Se não é uma pessoa muito dada a manifestações de afeto e é pouco carinhoso, isso pode não querer dizer que é uma pessoa fria. Se calhar, a “culpa” é dos seus genes.

O silenciamento de um gene específico pode afetar os comportamentos sociais humanos, em especial ao nível das emoções, o que inclui a capacidade de uma pessoa estabelecer relacionamentos saudáveis ou reconhecer os estados emocionais dos outros. A descoberta foi feita por uma equipa de psicólogos da Universidade da Geórgia (EUA) e foi divulgada pela EurekAlert!.

https://twitter.com/IngridOliphant/status/745385836745654272

No artigo publicado no passado dia 20 de junho na revista “Proceedings of the National Academy of Sciences” (PNAS), os investigadores analisaram um processo conhecido como metilação, que pode reduzir a expressão de genes específicos e afeta um gene chamado OXT. Este gene é responsável pela produção de uma hormona chamada oxitocina, na qual se baseiam vários comportamentos sociais em seres humanos e outros mamíferos. A hormona oxitocina é crucial no amor e, entre outras coisas, é responsável pela subida do leite e favorece o estabelecer de vínculos entre a mãe e o bebé recém-nascido.

Metilação do ADN

Mostrar Esconder

A metilação do ADN é um tipo de modificação química do ADN que pode ser herdada e que pode ser removida sem mudar sua sequência original.

“A metilação restringe o quanto um gene é expresso e um aumento na metilação, tipicamente, corresponde a uma diminuição na expressão de um gene, ou seja, afeta o quanto um gene em particular está a funcionar”, disse Brian W. Haas, o principal autor do estudo.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Quando a metilação aumenta no gene OXT, isto pode corresponder a uma redução na atividade do gene. O nosso estudo refere que este processo pode ter um impacto profundo nos comportamentos sociais”, explicou o professor de Psicologia da Universidade da Geórgia.

Na investigação, Brian W. Haas e sua equipa recolheram amostras de saliva de mais de 120 participantes do estudo às quais realizaram testes genéticos que mostram níveis de metilação do gene OXT. Depois os participantes passaram por uma bateria de testes para avaliar a estrutura e função do seu cérebro, bem como as suas competências sociais.

Os participantes com maior metilação do gene OXT — o que corresponde a níveis mais mais baixos de expressão do OXT — tinham mais dificuldade em reconhecer expressões emocionais faciais e tendiam a mostrar mais ansiedade acerca das suas relações com pessoas queridas.

Os participantes no estudo viram um pequeno trecho de vídeo de rostos de pessoas que começam com uma expressão neutra e gradualmente alteram a expressão para uma mais emocional. No momento em que sentiam confiantes acerca da emoção que estavam a ver, os participantes deviam carregar num botão. “Os participantes com maior metilação do gene OXT eram menos precisos a descrever os estados emocionais das pessoas que viram”, explicou Brian W. Haas. “Esta é uma característica tipicamente associada com o autismo, por exemplo.”

Através da análise da atividade cerebral recorrendo à tecnologia da ressonância magnética funcional, os investigadores mediram também o fluxo de sangue oxigenado, o que permitiu examinar as regiões do cérebro que foram ativadas durante várias tarefas. Esta análise permitiu perceber também que o aumento da metilação do gene OXT provoca a redução da atividade neural em regiões do cérebro associadas com o processamento sócio-cognitivo.

Todos os nossos testes indicam que o gene OXT desempenha um papel importante no comportamento social e na função cerebral“, reforçou o investigador.

Brian W. Haas e os co-autores do estudo alertam para o facto de os resultados serem preliminares e para a necessidade de aprofundar o trabalho de investigação sobre o gene OXT para que seja possível definir com maior clareza o papel da oxitocina. No entanto, a equipa mostra-se confiante que o estudo abra portas para o desenvolvimento de melhores tratamentos para uma variedade de distúrbios relacionados com as emoções.

“A metilação é um processo dinâmico e o nível de metilação pode mudar ao longo da vida de uma pessoa”, relembrou Brian W. Haas. “Mas pode ser possível alterar o nível de metilação com algum tipo de medicação o que poderia ajudar as pessoas com processos de cognição social que registam anormalidades.”