Quantas vezes se pergunta porque é que precisa dormir se as horas do dia podiam ser tão bem aproveitadas a fazer outras coisas? Para agravar o desagrado, para manter o cérebro saudável convém mesmo que durma um mínimo de horas – cerca de um terço do dia. Dormimos porque o cérebro precisa de fazer uma “limpeza diária” ou porque sabemos que uma boa noite de sono nos deixa mais produtivos. Mas que mecanismo nos “obriga” a dormir todos os dias? Os investigadores da Universidade de Oxford foram à procura do responsável: o João Pestana.

Imagine o cérebro como uma máquina, por exemplo um aquecedor com termóstato. Quando é atingida uma determinada temperatura, o aquecedor desliga e só se volta a ligar quando a temperatura desceu o suficiente para justificar o funcionamento outra vez. Segundo a equipa do laboratório de Gero Miesenböck o nosso cérebro funciona mais ou menos da mesma maneira: existe um mecanismo que mede alguma “coisa” que os cientistas ainda não sabem o quê, mas que acontece no cérebro enquanto estamos acordados, e quando essa “coisa” atinge um certo limite, o cérebro desliga-se para dormir.

“A ‘pergunta para um milhão de euros’ nisto tudo é: o que é equivalente à temperatura neste sistema? Noutras palavras, o que mede este ‘homeostato do sono’? Se soubéssemos a resposta, estaríamos um passo mais próximos de descobrir os mistérios do sono”, disse Gero Miesenböck, citado em comunicado de imprensa da universidade.

Este mecanismo – o “homeostato do sono” – permite encontrar o equilíbrio do organismo, porque assim que o sistema é reiniciado, podemos acordar e começar um novo ciclo. Bem, pelo menos é o que os investigadores concluem, no artigo publicado na Nature, depois de estudarem os neurónios das moscas-da-fruta (Drosophila). Estes neurónios que controlam o sono são encontrados noutros animais e acredita-se que também existam nas pessoas. Quando estão eletricamente ativos, as moscas estão cansadas, e quando estão silenciosos, a mosca estão bem descansadas.

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O cientista português, Diogo Pimentel, é um dos responsáveis pelo projeto desenvolvido no Centro de Circuitos Neuronais e Comportamento da Universidade de Oxford.

Um dos fatores que desativa estes neurónios é a dopamina, um neurotransmissor muitas vezes associado à sensação de bem-estar e prazer, recompensa, memória e atenção. Algumas drogas, como a cocaína, aumentam os níveis de dopamina no cérebro, o que pode justificar a privação de sono nas pessoas que consomem estas drogas. Ao utilizarem dopamina nas moscas-da-fruta, os investigadores verificaram que esta inativava um sistema a que chamaram “João Pestana”. O sistema tem este nome porque quando está ativo nas células, também elas eletricamente ativas, deixa as moscas a dormir o tempo todo.

E a privação de sono é conhecida por causar danos no cérebro e noutros aspetos da saúde – dormir mal, pode até fazer engordar. Mas nem todas as áreas do cérebro são afetadas da mesma forma, as áreas envolvidas na concentração e na resolução de problemas são aquelas que mais sofrem, segundo um artigo publicado na revista científica Science. Assim, passar uma noite em claro, por diversão ou por motivos profissionais, prejudica o cérebro [veja mais sobre o trabalho por turnos aqui e aqui].

Mais uma vez, os investigadores verificaram que existem dois fatores importantes de controlo do sono: o ciclo circadiano – um ciclo biológico de 24 horas que depende da luz e temperatura – que nos mantém acordado durante o dia e nos faz sentir sono quando chega a noite; e a nossa tendência para adormecer que vai aumentando à medida que passamos mais horas acordados – o já referido “homeostato do sono”.