O gabinete do Alto-Comissário da ONU para os Direitos Humanos confirmou esta sexta-feira que recebeu a queixa anunciada na quinta-feira pelos advogados de Luiz Lula da Silva, que alegam que o ex-Presidente brasileiro está a ser vítima de “perseguição judicial”.

Fontes do gabinete explicaram que a petição será examinada e enviada aos membros do Comité de Direitos Humanos (CDH) da ONU.

Os membros do CDH irão avaliar se a queixa pode ser registada, ou não, em função de vários critérios, como, por exemplo, se foram esgotadas todas as opções legais no país do queixoso, entre outros.

Caso o CDH decida registar a queixa, ela tornar-se-á um caso pendente.

Este processo, que é confidencial, pode demorar até dois anos, uma vez que o CDH tem cerca de 500 casos pendentes.

Os membros deste órgão irão primeiro analisar se a queixa pode ou não ser admitida. Se for admitida, analisarão se houve alguma violação da Convenção Internacional dos Direitos Civis e Políticos, da qual o Brasil faz parte.

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O CDH não é um órgão permanente, reúne-se de forma regular apenas três vezes por ano e analisa em média 40 casos por sessão.

São os membros que decidem a ordem dos processos e podem fazer avançar um caso concreto em circunstâncias especiais, por exemplo, quando uma pessoa foi condenada à morte ou está na iminência de ser expulsa do país.

Segundo uma nota da assessoria do ex-chefe de Estado brasileiro, a petição entregue na quinta-feira em Genebra “lista diversas violações à Convenção Internacional dos Direitos Civis e Políticos praticadas pelo juiz Sérgio Moro e pelos procuradores da Operação Lava Jato”, que investiga o maior esquema de corrupção da história do Brasil.

A ação pede ao Alto Comissariado que se pronuncie sobre as “arbitrariedades praticadas pelo Juiz Sérgio Moro contra Lula da Silva, seus familiares, colaboradores e advogados”, de acordo com a assessoria.

Segundo a nota, “Lula não se opõe a qualquer investigação, desde que realizada com a observância da lei e das garantias constitucionais e, ainda, daquelas previstas nos Tratados Internacionais subscritos pelo Brasil”.

Os advogados apontam, por exemplo, o facto de terem levado Lula da Silva para depor “sem qualquer previsão legal” e a divulgação na imprensa de materiais confidencias e de ligações telefónicas intercetadas.

“De acordo com a lei internacional, o juiz Moro, por já haver cometido uma série de ações ilegais contra Lula, os seus familiares, colaboradores e advogados, perdeu de forma irreparável a sua imparcialidade para julgar o ex-Presidente”, lê-se na nota.

“Procurámos o Conselho da ONU para que a sua manifestação sirva de guia para os direitos fundamentais que a nossa Constituição exige que sejam observados por juízes e promotores”, disse Cristiano Zanin Martins, advogado de Lula da Silva.

A petição foi subscrita também pelo advogado especializado em direitos humanos Geoffrey Robertson, que já representou personalidades como o fundador do portal da Internet Wikileaks Julian Assange.

Geoffrey Robertson alertou que “o mesmo juiz que invade a sua privacidade [Lula da Silva] pode prendê-lo a qualquer momento, e daí automaticamente torna-se a pessoa que irá julgá-lo, decidindo se é culpado ou inocente, sem um júri”.

“Nenhum juiz na Inglaterra ou na Europa poderia agir dessa forma, atuando ao mesmo tempo como promotor e juiz. Esta é uma grande falha no sistema penal brasileiro”, advogou.

Geoffrey Robertson também apontou o problema das detenções feitas sem julgamento: “O juiz tem o poder de deter o suspeito indefinidamente até obter uma confissão e uma delação premiada [prestação de informações em troca de eventual redução de pena]. Claro que isso leva a condenações equivocadas, baseadas nas confissões que o suspeito tem de fazer porque quer sair da prisão”.