Todas diferentes, todas mulheres e todas com um percurso que lhes deu um lugar na Assertive Women Entrepreneurs Summit. O evento acontece este sábado e domingo, no Porto, e será feito de conferências e workshops. São 13 oradoras nacionais e internacionais e vão sentar-se à mesa na Porto Business School. O objetivo é atrair motivação e inspiração, discutir estratégias de empreendedorismo e liderança no feminino e partilhar experiências.

Diz a página de apresentação que a missão da AWE Summit é “levar as mulheres dos bastidores para primeiro plano”. O Observador escolheu três delas para falar sobre cinco temas. Stacey Wallaberger trabalhou no mercado de luxo durante vários anos e decidiu abrir a sua própria empresa: a Metis Consulting. Cristiani Oliveira é diretora da Intercampus, tem experiência nas áreas de marketing e gestão e representa a empresa na associação internacional MSPA. Marta Cunha está na Sonae desde 2000. Já foi gestora de inovação e agora é diretora do departamento de Cliente. Foi eleita a melhor aluna de MBA do mundo, em 2014, pela Associação de MBAs e é formadora na Porto Business School.

O sucesso e a liderança são feitos de quê?

Tema inesgotável de livros, conferências, workshops e artigos de jornal. O sucesso e a liderança não têm uma fórmula infalível, mas há caminhos que podem levar ao sítio certo. Duas direções desenhadas por Marta Cunha: competência e determinação. “Sem competência e determinação não é possível ter sucesso de forma sustentada a longo prazo”, garante. “Há uma frase muito famosa de Einstein que dizia que só no dicionário é que o Sucesso aparece antes de Trabalho”, acrescenta. Terá sido essa a receita de quem entrou para a Sonae há 16 anos e tem crescido na empresa.

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Cristiani Oliveira, diretora da empresa de sondagens Intercampus desde 2011, alinha no mesmo sentido. “Se tiver que destacar uma característica, diria que é a persistência. Nunca conheci uma mulher de sucesso que tivesse vivido uma vida perfeita, sem obstáculos”, sublinha.

Só somos líderes quando os outros nos reconhecem como tal”, aponta Marta Cunha.

Para Stacey Wallaberger, o sucesso pessoal chegou quando conseguiu criar o seu negócio. Não tem o segredo do sucesso, mas tem uma lista de momentos e desafios que foram importantes no processo. Diz ela que ser empreendedora e começar uma empresa do zero implica, num primeiro momento, depender muito de si própria. E aí, é preciso alguma autogestão. “É fácil entrar num processo de trabalhar sem parar ou então numa distração completa. É preciso que cada um perceba o que funciona melhor para si”, explica.

“Por mais que acredites na tua empresa, vai haver sempre outras ideias de outras pessoas a surgir, que parecem muito melhores. O meu conselho é: mantém-te fiel à tua ideia original”, diz Stacey Wallaberger. As ideias dos outros podem abalar não só o produto, como a perceção da capacidade que cada um tem para estar à frente dele. É a própria que o confessa: “O marketing pessoal é outro grande desafio. Quanto é que eu e o meu produto valemos na realidade? Aqui, o truque é pensarmos que ‘eu’ valho mais do que o desafio em si”, sugere, e investir em “trabalhar as nossas capacidades, porque os desafios vão mudando, mas a nossa marca é sempre a nossa marca”.

O verdadeiro líder é aquele que consegue pensar no que é melhor para o bem comum. O meu chefe costuma dizer que o que é não é bom para a colmeia, não é bom para a abelha. E tem toda a razão”, diz Cristiani Oliveira.

E será que há diferenças entre a liderança no feminino e a liderança no masculino? “Sim, há uma grande diferença”, aponta a fundadora da Metis Consulting. “Os homens tomam decisões e as coisas acontecem. Mais: eles ficam com os louros e com os elogios para si. As mulheres tomam decisões e continuam a pensar se aquele é ou não é o caminho certo, e ainda vão pedindo desculpas pelo caminho. Não tomam os elogios só para elas, mas sim para a equipa toda”, indica Stacey Wallaberger.

Pode não saber-se os dados da equação mas, para Marta Cunha, o género não entra definitivamente no cálculo:”Mais importante que as questões de género, eu diria que são as características de personalidade e as experiências passadas que mais moldam o estilo de liderança”.

Arrependimentos e obstáculos

Na altura de olhar para trás e apontar um arrependimento, Cristiani Oliveira folheia 20 anos de carreira. Mas logo se lembra do “maior erro” cometido no percurso: “Há uns 10 anos, dediquei-me quase exclusivamente à carreira. Chegava a trabalhar 18 horas por dia, 7 dias por semana, várias semanas seguidas. Isso não é saudável para ninguém. Apesar de poder trazer resultados impressionantes a curto prazo, não é sustentável a longo prazo, quer para o indivíduo, quer para a organização”, reflete hoje a diretora da Intercampus.

Cristiani Oliveira é brasileira. As horas intermináveis de trabalho aconteceram já quando estava integrada em Portugal. A mudança fez-se há 15 anos e, com ela, veio o rótulo “imigrante brasileira”, que ergueu várias barreiras, refere ao Observador: “Ser imigrante, mulher e brasileira, pelo menos naquela altura, foi muito complicado. Eu vim para Portugal na altura do movimento ‘Mães de Bragança’”. Ainda hoje algumas pessoas têm a tendência para generalizar, com base na nacionalidade ou etnia. São ‘os ciganos aldrabões’, ‘as brasileiras que roubam maridos’, etc”.

Arrependo-me mais dos passos que não dei. Mas quando tenho o célebre pensamento “se soubesse o que sei hoje…”, digo automaticamente “pois, mas na altura não sabias o que sabes hoje, portanto vamos em frente”.

A relação entre a simpatia e a credibilidade

“Se uma mulher é competente, não é lá muito simpática. Se uma mulher for muito simpática e extrovertida, é vista mais como ‘simpática’ do que como ‘competente'”. A frase é de Sheryl Sandberg, responsável de operações do Facebook, autora do livro Lean In: Women, Work, and the Will to Lead e uma das mulheres mais poderosas do mundo. Será que quem é mais sisudo é visto como mais credível? Muita simpatia significa pouca competência?

“Espero sinceramente que não! A competência vê-se no conteúdo, a simpatia está na forma. Aliás, a simpatia pode ser uma forma de competência, pela própria confiança que transmite. Uma pessoa simpática terá alguma segurança natural e capacidade de ouvir, o que facilita a relação”, considera Marta Cunha.

Depois de refletir, Cristiani Oliveira diz que a simpatia é só mais uma das formas de “julgar a credibilidade de uma mulher, como a beleza e a honra”. Aponta o caso recente da revista Veja, que retratou a mulher do vice-presidente Temer como “bela, recatada e do lar”, mas vai mais longe: “Aqui na Europa não é muito diferente. Basta vermos os comentários contra as deputadas do Bloco de Esquerda e outras mulheres na política, muitas vezes centrados mais na sua aparência e modo de estar do que nas suas ideias”, destaca.

A competência vê-se na capacidade que tens de ou não ter trabalho feito e pôr as coisas a mexer”, define Stacey Wallaberger.

A célebre tríade: carreira, os filhos e a casa

Umas têm ajuda da família, outras têm quem cuide das tarefas domésticas, outras têm os dois e mais uns pozinhos que facilitam a vida. Cristiani Oliveira não esconde que, lá em casa, o cenário é favorável a uma vida tranquila: “Tenho um marido fantástico que compreende que as responsabilidades da casa e das crianças são de ambos. Quando lava a louça não está a “ajudar-me” como pensam muitos homens. A louça não é minha, é da casa”, determina.

Trabalho é trabalho, conhaque é conhaque e descanso é descanso. Nem sempre se consegue, mas tenta-se. “Durante o dia faço o melhor para estar concentrada e render o mais possível durante as horas que estou no escritório. Evito levar trabalho para casa. Se as coisas se acumulam prefiro vir mais cedo para o escritório”, sugere a diretora da empresa de sondagens.

Marta Cunha, por sua vez, garante que há dois pilares fundamentais: “organização e método”. Diz a responsável da Sonae que é preciso “ter regras e planificar tudo aquilo que fazemos com antecipação. Um bom planeamento permite-nos antecipar decisões, definir corretamente objetivos, alocar recursos da melhor forma”. Depois, há que medir até que ponto somos ou não um “recurso” essencial naquele momento. “É preciso saber em que momentos é que efetivamente fazemos a diferença, e delegar aqueles em que somos apenas mais um. Tenho muitos papéis na minha vida e sei que só sou feliz com a conjugação equilibrada de todos eles”, sublinha.

“Um dos maiores desafios foi quando estava a frequentar o MBA, pois tive de conciliar o papel de estudante, mãe e profissional. Mas com organização e método, aliado ao apoio incondicional da família e dos colegas, foi possível superar”, lembra Marta Cunha. E resultou. Em 2014, Marta foi eleita a melhor aluna de MBA do mundo

Stacey Wallaberger nasceu na África do Sul, cresceu numa quinta e em adolescente mudou-se para a Suíça. Lá finalizou o ensino secundário e entrou para a faculdade, mas foi também lá que foi mãe. “Os meus filhos eram pequenos e eu vivia numa zona da Suíça onde não havia centros de saúde com cuidados para crianças e os centros privados eram muito caros. Por isso, tive de começar a trabalhar em part time. As mulheres eram encorajadas a ficar em casa, mas felizmente isso está a mudar”, diz a empresária da Metis Consulting.

A importância de um primeiro contacto

“Nós somos o nosso próprio instrumento de marketing”, sentencia Stacey Wallaberger. A palavra de ordem já está mais do que gasta, mas é a escolhida por todas: confiança. É uma arma importante num primeiro encontro, quando o primeiro impacto é sobretudo visual. Para Marta Cunha, a “informalidade” resulta melhor: “Usada obviamente com bom senso e respeitando os limites naturais de cada um, ajuda a quebrar barreiras e a gerar um clima de conforto entre as pessoas”, explica.

Hoje em dia há livros sobre tudo, desde como se dever apertar a mão, ao tom da voz, aos comportamentos que causam mais impacto. Eu acredito que a nossa melhor imagem é aquela que reflete quem somos verdadeiramente”, refere Cristiani Oliveira.

Depois, não é preciso jogar logo os dados todos como se aquele fosse o casting final de um concurso.”Eu acho que ‘menos é mais’ e num primeiro contacto não costumo adiantar muita informação”, diz Cristiani Oliveira. A diretora da Intercampus acrescenta: “As pessoas fazem um esforço extraordinário para demonstrarem que são melhores do que realmente são. Mas depois não conseguem manter o ritmo. Eu acredito que a melhor aposta é a autenticidade. Transmitir o que somos”.