Isamara Lopes, 22 anos, natural da ilha de Santiago, improvisou uma loja de bebidas no cabeleireiro da mãe, numa das ruas do centro de Sines. “Também vendemos cachupa, a 4 euros”, diz-nos ao balcão, com uma criança ao colo. À porta, dois miúdos de guitarra ligada ao amplificador e bateria fazem a festa, apesar de não estarem no programa do Festival Músicas do Mundo (FMM), que acontece até domingo.

Vão recolhendo umas moedas e quem não tem trocos à mão contribui para a causa musical com o que pode — garrafas de cerveja, por exemplo. O mesmo acontece com Los Empty Heads, uma pequena banda de stoner rock de Setúbal, que já tem o ritual de tocar ano atrás de ano mesmo sítio de Sines, em frente à Casa da Juventude.

Durante o festival que vai agora na 18ª edição, os arredores do castelo de Sines adaptam o negócio às exigências dos visitantes — o ano passado foram 90 mil. A peixaria vende cerveja, o salão de beleza vende cerveja e até a sede do PS vende cerveja, gin, whisky e amêndoa amarga a preços convidativos.

“É a primeira vez que faço isto”, conta Tatiana Jesus, de 29 anos. “Toda a gente aqui faz e como estou bem situada quis aproveitar para fazer algum.” Por falar em fazer, habitualmente “faz” unhas de gel, mas nos últimos dias tem preparado mais caipirinhas que outra coisa. Quando fecha a loja vai espreitar os concertos gratuitos da Av. da Praia (na sexta há Fumaça Preta, às 2h30, e Islam Chipsy & E.E.K., às 4h00, e no sábado Paulo Flores, às 2h30, Systema Solar, às 4h00, e Jibóia, às 5h45), mas diz ainda não ter conseguido “olhar para o cartaz” para dizer do que gostou mais.

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Com mais imaginação, Miguel Coelho, de 26 anos, estudante de Artes, está a vender “T-shirts alternativas” do festival, com as letras FMM pintadas em stencil a tinta de spray. Uma vale 10 euros, duas 15 euros, “mas falado até vendo por 5″, diz. Uma maneira de arranjar dinheiro para os bilhetes dos concertos no castelo, que rondam os 30 euros para os dois dias ou 15 e 20 euros para um dos dias, sexta ou sábado.” Há aqueles dias em que uma pessoa tem mesmo de comprar”, esclarece.

Sexta e sábado são desses, com nomes como Konono nº1 meets Batida (sexta, às 00h45) ou Pat Thomas & Kwashibu Area Band (sábado à mesma hora) a fechar o palco e a embalar toda a gente para o resto da noite que se prolonga madrugada dentro — e às vezes acaba no after na pedreira. “Mesmo assim não tive de pagar para ver o concerto que me trouxe cá”, continua. “Bnegão & Seletores de Frequência, em Porto Covo [no fim-de-semana anterior].”

Todos os negócios

No Largo da Igreja concentram-se os pequenos comerciantes que vendem desde conchas pintadas a tererés para o cabelo ou, se procurar bem, cogumelos mágicos. Dentro da capela da Misericórdia há discos de world music e a banca do Homem do Saco, uma associação cultural sem fins lucrativos que preparou para a ocasião a melhor recordação do festival que se podia ter na parede, por 12 ou 15 euros, dependendo do tamanho. “São posters alusivos à programação do festival”, explica Luís Henriques, um dos 10 membros da associação de apaixonados pela ilustração e pelas artes gráficas que reúne pessoas de várias áreas, de “terapeutas a historiadores de arte”.

Além dos posters das bandas, até de portugueses como o coletivo do Porto Retimbrar, também prepararam um com Durão Barroso e o tentáculo de um polvo que agora serve para fazer uma máscara com as letras FMM. “Recolhemos materiais antigos de tipografias e tentamos comprá-los a baixo custo”, continua.

No festival a Homem do Saco marca presença desde 2014 e já ofereceu posters a bandas como Orlando Julius & The Heliocentrics (um dos nomes fortes do cartaz do ano passado). “Às vezes no fim dos concertos levamos alguns posters para oferecer”, conta. “Outras são os artistas a procurarem-nos e a levarem vários.” Este ano, Luís não quer perder o concerto do cabo-verdiano Bitori (sexta, às 18h45) que também mereceu um poster. “Se conseguirmos retorno o dinheiro serve para pagar o material e as deslocações para estarmos aqui e aproveitar o festival.”