos últimos anos, com o aparecimento de novos fármacos”, avança a médica, justificando que estes medicamentos “atuam em diferentes vias terapêuticas, as quais demonstraram um controlo mais eficaz da doença e um melhor perfil de segurança, com menos efeitos secundários, promovendo a melhoria do controlo glicémico e reduzindo o risco de morbilidade e de mortalidade associado”.

Uma vez que as diferentes causas da doença podem implicar respostas terapêuticas distintas, a endocrinologista considera que “é crucial um diagnóstico genético para um tratamento mais eficaz, assim como para a previsão de risco em doentes sem sintomas”. Todavia, tanto esta como outras técnicas inovadoras na área da diabetes são, de momento, “muito caras”.

É o caso da técnica metabolómica, que permite determinar a composição dos metabolitos produzidos pelas células do organismo e assim interpretar as perturbações do metabolismo. Mas apesar dos avanços científicos, a força de vontade das pessoas é determinante: “Se os doentes não se empenharem na adoção de estilos de vida mais saudáveis e no autocontrolo da doença, seguramente que os resultados terapêuticos continuarão a ser insuficientes.”

Intervenção especializada

As mudanças de estilo de vida são das mais difíceis de conseguir, porque mexem com padrões de comportamento enraizados ao longo de anos. Nesse sentido, e porque “a diabetes é uma doença crónica, complexa, multifatorial e associada a várias comorbilidades”, torna-se importante um acompanhamento especializado. Nesse sentido, começam a existir unidades de saúde com equipas organizadas e orientadas para o tratamento da diabetes em todas as suas dimensões, como acontece no Instituto CUF Porto.

Segundo Maria do Carmo Cruz, a equipa do Instituto beneficia da sua estrutura e do seu cariz multidisciplinar para ser “capaz de responder às ameaças que pairam sobre a população diabética”. “Promover uma melhoria dos cuidados médicos globais e integrados” é um dos objetivos, sem esquecer a componente emocional do doente, com vista a “minorar o sofrimento psicológico que tantas vezes o acompanha”. Por outro lado, ali são também “treinadas competências individuais capazes de favorecer a motivação e a aquisição de um autodomínio necessário ao controlo prático da doença”.

No Instituto CUF Porto, a Consulta de Diabetes é sempre realizada por um endocrinologista e por um elemento da equipa de enfermagem com formação na área, sendo da sua responsabilidade o ensino prático das técnicas de administração de insulina, autocontrolo glicémico e esclarecimento sobre regras de higiene relevantes para esta patologia, nomeadamente ao nível do cuidado com os pés. Aqui está também disponível a avaliação e o acompanhamento nutricional, sendo que o rastreio das eventuais complicações, próprias desta doença, é realizado pelas equipas clínicas respetivas de Cardiologia, Oftalmologia Cirurgia Vascular e Nefrologia, entre outras.

FATORES DE RISCO

– Idade superior a 45 anos

– História familiar de diabetes

– Sedentarismo

– Doença cardiovascular

– Excesso de peso ou obesidade

– História prévia de síndrome metabólica

– Aumento dos níveis de triglicerídeos e/ou baixo nível das HDL (lipoproteínas de baixa densidade, também designadas como “bom colesterol”)

– Ter dado à luz filhos com elevado peso (mais de 4 kg)

– Síndrome do ovário poliquístico