De quando em quando, aparece um filme de terror que redime o género de todo o lixo com que maus realizadores e maus argumentistas o entopem. Esse filme é “The Witch”, com que Robert Eggers se estreou a realizar, foi premiado em Sundance 2015 e passa hoje no IndieLisboa (Secção Boca do Inferno, Cinema São Jorge-Sala Manoel de Oliveira, 19.00). Eggers pesquisou uma série de contos fantásticos populares e lendas dos primórdios dos EUA sobre bruxas e bruxaria, para escrever e assinar esta fita passada na Nova Inglaterra (de onde aliás é natural) do século XVII, poucos anos depois do desembarque nas costas americanas dos primeiros colonizadores vindos de Inglaterra.

Um homem e a sua família são banidos da comunidade puritana onde vivem, e instalam-se numa cabana construída à beira de uma densa floresta, tentando subsistir à base do produto das colheitas e dos poucos animais que criam. Mas parece haver forças maléficas, nomeadamente uma bruxa, não só a trabalhar em redor deles, como também manifestando-se de forma sinistra nalguns dos animais selvagens e domésticos. As crianças da família são as primeiras vítimas, instalando a desconfiança, o desespero e o medo nos sobreviventes.

Filmado por Eggers com um rigoroso sentido da época, quer a nível da recriação material e de ambientes propriamente dita, quer das mentalidades profundamente religiosas e supersticiosas, “The Witch” está inteligente e poderosamente construído à base de sinais, sugestões e manifestações maléficas e diabólicas, que se vão acumulando e adensando o clima de “suspense”, de mal-estar psicológico e de crispação de terror, para o que muito contribuem uma banda sonora arrepiante, a filmagem com luz natural e um conjunto de atores desconhecidos, entre adultos e crianças, de onde sobressai a diáfana Anja Taylor-Joy no papel de Thomasin, a filha mais velha. A ambivalência que o realizador cultiva ao longo do filme, e que poderá levar alguns a pensar que tudo o que acontece é imaginado ou auto-induzido pelas personagens, fragilizadas pela sua situação e obcecadas com o pecado e com o mal, desfaz-se na sequência final, que um crítico inglês descreveu certeiramente como digna de Goya. Acrescente-se que Stephen King é um dos grandes entusiastas de “The Witch”, e aqui junto a minha à sua voz.

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