A primeira instituição portuguesa exclusivamente dedicada à arquitetura vai abrir as portas em Matosinhos, na primavera de 2017, com o nome oficial Casa da Arquitectura: Centro Português de Arquitectura. A primeira apresentação pública do projeto decorreu esta sexta-feira e a área de 8.000 metros vai alojar também a sede da Orquestra Jazz de Matosinhos, um restaurante central e negócios que podem passar por lojas, oficinas e galerias de arte.

“É um quarteirão inteiro”, explica ao Observador Nuno Sampaio, diretor executivo da Casa da Arquitectura — Centro Português de Arquitectura (o nome oficial não quer nada com o acordo ortográfico). Nasce em Matosinhos, cidade Natal de Siza Vieira, mas afirma-se como uma “entidade nacional de âmbito internacional“, diz.

As obras no edifício da antiga Real Vinícola acabam em dezembro. Depois, é preciso equipar os 4.700 metros quadrados da Casa, com mobiliário, projeções e iluminações. Só depois começa a montagem da exposição inaugural, que se vai chamar “Poder Arquitectura“. “É sobre a capacidade que a arquitetura tem de transformar um lugar e inclui a relação com oito poderes, entre os quais a comunicação social”, adianta. Comissariada por Jorge Carvalho, Pedro Bandeira e Ricardo Carvalho, será complementada por um programa paralelo forte, que incluirá conversas, filmes e visitas guiadas.

Até porque um dos pilares do projeto é envolver a população. Tudo menos uma Casa virada para si própria e para especialistas. O projeto Open House tem mostrado que as pessoas querem fazer visitas guiadas orientadas para a arquitetura — este ano foram 30 mil visitantes num fim de semana, números da organização –, e Nuno Sampaio está atento. “Os edifícios são os espólios vivos dos arquitetos e queremos ajudar a abrir esses edifícios ao público, permitindo-lhes que vivam cada vez mais a arquitetura. Nesse sentido, a Câmara Municipal de Matosinhos cedeu a Casa de Chá da Boa Nova em regime de comodato ao Centro Português de Arquitetura, que passa assim a receber a renda do restaurante de Rui Paula e fica com a responsabilidade de promover o edifício projetado por Siza Vieira, com visitas e com obras de manutenção.

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Esta sexta-feira e sábado, quem quiser pode ver como estão a correr as obras, que deverão terminar só em dezembro. © Divulgação

“Este é um projeto sustentável”, frisa o diretor. Para atrair o público, mas também financiamento, a Câmara cedeu à Casa a gestão de todo o quarteirão, onde vai ficar também a sede da Orquestra Jazz de Matosinhos e um restaurante central. Toda a área a nascente, com cerca de 2.000 metros quadrados, está neste momento a concurso e os interessados podem candidatar-se a um espaço ou a toda a área a concessionar. Nuno Sampaio gostaria de ver ali “lojas, oficinas de arte e galerias”, por exemplo.

As rendas revertem para o Centro Português de Arquitetura, que pagará as despesas com a vertente expositiva, que terá 1.000 metros quadrados disponíveis para esse efeito — “no início serão todas coletivas, algumas de produção própria, a outra metade será com parcerias para trazer exposições de outras entidades, nacionais e internacionais, para que possamos mostrar o que de melhor se faz na arquitetura” — e com a vertente de tratamento arquivístico, “que será de exceção”, promete o diretor. “A Casa da Arquitectura vai ter vocação para tratar, receber e conservar espólios e acervos. Ficam lá arquivados, com condições próprias.”

Para a I fase da coleção, os curadores João Belo Rodeia, Ricardo Carvalho e Graça Correia selecionaram 200 projetos para ficarem na Casa da Arquitetura, através de doação. São todos do período democrático pós 1974 até ao ano 2000. Garantidos estão também 450 maquetes de Eduardo Souto de Moura. Paulo Mendes da Rocha também doou o projeto do Museu dos Coches, inaugurado em 2015. “E temos projetos do arquiteto Álvaro Siza, que tem várias obras em Matosinhos”, adianta o diretor.

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A área a vermelho delimita toda a área de intervenção. Só para a Casa da Arquitectura vão 4..700 metros quadrados

O projeto tem o apoio principal do município de Matosinhos, e também do Porto e de Gaia, da Ordem dos Arquitetos, da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto, da administração dos Portos do Douro e Leixões e da Associação Empresarial Portuguesa. “Num país onde há pouco dinheiro, ou as entidades têm a capacidade de trabalhar em conjunto, ou não teremos impacto internacional“, defende Nuno Sampaio. Nesse sentido, o Centro Português de Arquitetura quer colaborar com “pelo menos 25 entidades que têm espólios e que não têm capacidade de os tratar. Podemos ajudar”, diz.

A partir dos anos 1990, a sociedade começou a despertar lentamente para a importância da arquitetura. Álvaro Siza Vieira venceu o Pritzker, principal prémio da área. Este mês, o Museu da Eletricidade, em Lisboa, passou a chamar-se Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia, o Centro Cultural de Belém inaugurou uma exposição dedicada à obra do arquiteto Eduardo Souto de Moura e Serralves, no Porto, expôs pela primeira vez parte do acervo que Álvaro Siza Vieira ali depositou. Mas não havia ainda um espaço deste género dedicado 100% à área.

“Agora há uma consciência em Portugal da qualidade de uma generalidade grande de profissionais, que tem à cabeça os dois Pritzkers portugueses, e que eu acho que não têm sido suficientemente valorizados“, afirma Nuno Sampaio. Acredita que, hoje em dia, há uma exigência da própria população com o seu ambiente urbano, os edifícios e os documentos, e um maior conhecimento da geração que tem hoje 40 e 50 anos. “Gostaria que a Casa da Arquitetura desse um contributo para a criação de uma estratégia nacional de arquitetura, que ainda não existe. Esperemos que no futuro se inverta uma situação, que é o facto de a arquitetura ser a única área cultural na qual o Estado não está envolvido.

Esta sexta-feira e sábado, o convite ao envolvimento faz-se à população em geral, com um programa extenso chamado “Be a part of“, onde se incluem visitas guiadas, conferências, conversas e debates. Sexta-feira à noite há um concerto da Orquestra Jazz de Matosinhos em parceria com o arquiteto Luís Urbano, que será feito de música, imagens e sons dos telemóveis do público. “Será o primeiro concerto de vários.” Promessa de diretor.

Notícia corrigida às 08:55: só a Casa da Arquitectura ocupa 4.700 metros quadrados, de uma área total de 8.000 metros quadrados.