Depois das réplicas de quadros na ruas de Lisboa, em setembro do ano passado, e da campanha de angariação de fundos que conseguiu juntar mais de 600 mil euros, entre outubro e abril, para a compra da pintura “A Adoração dos Magos”, de Domingos Sequeira – para darmos exemplos recentes –, o museu da Rua das Janelas Verdes apresenta uma exposição temporária que volta a surpreender.

“Obras em Reserva – O Museu que Não se Vê” é inaugurada esta terça-feira, ao fim da tarde, com a presença do primeiro-ministro e do ministro da Cultura. Vai manter-se até 25 de setembro, o que indica tratar-se de uma mostra pensada para os turistas que visitam Lisboa nos meses de verão. São esperadas mais de 30 mil pessoas.

“Abrimos a arca e tirámos o que lá existe de melhor”, resume José Alberto Seabra Carvalho, diretor-adjunto do MNAA.

A entrada será gratuita para quem compre bilhete, no valor de seis euros, para a exposição permanente. Na quarta-feira, Dia Internacional dos Museus, a entrada também é livre, o mesmo acontecendo no sábado, 21, entre as 18h00 e a meia-noite.

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Projeto de António Filipe Pimentel, comissariado por Anísio Franco e José Alberto Seabra Carvalho, inclui nada menos que 314 obras de pintura, escultura, desenho, cerâmica, livros, ourivesaria, mobiliário e têxteis. Estão divididas por sete núcleos temáticos, cada um com mais aparato que o outro, num crescendo de sumptuosidade, formas e cores.

Algumas das obras nunca antes foram mostradas. É o caso de “O Triunfo da Morte – Almas Conduzidas à Boca de Leviatã”, um desenho de cerca de 1537 atribuído a Francisco de Holanda. Outras são autênticas jóias da coroa, como o desenho do fim do século XV “Apóstolos”, de Pietro Perugino, que representa um pormenor do fresco que decorava a parede da Capela Sistina, destruído em 1541 para dar lugar ao “Juízo Final”, de Miguel Ângelo.

Os objetos agora expostos, informa o diretor-adjunto, costumam estar nas reservas do MNAA, isto é, a cave do museu, espaço com cerca de mil metros quadrados a que só os técnicos costumam ter acesso.

“A mostra dá a conhecer obras retidas nas reservas por razões tão diversas como a sua problemática interpretação e mesmo por serem falsas, malgrado o seu poder de sedução aos olhares menos experimentados”, lê-se na folha de sala.

A falta de espaço nas salas abertas ao público, o estado degradação e os materiais frágeis, que obrigam a afastá-las da luz e de mudanças de temperatura, são outras das razões para que as obras estejam habitualmente longe dos olhares.

De resto, o museu não cresce desde a última intervenção de fundo, em 1983. O diretor-adjunto gostaria de ter um “projeto de arquitetura a curto prazo” que permita a ampliação do lado da Avenida 24 de julho. Mas adianta que eventuais obras não são para já.

Estas são algumas das raridades que pode ver no museu:

1_Leao_760esc Título: “Leão”
Origem e data: período ptolemaico, 323 a.C.-30 a.C.
Material: Basalto, pórfiro (base).

Peça de pequenas dimensões, doada em 1952 pela Fundação Calouste Gulbenkian, cujo fundador a comprara em 1917, terá tido como primeiro proprietário identificado William Hamilton (1730-1803), diplomata britânico e arqueólogo. Ganhou crédito na Europa no século XIX perante o culto de obras de arte egípcias, na sequência das Invasões Francesas e da chegada de Napoleão ao Egipto. É dos objetos mais antigos que existem no MNAA e encontra-se logo no início da exposição.

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Título: “Retrato do Primeiro Visconde de Azevedo Ferreira”
Autor e data: Columbano Bordalo Pinheiro, 1881-1883
Material: óleo sobre madeira

Ao lado do “Leão”, na primeira sala, esta pintura é muito mais pequena do que a fotografia faça supor. Mostra bem as características do trabalho de Columbano naquela época época: “Uma pintura pastosa, de acentuado claro-escuro, executada numa paleta reduzida”, diz o catálogo. Foi feita em Paris e retrata o visconde de Azevedo Ferreira, comerciante português com fortuna feita no Brasil.

6_Nascimento_da_Virgem_2542_Des Título: “Nascimento da Virgem”
Autor e data: Pietro Vannucci, dito Perugino, ou Raffaello Sanzio, dito Rafael; 1488-1497
Material: desenho à pena sobre papel

É um dos mais antigos desenhos da coleção do MNAA, pintado por Perugino para a Igreja de Santa Maria Nuova de Fano, em Itália. É um estudo preparatório para o painel do “Nascimento da Virgem”.

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Descrição: Copo
Autor e data: Felix Ramos, cerca de 1816-1818
Material: vidro com decoração gravada e talhada

Copo oferecido pela rainha de Espanha Maria Isabel de Bragança, ao pai, D. João VI, criado pelo artífice Felix Ramos, um dos responsáveis pelo restabelecimento do prestígio da fábrica vidro de La Granja, fundada em 1727 em Espanha para produzir peças para o palácio real.

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Título: “O Descobrimento da Índia”
Origem e data: Oficinas de Tournai, cerca de 1504-1530
Materiais: Lã e seda (não confirmado)

A série de tapeçarias À Maneira de Portugal e da Índia foi encomendada por D. Manuel à oficinas de Tournai, na Flandres, para celebrar a chegada de Vasco da Gama à Índia, em 1498. E nessa série que se inspira esta tapeçaria, a qual aparece descrita no catálogo do MNAA em termos que indicam tratar-se de uma imitação, perante a ausência de símbolos associados ao rei. Está na última sala da exposição e cobre uma parede inteira. É impressionante quando vista ao vivo.

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Autor e data: atribuído a Francisco de Holanda, cerca de 1537
Título: “O Triunfo da Morte – Almas Conduzidas à Boca de Leviatã”
Material: desenho à pena, tinta da china sobre papel

“Nunca antes expostos ou estudados”, como informa o catálogo, os desenhos (são dois) terão sido executados por Francisco de Holanda, que conheceu Miguel Ângelo em Itália. Há a hipótese de serem, mais do que estudos para iluminuras, ilustrações para uma versão da De Civitate Dei, de Santo Agostinho.

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Título: “Apóstolos”
Autor e data: seguidor de Pietro Vannucci, dito Perugino, fim do século XV
Material: desenho a ponta de prata, pena a tinta branca sobre papel

Do fresco iniciado por Pietro Perugino em 1480 na Capela Sistina, destruído em 1541 para dar lugar ao “Juízo Final”, de Miguel Ângelo, restam hoje dois registos gráficos: um desenho guardado pela Galeria Albertina de Viena, e este outro da coleção do MNAA, “magnífica folha” com detalhe do grupo de apóstolos no canto inferior direito do fresco.

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Descrição: Fonte com mesa
Data e origem: Alemanha (provável), cerca de 1875
Material: madeira dourada e entalhada

Descrita como “excecional”, a fonte, maior que uma pessoa de estatura média, tem cunho de Juste-Aurèle Meissonier (1695-1750), ourives e escultor francês que trabalhou para Luís XV e várias cortes europeias, incluindo a portuguesa. A peça procura imitar as fontes monumentais que nos séculos XVII e XVIII decoravam jardins nobres, replicando esse deslumbramento com a água que dizia bem da preocupação com a higiene e a decoração.

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Descrição: Poncheira do serviço dos príncipes das Astúrias
Origem e data: França, Sèvres, 1773-1793
Material: porcelana

Serviços de porcelana de mesa produzidos apenas para famílias reais europeias foram produzidos na segunda metade do século XVIII na manufatura de Sèvres, arredores de Paris. O primeiro grande serviço foi o dos príncipes das Astúrias, de que faz parte esta poncheira, encomenda de Luís XV, em 1774, para a sua neta Maria Luísa de Parma, casada em 1765 com Carlos de Bourbon, então príncipe das Astúrias e herdeiro do trono de Espanha.