“A Resistência”
Julián Fuks
(Companhia das Letras, 2016)

Julián Fuks escreveu um livro sobre a circunstância de ter um irmão adoptado e sobre a forma como lida com isso. Se houvesse um género para encaixar este livro seria o de livro-dúvida. É feito de um imenso pudor o avanço desta pesquisa.

A história não é só sobre esse irmão que foi adoptado num contexto extremo da História da Argentina. Também é sobre os pais, guerrilheiros de esquerda, expulsos de Buenos Aires em tempos de ditadura militar.

A linguagem é sempre elegante, sóbria e desconfia da própria literatura: “Nenhum livro jamais poderá contemplar ser humano nenhum”. Mas pode tentar. E ser feliz na tentativa.

“Portugueses do Brasil & Brasileiros de Portugal”
Leonor Xavier
(Oficina do Livro, 2016)

Leonor Xavier é antes de mais uma pessoa arguta, curiosa e que prefere a luz à sombra. São qualidades fundamentais para fazer dela uma excelente conversadora e entrevistadora sobre temas humanos, aqueles que definem uma vida. Além disso – pormenor importante – teve uma vivência brasileira que lhe deu uma visão do mundo para lá da realidadezinha que muitas vezes nos reduz. Neste livro conversa com figuras como Caetano Veloso, Júlio Pomar, Marília Pêra, Carlos Drummond de Andrade, Agostinho da Silva, Zélia Gattai e Jorge Amado. Diálogos que, sem o desejo insensato de uma comunhão utópica, unem Portugal e o Brasil e são conduzidos por uma “garimpeira de gente”.

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“Extremo Ocidental – uma viagem de moto pela costa portuguesa, de Caminha a Monte Gordo”
Paulo Moura
(Elsinore, 2016)

Paulo Moura, jornalista de viagens destemidas, percorre neste livro a costa portuguesa para melhor a saborear e perceber no seu desenho e nas suas pessoas-personagens de uma narrativa comum. Vai de mota, a partir da qual olha o que encontra de uma perspectiva diferente da habitual: “Daqui, acreditem, o mundo não é o mesmo”. E é este universo, entre comunidades, praias, fábricas e discotecas em falência, que descreve nas suas diversas paisagens mas também nas suas melhores histórias. “Percorrer a costa ocidental portuguesa é uma das grandes viagens que se podem fazer na Europa”, escreve quem já calcorreou muito mundo.

“Açores – O Segredo das Ilhas”
João de Melo
(D. Quixote, 2016)

Um livro que é uma homenagem literária ao arquipélago e que, à narração de histórias das pessoas, prefere deter-se nas formas das paisagens com uma pena que as conhece mas que não deixa de as procurar com o deslumbre de um regresso. Aqui se desenrola uma capacidade descritiva invulgar da morfologia de cada chão do arquipélago e o talento para achados líricos. A viagem começa na ilha do Corvo e acaba em Santa Maria e transporta na mala o sentimento de que “é nas ilhas que a paixão da vida mais se eleva em nós”. No fim, o livro, em sim um belo objecto, traz umas páginas em branco para o leitor poder narrar, com o seu sangue, a sua própria viagem.

“Gratidão”
Oliver Sacks
(Relógio D´Água, 2016)

Ensaios do autor de O Homem Que Confundiu a Mulher com Um Chapéu sobre a aproximação da morte. O que fica é um sereno e grato sentimento. O de ter experienciado coisas várias – boas e más -, o poder ter escrito vários livros, o ter recebido inúmeras cartas de amigos, colegas e leitores, “e ter gozado aquilo a que Nathaniel Hawthorne chamava ‘união com o mundo’”.

Quais as suas prioridades finais? Concentrar-se em si próprio e nos seus amigos. Deixar de ver notícias. “Não é indiferença mas desprendimento”. O autor e o homem sentem que o mundo está em boas mãos e por isso fazem, numa prosa muito sóbria, um balanço positivo nos domínios do amor, nas viagens e no pensamento. Inspirador.

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Nuno Costa Santos, 41 anos, escreveu livros como “Trabalhos e Paixões de Fernando Assis Pacheco” ou o romance “Céu Nublado com Boas Abertas”. É autor de, entre outros trabalhos audiovisuais, “Ruy Belo, Era Uma Vez” e de várias peças de teatro.