António Mariano, presidente do Sindicato de Estivadores, anunciou esta quarta-feira que vai pedir ao Ministério Público que investigue o que de facto provocou a rutura de ‘stocks’ de alguns medicamentos na Madeira durante a paralisação do porto de Lisboa. Isto porque, diz António Mariano, alguém fez de “propósito” para que os medicamentos não chegassem ao arquipélago.

“Cumprimos sempre os serviços mínimos e carregámos tudo. Até 300 automóveis por semana com destino à Madeira. [A rutura de ‘stock’] foi uma encenação”, começou por dizer o dirigente sindical. “Mas como mexe como a vida das pessoas, iremos pedir ao Ministério Público para investigar isto porque alguém fez com que não chegassem deliberadamente à madeira”, garantiu António Mariano na Comissão de Economia, Inovação e Obras Públicas.

Em maio, o ‘stock’ de medicamentos para a hemodiálise entrou em rutura em vários hospitais madeirenses, com a Força Aérea a ser obrigada a intervir. Em plena greve de estivadores, a direção clínica e os diretores de serviço do Hospital Central da Madeira chegaram mesmo a colocar os lugares à disposição em parte devido à falta de medicamentos e material. O Governo Regional madeirense decidiu depois substituir a administração do hospital.

Agora, o dirigente sindical veio rejeitar qualquer responsabilidade na crise de ‘stock’ que aconteceu na Madeira durante a greve de estivadores e fala mesmo em interesses de terceiros nessa rutura, embora nunca tenha nomeado quem capitalizou essa crise de medicamentos.

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De resto, a audição de António Mariano acabou por ficar marcada pelas críticas dos partidos mais à esquerda à precariedade que associam ao trabalho de estiva no porto de Lisboa e à lei do trabalho portuário aprovada em 2013, pelo Governo PSD/CDS. Um “balão de ensaio” usado “para abrir a porta precariedade na Europa para que os outros países possam ver como se faz em Portugal”, acusou Bruno Dias, deputado do PCP. “Uma espécie de candeia que vai à frente e alumia duas vezes”. Uma posição partilhada também pelo deputado bloquista Heitor de Sousa.

A nova lei do trabalho portuária foi aprovada por PSD, CDS e PS e Ana Paula Vitorino, ministra do Mar do Governo socialista, já veio garantir que a lei não vai ser alterada, “na medida em que se trata de uma adaptação à legislação comunitária”.

Por isso mesmo, Cristóvão Crespo, deputado do PSD, acusou o sindicato de estivadores do porto de Lisboa de estar a tentar ultrapassar uma lei que foi pensada “para aumentar a competitividade do país”, através na renegociação de um novo contrato coletivo. “Se houver noutros portos aquilo que houve em Lisboa o que estamos a assistir é uma revogação implícita” da lei aprovada em 2013.

“A lei foi aprovada por 80% dos deputados da Assembleia da República. Não podemos ter um grupo de 85% [de estivadores] a dizer: ‘Nós não queremos essa lei'”, concordou Hélder Cabral, deputado do CDS, que acusou ainda o estivadores de querem manter um “oligopólio” no porto de Lisboa.

O dirigente sindical foi reafirmando que esta é uma luta contra as condições precárias de trabalho e contra os alegados abusos que se têm verificado nos portos de todo o pais. Sobretudo em Lisboa, onde ele disse existir uma empresa de contrato de trabalho temporário a subcontratar outra empresa de trabalho temporário, uma “contraordenação muito grave” do Código de Trabalho.

Rejeitando todas as críticas de querer controlar pela força do sindicato o porto de Lisboa, o dirigente sindical procurou responder assim aos que acusam o sindicato de fechar o porto a trabalhadores sindicalizados: “Há imagens muito poéticas, como aquela do filme [“Há Lodo no Cais”]. De facto, em 1979 éramos um sindicato-patrão. Mas já se fizeram muitos filmes. Não escolhemos trabalhadores há 38 anos.”

Na terça-feira, a assinatura do novo contrato coletivo dos estivadores acabou por ser adiada por ausência de uma das partes. Sem concretizar as acusações na audição desta quarta-feira, António Mariano disse que os operadores estarão a tentar “introduzir condições no contrato coletivo de trabalho” que não constavam e que contrariam o acordo celebrado a 27 de maio. Não há garantias que o acordo seja fechado em breve.