O financiamento das empresas públicas com garantias do Estado influencia cada vez mais a avaliação que é feita dos ratings dos países emergentes, como no Brasil e Moçambique, considera a agência de notação financeira Standard & Poor’s.

“O rápido crescimento em dívida de entidades relacionadas com o Governo e do crédito das empresas públicas coloca potencialmente novos riscos para os ratings soberanos”, lê-se num relatório da agência de notação financeira Standard & Poor’s, que particulariza os casos de Moçambique e Brasil como dois exemplos em que as empresas públicas podem influenciar o ‘rating’ do país.

Recentemente, a S&P reviu em baixa o rating de Moçambique precisamente porque o Estado teve de intervir para garantir o pagamento de um empréstimo contraído por uma empresa pública, a Empresa Moçambicana de Atum (Ematum), avançando com a troca de obrigações da companhia por títulos de dívida soberana do país.

“Moçambique entrou em incumprimento financeiro [default, no original em inglês] em abril deste ano, ou melhor, um título com garantia estatal de uma entidade relacionada com o Governo entrou em incumprimento, levando à estipulação de um incumprimento financeiro soberano já que a garantia não foi executada”, diz-se no relatório.

A análise da S&P não constitui nenhuma ação de rating, sendo antes uma análise sobre a importância das empresas estatais na avaliação do crédito soberano, e tem como título ‘Perigos contingentes e risco soberano nos mercados emergentes: uma ameaça crescente?”.

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A resposta, lê-se no texto, é afirmativa, até pela degradação da situação financeira destas empresas públicas, que têm sido um dos principais motores da subida do número e montante das emissões de dívida dos mercados emergentes, entre os quais estão o Brasil, a Rússia, a China ou a Turquia.

“As economias emergentes representaram 47% do crescimento da dívida total entre 2007 e 2014, um salto dos 22% entre 2000 e 2007”, afirma-se no texto, que acrescenta que do total de emissões de dívida nos mercados internacionais, “49% foi feita por entidades relacionadas com o Governo”, ou seja, empresas públicas ou de capital maioritariamente estatal.

“No ano passado 170 destas empresas recorreram aos mercados financeiros internacionais, sendo que só as cinco maiores (as empresas nacionais de petróleo do México, Brasil, Venezuela e Rússia e o banco de importações e exportações da Coreia do Sul) representaram um quarto dos 783 mil milhões de dólares de dívida emitida”, argumenta a S&P.

A explicação para esta subida significativa no número e no montante de emissões por parte das empresas públicas e dos países emergentes está relacionada com as baixas taxas de juro praticadas no Ocidente no seguimento da crise financeira que desaguou numa recessão mundial em 2009, obrigando os investidores a procurarem paragens mais rentáveis.

Com a descida do preço do petróleo, as economias dependentes desta matéria-prima viram-se a braços com uma descida das receitas, sendo obrigadas a recorrer a novas fontes de financiamento, nomeadamente nos mercados internacionais, onde os grandes investidores viram uma oportunidade de aplicar as verbas com taxas de juro que em muitos casos tinham dois dígitos.

“As emissões corporativas [de empresas] e particularmente de empresas estatais e bancos mostraram um apetite voraz, passando de um nicho para investidores especializados a um dos mercados em maior crescimento no espaço das taxas fixas”, analisa o relatório, lembrando que, de acordo com os dados da M&G Investments, estas empresas públicas emitiram 374 mil milhões de dólares em 2014, o que representa mais do dobro dos 150 mil milhões emitidos cinco anos antes.

A importância destas empresas para a análise do rating do país comprova-se na relação entre a Perspetiva de Evolução destas economias, com 9 dos 20 maiores mercados emergentes a terem esta Perspetiva em terreno negativo.

“Esta tendência negativa sugere que o deslize gradual dos ratings soberanos dos mercados emergentes é não apenas provável que continue, mas que acelere”, conclui a S&P.