O comissário europeu da Investigação, Ciência e Inovação, Carlos Moedas, deu esta segunda-feira o exemplo da Airbnb e da Uber como empresas que “criaram mercados que não existiam” e afirmou que a Europa “não está a agarrar estas ideias” como acontece em países como os Estados Unidos e a China.

A Europa não está a agarrar estas ideias como vemos noutras partes do mundo. Elas parece que estão a acontecer numa outra parte do mundo. A inovação disruptiva, criadora de mercados, é aquela que nós queremos capturar na Europa. Temos que conseguir fazer algo para captar os inovadores. Esse é o grande desafio da Europa”, acrescentou o comissário.

Carlos Moedas falava no Museu Nacional de História Natural e da Ciência, em Lisboa, onde decorreu esta segunda-feira, dia 9 de maio (dia da Europa), a Bolsa do Empreendedorismo, uma iniciativa promovida pela representação da Comissão Europeia em Portugal. O comissário europeu defendeu que a Europa precisa “de inovação aberta para beneficiar das oportunidades do mundo digital”, pelo que é preciso “criar um ambiente favorável ao empreendedorismo, ao investimento e ao capital de risco”.

A revolução digital veio democratizar a inovação. Durante muitos anos esta esteve centrada no produtor, na empresa, naquele que construía. Hoje, é preciso pensar no que o utilizador quer”, afirmou.

O comissário sublinhou ainda que a estratégia para os próximos cinco anos da Europa está centrada em três “o”: open inovation, open science, open to the world, ou seja, abrir espaço à inovação aberta, à ciência aberta e ao mundo. “Contra o extremismo e o protecionismo, a ciência deve ser o contrário: a capacidade de os homens mudarem o mundo através desta abertura”.

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O evento contou ainda com a presença do ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral. E, numa altura em que estão abertas as candidaturas para o programa Portugal 2020 (uma parceria entre Portugal e a Comissão Europeia, que fará com que o país receba, nos próximos 4 anos, 25 milhões de euros em fundos comunitários) e em que o governo anunciou o lançamento de dois programas de incentivo às empresas, o Startup Portugal e o Portugal – Indústria 4.0, o comissário lembrou que “a inovação não acontece por decreto”.

Mais tarde, o ministro da Economia viria a dizer que “há áreas em que não podemos esperar que seja o mercado a resolver” e que, se “não cabe ao Estado empreender nem ao governo ser empreendedor, cabe ao Estado, ao Governo e ao ministério da Economia criar condições para que as empresas possam florescer. Não chega dizer às empresas que empreendam, que assumam riscos. É preciso dar-lhes condições e é nisso que estamos a trabalhar”, afirmava.

Estes programas, como o Portugal 2020, não têm sido excelentes em ouvir, em encontrar os inovadores e ouvi-los dizer o que querem, em vez de lhes dizermos o que devem fazer”, apontou ainda o comissário.

“Sou crítico face à Europa que temos hoje”

O Governo também se fez representar no evento, através do ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, que concordou com o comissário europeu: é preciso “facilitar a vida às novas empresas” e garantir que “o enquadramento legal não seja um entrave aos novos produtos”.

Facilitar a vida às novas empresas é reduzir os encargos burocráticos. Há alterações legislativas que temos de encarar. Queremos que Portugal seja uma zona livre para o empreendedorismo, [o que implica] assumir a ideia de que quem faz coisas novas vai esbarrar com leis feitas para o que já existe”, disse.

Numa altura em que o setor dos táxis tem protestado de forma veemente com a Uber, pelo facto de a tecnológica “não cumprir” com a legislação em vigor, Caldeira Cabral sublinhou que “há um choque permanente” entre novas empresas e setores tradicionais. Mas explicou que não pode estar “previsto na lei aquilo que não existe. É isso a inovação: criar o que não existe.”

Não queremos alterar todas as leis ao sabor da inovação e é preciso enquadrar também na lei coisas disruptivas. Mas antes disso temos de encarar o facto de que a lei tem que ter espaço para a inovação“, afirmou.

Com Carlos Moedas presente, o ministro da Economia teceu ainda críticas contundentes à União Europeia: esta “não é”, ou não deve ser, “um projeto contabilístico, de finanças públicas”, mas também de “ambição, de desenvolvimento e sustentabilidade”.

É por ser europeísta que sou crítico face à Europa que temos hoje, face aos recuos do projeto europeu. A Europa não é um projeto contabilístico, de finanças públicas, é um projeto de ambição. É a desatenção do projeto europeu a essa ambição que faz com que hoje na Europa se discutam referendos sobre países que querem sair da Europa, níveis de descontentamento da juventude com o projeto europeu jamais vistos, tanta instabilidade, guerra, refugiados e tantos outros problemas que a Europa não tem conseguido evitar que aconteçam e que está agora a lutar para remediar.”, afirmou.

“O populismo não é o caminho, mas a regressão do projeto europeu e da ambição também não é o caminho. A Europa tem que ter a maturidade, nas suas instituições, nos seus cidadãos, de reencontrar esse projeto e o entusiasmo [europeísta]. É nessa Europa que me revejo”, acrescentou o governante.

Já quanto à política europeia para o empreendedorismo, o ministro afirmou que a vê com “enorme entusiasmo” e que essa política “encontra em Portugal o mesmo eco. É uma política central para o ministério da Economia”, sublinhou o responsável, que tem a tutela da inovação. Para exemplificar a atenção do Governo ao assunto, Caldeira Cabral citou o exemplo dos programas “Startup Portugal” e “Portugal – Indústria 4.0”.

ID Flow e Big Eye vencem “Elevator Pitch – Ideias que Marcam”

Durante o evento, foram ainda anunciados as duas empresas vencedoras do concurso “Elevator Pitch – Ideias que marcam”. A ID Flow, uma empresa que desenvolveu “um kit rápido e simples de deteção da bactéria de infeção urinária”, e a igualmente portuguesa “Big Eye”, que desenvolveu uma tecnologia para o setor da pesca, que “registar dados a bordo das embarcações e providenciar informação útil aos gestores de frota”, foram os vencedores do concurso.

As duas empresas foram escolhidas entre 16 finalistas e perto de 150 candidaturas, tendo cada uma sido premiada com uma bolsa de cinco mil euros. As duas empresas receberam ainda “uma bolsa de 25 horas para apoio jurídico pro bono“, oferecida pela Vieira de Almeida & Associados (uma das parceiras do concurso), “acesso direto” à PPL, uma plataforma de crowdfunding nacional, “acompanhamento personalizado” e “divulgação direta e personalizada do projeto”.

Os 16 finalistas receberão ainda “um workshop de 3 horas” nos escritórios da Vieira de Almeida & Associados, “sobre o enquadramento jurídico da propriedade intelectual e alguns dos quadros jurídicos de financiamento para projetos de empreendedorismo” e acesso a espaços de trabalho na Startup Braga (outra das parceiras), assim como a eventos e workshops internos da hub nortenha.