O jornal espanhol El País conta que foi montada uma rede corrupta dentro do destacamento de capacetes azuis no Líbano. O esquema consiste em vender as sobras da comida enviada às tropas da ONU aos mercados locais. Os alimentos são vendidos mais baratos aos comerciantes, uma vez que não têm taxas, e permitem aos capacetes azuis arrecadar lucros que podem chegar aos 4 milhões de euros anuais. Estes valores são divididos entre os soldados das Nações Unidas envolvidos nesta rede e os condutores libaneses que distribuem os produtos, e dizem respeito a apenas cinco dos 21 postos de distribuição de comida da ONU no Líbano.

A denúncia foi feita pelos consumidores, que detetaram os produtos nos mercados locais, uma vez que ainda tinham os rótulos que diziam que os produtos eram para uso exclusivo das tropas e que não deviam ser vendidos. Tanto as Forças Interinas das Nações Unidas no Líbano (Unifil, na sigla em inglês) como o Ministério da Economia Libanês têm investigações em curso, mas até agora nenhum soldado foi sancionado.

Esta é uma situação que se arrasta há uma década e aos olhos de todos. Os alimentos destinados às Forças da Paz chegam às prateleiras dos supermercados ainda com os rótulos, que dizem que aqueles produtos se destinam exclusivamente à Unifil e que a sua venda é proibida. Um trabalhador da subsidiária libanesa, que trata da distribuição, garante que o esquema esteve operacional entre 2010 e 2015. Há, no entanto, relatos de fraude já em 2006.

Um relatório da ONU divulgado pela Wikileaks mostra que o negócio serve os capacetes azuis que lucram com o excedente de comida, os condutores libaneses que vêm o seu salário duplicado ou triplicado e os comerciantes locais que compram produtos de qualidade, por metade do preço de mercado e isento de taxas. De entre os cinco destacamentos que atuam no Líbano, os que mais lucram com esta rede são o do Gana e o de Itália.

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Auditorias feitas pela ONU já tinham detetado que a quantidade de comida enviada às Forças da Paz é excessiva, no entanto, um trabalhador da Unifil contou ao jornal espanhol que o destacamento ganês queixou-se à ONU de que passavam fome, dias depois de terem recebido comida. O batalhão ganês esteve sob investigação pela revenda de noodles. A mesma fonte conta que os excedentes do destacamento malaio eram movimentados pelo batalhão ganês, uma vez que este tem contactos no mercado.

A Unifil está a levar esta situação a sério e está a fazer uma auditoria interna exaustiva, que até foi adiantada seis meses em relação à data prevista.

Os capacetes azuis da ONU atuam no Líbano há 38 anos e velam pela paz na fronteira entre o país e Israel e tentam controlar a ação da milícia do Hezbollah.