O bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, sublinhou na terça-feira em Coimbra que a falta de tempo que os médicos têm para dedicar aos doentes está a levar à desumanização dos cuidados de saúde.

“É preciso que o doente se sinta respeitado pelo médico, que este o esteja a ouvir e não a olhar para o relógio”, sublinhou José Manuel Silva, que falava em Coimbra, na conferência “A relação médico-doente, Património da Humanidade”.

Para o bastonário, o tempo é fundamental para que se crie uma relação empática entre médico e doente, alertando que, sem empatia, o utente “não segue os conselhos”.

Com o tempo a ser o eixo da relação médico-doente, seria necessário estimular “os médicos a passarem mais tempo com os doentes”, promovendo também estas relações empáticas nas próprias “escolas médicas”, enfatizou.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A disponibilidade assume um papel crucial nesta relação, ameaçada pela “McDonaldização da medicina”, sendo que os médicos estão transformados em “vendedores de [produtos] de McDonald’s”, que “têm de responder rapidamente e produtivamente à necessidade dos consumidores”, referiu.

“Temos de combater essa despersonalização”, defendeu, considerando que a perspetiva “mercantil interpõe-se na relação médico doente”.

De acordo com o bastonário, o financiamento do Serviço Nacional de Saúde, de momento, “é insuficiente”, sendo necessário não “perder a perspetiva pública da saúde” e “colocar o doente no centro do sistema”.

“Só conseguimos bons resultados com tempo e a sociedade não está a dar tempo, porque o tempo tem custos”.

Face a esta situação, há uma sensação de impotência nos médicos, com a falta de tempo a revelar-se como “um dos fatores de desgaste e exaustão”, disse, salientando que, não havendo profissionais de saúde saudáveis, a sociedade também não o será.

A conferência, que terminou já perto das 20h00 realizou-se no âmbito do encerramento das comemorações dos 25 anos de ensino de Medicina Geral e Familiar na Universidade de Coimbra, contando com a presença do coordenador dessa unidade curricular, Hernâni Caniço.

A 2 de junho, foi anunciado em Coimbra que organizações de médicos de vários países, entre os quais a Ordem portuguesa, estão a preparar um projeto de candidatura à classificação, pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), da relação médico/doente como bem imaterial da Humanidade.